Título: Obsessão no combate à guerrilha
Autor:
Fonte: O Globo, 09/03/2008, O Mundo, p. 40

Presidente teria relação simbiótica com Farc devido a projeto de reeleição.

BOGOTÁ. Apoiado pela maioria dos colombianos, duramente criticado por alguns pelo estilo centralizador e pela inflexibilidade, o presidente Alvaro Uribe enfrenta agora seu maior desafio à frente do país. Com popularidade em torno dos 80%, foi eleito e reeleito prometendo derrotar a guerrilha. Curiosamente, seu principal sucesso até agora ¿ a morte de Raúl Reyes, o número 2 das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), na selva equatoriana ¿ deflagrou a maior crise que já enfrentou e que pode comprometer planos de um terceiro mandato.

Político de direita, Uribe conquistou o apoio dos colombianos com uma ofensiva contra a guerrilha, num país cansado de seqüestros e confrontos. Apesar da morte de figuras importantes das Farc, como o próprio Reyes e Ivan Ríos, nos últimos dias, centenas de pessoas continuam reféns na selva e o conflito já extrapola as fronteiras. Muitos vêem nisso uma obsessão, já que seu pai foi assassinado pela guerrilha em 1983, em Antioquia.

¿ A intenção não era atacar o Equador, mas pegar o guerrilheiro. O erro foi não comunicar Quito ¿ diz Marco Romero, professor . ¿ Foi uma decisão unilateral. Ele deu prioridade à captura, ao resultado. É um governo obcecado com a captura dos líderes das Farc.

Uma das críticas é que Uribe teria sido mais benevolente com os paramilitares e adotado uma linha-dura contra a guerrilha. Essa diferença de tratamento teria gerado divisões também na sociedade colombiana, daí a realização de duas marchas recentemente: uma em solidariedade as vítimas das Farc e outra, na quinta-feira, para as vítimas dos paramilitares.

Para o colunista do ¿El Tiempo¿ Francisco Leal Buitrago, a polarização foi uma das ferramentas usadas por Uribe para garantir sua popularidade, lançando mão de um discurso de que ¿quem não está a favor dele, está contra a pátria¿. Além disso, acha que seu estilo personalista de governar não ajuda ao fortalecimento dos muitos partidos que surgiram após o fim do bipartidarismo, no início da década.

¿ Seu estilo caudilista não dá possibilidade de os partidos se fortalecerem, tira força deles, das instituições. É um estilo ¿as instituições são o presidente¿ ¿ comenta Leal, que critica ainda um descaso com as relações internacionais.

Uribe não admite mas, depois de conseguir a aprovação de uma emenda constitucional permitindo a reeleição presidencial consecutiva, acredita-se que buscará um terceiro mandato, possibilidade já levantada por alguns políticos ligados ao governo. Ele não diz que sim nem que não, mas que ¿se ocorrer um hecatombe, sacrificaria-se¿ num novo mandato. Seu projeto de reeleição, no entanto, pode ser prejudicado por alguns fatores. Primeiro, o escândalo da parapolítica, que ligou políticos da base governista aos paramilitares ¿ o que pode prejudicar a votação de uma nova emenda. Segundo, a crise com os vizinhos pode afetar duramente a economia do país e minar a popularidade do presidente. E, terceiro, ainda não conseguiu acabar com o conflito interno, o que promete desde a primeira campanha.

Semelhanças entre Uribe e Chávez

Há quem veja quase uma simbiose de seu governo com as Farc. Para Romero, ¿se não existissem as Farc, não existira Uribe¿.

¿ Digo que ele não pode se reeleger sem as Farc. Seu grande tema é a segurança. E as atitudes das Farc retroalimentam uma política de linha-dura ¿ diz o analista.

Apesar de terem linhas opostas, muitos vêem características comuns entre Uribe e Chávez. Assim como o presidente venezuelano, que se tornou seu principal oponente internacional, especialistas vêem Uribe como um líder carismático e personalista, que não estimula a pluralidade política, que deseja permanecer no poder e cujos ministros agem quase como secretários. A nova crise seria um choque de egos.

¿ Chávez e Uribe têm uma inimizade profunda. A idéia de Chávez é derrubar o governo colombiano apoiando a guerrilha e estrangulando a economia. Mas a intenção de Uribe é mais ou menos igual: fazer com que os Estados Unidos incluam a Venezuela na lista de terroristas. Qualquer um que vença será negativo para a zona andina ¿ diz o analista León Valencia.

¿ Ambos querem se eternizar no poder, buscando inimigos com quem confrontar, mostrando-se como alguém que vem para salvar o povo ¿ analisa Romero. ¿ Nisso, se parecem.