Título: Em busca de um aliado na Colômbia
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Fonte: O Globo, 09/03/2008, O Mundo, p. 40

Para analistas, venezuelano vê nas Farc instrumento na luta por união regional.

BUENOS AIRES. Em declaração em outubro, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) se referiram ao presidente da Venezuela, Hugo Chávez, como ¿furacão revolucionário, um agitador de povos e esperanças¿. O elogio, feito em meio à negociação para permitir a libertação de reféns, foi mais uma evidência da forte sintonia que existe entre Chávez e a guerrilha. O que muitos venezuelanos e colombianos se perguntam é: até onde chega o relacionamento entre Chávez e as Farc?

Segundo analistas e dirigentes políticos venezuelanos, existe entre Chávez e as Farc, no mínimo, uma visão comum sobre a necessidade de uma união sul-americana e, para isso, o inevitável confronto com EUA e o governo do presidente da Colômbia, Alvaro Uribe, um dos principais aliados da Casa Branca na região. Os mais vinculados ao Palácio Miraflores asseguraram que Chávez busca eliminar a grande pedra no caminho de seu projeto de união continental ¿ leia-se a aliança entre Uribe e os EUA. Com Uribe no poder, acreditam chavistas, não é possível um acordo de paz no país. E sem paz, a Colômbia impede o avanço da integração sul-americana. Já os mais críticos apontaram uma aliança considerada fundamental por Chávez em sua estratégia de exportação da revolução bolivariana. A Colômbia, dizem antichavistas, ¿é a jóia da coroa e Chávez precisa do respaldo das Farc para tentar entrar em território colombiano¿.

¿ É absurdo pensar que Chávez atua como agente das Farc, que recebeu dinheiro das Farc quando preso ou que envia dinheiro ao grupo. O que existe é uma visão comum sobre a união continental ¿ disse Germán Campos, da Universidade Central da Venezuela (UCV).

Para o analista venezuelano, ¿não existe uma identidade ideológica entre Chávez e as Farc¿.

¿ O que ambos compreendem é que a política de Uribe fechou espaços para a negociação na Colômbia e se o conflito colombiano não for resolvido, a união sul-americana correrá sério risco ¿ enfatizou Campos.

Primeiros contatos foram em Porto Alegre

A visão do opositor Rafael Ramón Jiménez, ex-ministro de Chávez, é bem diferente. Para o ex-chavista, ¿o presidente está tentando cativar a guerrilha para tentar incorporá-la ao cenário democrático e assim ter um forte aliado na Colômbia¿.

¿ Há uma identificação ideológica. O que ele busca é levar as Farc para o terreno democrático já que a Colômbia tem importância geopolítica enorme em seu projeto de poder continental ¿ disse ele, que conhece como poucos a mentalidade chavista.

Uma das grandes metas de Chávez é reconstruir a ¿Grande Colômbia¿, que era integrada por Panamá, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. Desde seus primeiros dias como dirigente político, já fora das Forças Armadas, Chávez evocou o projeto de Simón Bolívar, sempre ciente de que a Colômbia representava um desafio.

¿ O presidente é um pouco ingênuo, porque me parece improvável que as Farc abandonem a luta armada. Mas ele sempre achou que isso era possível, porque conseguiu chegar ao poder pela via democrática e sempre acreditou que conseguiria convencer os guerrilheiros colombianos a seguirem o mesmo caminho ¿ comentou Jímenez.

Os primeiros contatos entre Chávez e as Farc, lembrou Simón Jiménez, ocorreram no Fórum Social de Porto Alegre.

¿ O presidente sempre considerou as Farc aliado estratégico. Se um dia perder o poder, não duvido que usará o poder militar das Farc para se defender de inimigos ¿ opinou Jímenez.

Segundo versões que circulam em Caracas, pouco antes do golpe de abril de 2002, Chávez tentou se reunir com líderes das Farc, já sentindo que uma ofensiva inimiga era iminente.

¿ Com o projeto da Grande Colômbia sempre na cabeça, o presidente buscou, desde o início, um aliado na Colômbia ¿ disse José Vicente Carrasquero, da Universidade Simón Bolívar.

Para o venezuelano, ¿o que Chávez pretendia era limpar a imagem das Farc no mundo e ajudar o grupo a ter força política na Colômbia.

¿ A liberação de reféns tem o claro objetivo de dar as Farc o reconhecimento internacional que tanto demandam ¿ argumentou Carrasquero.