Título: Com nova lei, pequena empresa ganha espaço no supermercado do governo
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 09/03/2008, Economia, p. 36

Participação nas compras federais subiu de 9,6% para 37% em um ano.

BRASÍLIA. Com apenas seis meses em vigor, a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas mudou o perfil das compras governamentais, multiplicando por quatro a participação dos empreendedores de pequeno porte nesse bilionário mercado. Cobiçado por empresas de todo o país e dos mais variados tamanhos, o governo federal é um cliente gastador, que desembolsou R$25,7 bilhões em 2007, 21,7% mais que os R$21,1 bilhões do ano anterior.

Com compras em grande escala, o governo federal pode pressionar fornecedores para baixar preços. Por isso, esse era um jogo considerado ideal para as grandes empresas. Mas as vantagens proporcionadas pela nova legislação fizeram com que, nesse enorme "supermercado", a participação das compras de micro e pequenas empresas passasse de 9,6% em 2006 para 37% no ano passado.

Em valores, o crescimento dessas empresas impressiona. Em 2007, o governo adquiriu das microempresas brasileiras R$4,102 bilhões em produtos diversos, como material de escritório, componentes de veículos, material de construção e equipamentos e artigos para uso médico dentário e veterinário. Esse número representa um salto de 579% em relação aos R$604 milhões de 2006. As pequenas empresas também estão vendendo mais para a máquina pública. Sua participação nas compras governamentais passou de R$1,433 bilhão em 2006 para R$5,404 bilhões em 2007.

Somadas, as vendas de micro e pequenas empresas saíram de R$2,037 bilhões, em 2006, para R$9,506 bilhões, 375% mais. Elas representam 158 mil dos 274 mil fornecedores cadastrados. Para o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, os valores comprovam o sucesso da estratégia de incentivar a base da economia por meio das compras governamentais, um dos objetivos da Lei Geral:

- O governo passou a ser um grande mercado para essas empresas e ajudará no crescimento desse segmento econômico.

Crescimento deve continuar neste ano

A expectativa é de que esse número cresça mais este ano, pois o resultado de 2007 concentrou-se no segundo semestre, depois que o ministério concluiu a adaptação dos softwares necessários para adequar os pregões eletrônicos à nova lei. Para Rogério Santanna, secretário de Logística e Tecnologia da Informação, a tendência é que a participação dessas empresas alcance um equilíbrio em 2010:

- As empresas dos mais variados portes se organizarão para atender à demanda e continuar fornecendo ao governo.

O Decreto 6.024, de setembro passado, cria vantagens para as micro e pequenas empresas em relação às grandes. Entre elas, está a exclusividade para contratação de bens, serviços e obras no valor de até R$80 mil. Outra impede que, na definição de bens a serem adquiridos, as especificações restrinjam os pequenos concorrentes.

Foi essa a chance aproveitada pelo empresário Aparecido Balbino de Queiroz, de Maringá (PR), dono da Martimaq, especializada em móveis escolares. Entre 2006 e 2007, o fornecimento para governos federal, estadual e municipal passou de 30% das vendas para 70%. Segundo ele - que faturou cerca de R$2,5 milhões em 2007, 18% mais em relação a 2006 -, a nova legislação dá garantias aos pequenos empreendedores:

- Havia medo de trabalhar com órgãos públicos. As especificações técnicas não ajudavam os pequenos e as exigências impediam a participação.

Para o empresário, fornecer carteiras escolares ao governo era um tormento, pois as encomendas eram muito grandes e os prazos, exíguos. As novas regras permitem fracionar a entrega da encomenda, mantendo o preço inicial. As negociações, diz ele, ficaram mais fáceis.

O microempresário Francisco Parente de Mesquita, dono da SRV Confecções, em Brasília, também viu as vendas de sua empresa crescerem em razão da exclusividade para licitações de até R$80 mil. Especializado em vender material de segurança para construção civil, uniformes e coturnos, ele calcula que seu faturamento cresceu 20% desde setembro passado.

- As perspectivas agora são muito boas, pois temos muito mais chances - diz.

As micro e pequenas têm ainda vantagem sobre as grandes em caso de empate no pregão eletrônico. Se, na disputa entre elas, a diferença do segundo lugar para o vencedor for de até 5%, a menor pode cobrir a oferta. Com esse recurso, o faturamento da Koral Hospitalar, que é do Rio e vende material médico-hospitalar, cresceu 10%. A gerente Cristina Lemos revela a estratégia para vencer os grandes:

- Nos pregões vamos até bem perto do nosso limite de preço, torcemos para o vencedor ser de grande porte e fazer uma proposta próxima. Se for, apresentamos no desempate um preço melhor e levamos.