Título: Censo de 2010 contará casais
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 09/03/2008, Economia, p. 35

IBGE vai cruzar situação conjugal com renda e nível de escolaridade.

São, pelo menos, 17 mil casais gays no Brasil, nas cidades com menos de 170 mil habitantes. Essa foi, até agora, a única pesquisa feita pelo IBGE que contou o número de casais do mesmo sexo no país. O número baixo é atribuído ao constrangimento em assumir o casamento homossexual, principalmente por ter sido realizado em cidades pequenas. O instituto agora se prepara para incluir essa questão no censo populacional de 2010, envolvendo o país inteiro. Segundo a socióloga Ana Saboia, chefe da Divisão de Indicadores Sociais do IBGE, essa demanda por estatísticas da população de casais gays já tinha chegado aos balcões do IBGE na preparação do Censo 2000:

¿ Ainda nem era um assunto comumente tratado nas novelas como é hoje. Na época, com a quantidade de demandas e o custo alto, o tema não foi contemplado.

Segundo Ana, apesar dos 17 mil casais não ser um número expressivo, demonstra que há conscientização e que as pessoas estão assumindo esse novo arranjo familiar.

¿ Antes, dois homens morando na mesma casa não se definiam como chefe e cônjuge. Era uma relação sem parentesco.

A ONU já preparou metodologia específica para o tema, no qual as perguntas vão dividir a família em união estável registrada, ou não, de casal heterossexual e de homossexual. Ou seja, os países já sabem como fazer, a decisão agora é política. Mas não é uma missão fácil, segundo a socióloga.

¿ É difícil treinar 180 mil agentes de coleta numa indagação que é muito complexa. Temos que encontrar a melhor maneira de abordar as pessoas ¿ diz Ana.

Com essa primeira estatística, o IBGE terá condições de montar levantamentos especiais nas Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (Pnads), levantamentos anuais de atualização dos censos.

¿ Poderemos avaliar melhor a questão do mercado de trabalho e fazer novos cruzamentos de informações.

Atualmente, além do Brasil, contabilizam os casais gays países como Nova Zelândia, Canadá, Espanha, Estados Unidos, Dinamarca e Noruega.

Pesquisas do tamanho do censo e da contagem da população no ano passado nunca foram feitas antes no Brasil. Mas o Instituto de Medicina Social da Uerj tem feito levantamentos sistemáticos nas paradas gays, com objetivo de medir o grau de preconceito e discriminação vivido por essa população.

Segundo o antropólogo e cientista social Sergio Carrara, coordenador do Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos, ligado à Uerj, as pesquisas estão voltadas para vitimização. Nesses levantamentos, constatou-se que 60% dos entrevistados já sofreram algum tipo de discriminação por conta de sua orientação sexual.

Foram 16,9% que reclamaram de agressões físicas e 18% de algum tipo de chantagem ou extorsão. Xingamentos, ofensas e ameaças atingiram 52,35% dos entrevistados:

¿ A sociedade já não faz tanta piada e comentários contra nordestinos e negros. Mas essa prática ainda é comum com os gays ¿ afirma Claudio Nascimento, do Grupo Arco-Íris de Conscientização Homossexual e coordenador-geral da Parada do Orgulho GLBT-Rio.

Segundo Carrara, as paradas gays romperam com a invisibilidade que cercava essa parcela da população. Atualmente são milhões nas passeatas:

¿ Uma profunda mudança cultural está em curso. A sexualidade e sua relação com a identidade da pessoa começaram a ser discutidas. (Cássia Almeida e Mariana Schreiber)