Título: Longa marcha invade ruas de Nova Délhi
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 13/03/2008, O Mundo, p. 40

Exilados na Índia dizem que caminharão até chegar ao Tibete, mas são reprimidos pelo governo.

NOVA DÉLHI. A longa marcha tibetana contra o governo comunista chinês e a realização das Olimpíadas em Pequim tomou as ruas da capital indiana e dos vilarejos montanhosos do norte da Índia onde vive o líder espiritual do Tibete, Tenzin Gyatso, o 14º Dalai Lama.

A 600 quilômetros de Nova Délhi, no estado de Himachal Pradesh ¿ onde funciona o governo tibetano no exílio e vive o Dalai Lama ¿ 700 monges, estudantes e ativistas de ONGs com bandeiras do Tibete, cartazes com fotos de Mahatma Gandhi e do Dalai Lama, desafiaram a proibição do governo. Eles partiram em direção ao Tibete, prometendo não para até cruzarem a fronteira entre Índia e China. Sob forte pressão de Pequim, o governo indiano ordenou a repressão do movimento. Alguns dos manifestantes foram presos pela polícia indiana.

¿ A marcha foi claramente uma atividade política. O governo indiano assegurou ao governo chinês que não permitiria nenhuma ação política dos tibetanos na Índia. Por isso, não podemos permitir a continuação dessa marcha. Além disso, ninguém tem permissão de atravessar a fronteira internacional sem autorização oficial ¿ explicou um porta-voz do governo indiano.

Eles começaram na segunda-feira, na cidade de Dharamshala, o que chamam de longa marcha, prevista para durar três meses, em direção à fronteira da Índia com o Tibete. Essa marcha é uma das muitas atividades de protesto organizadas no mundo todo contra a repressão chinesa aos tibetanos e as Olimpíadas de Pequim, em agosto. Os manifestantes alegam que o governo chinês tenta exterminar a cultura budista tibetana na região ocupada, estimulando a emigração de chineses de outras partes do país para lá.

¿ Somos tibetanos, pertencemos ao Tibete e queremos voltar ao nosso país. É simples assim. Não vamos desistir ¿ disse ao GLOBO um dos principais líderes tibetanos no exílio indiano e organizador da marcha, o poeta Tenzin Tsundue.

Há 140 mil exilados tibetanos na Índia

A Índia ¿ que em 1959 acolheu os refugiados do Tibete ocupado pela China ¿ abriga hoje 140 mil exilados. Mas esse exílio é concedido sob uma condição: a proibição de manifestações políticas contra a China. A presença dos tibetanos na Índia é um ponto de tensão permanente nas complicadas relações diplomáticas entre os dois gigantes asiáticos, que amargam sérias disputam territoriais.

Mas os problemas não deverão terminar com a repressão dos manifestantes tibetanos em território indiano. A Índia não conseguirá impedir a marcha dos manifestantes que entrarem no vizinho Nepal, por avião ou mesmo cruzando a fronteira indiano-nepalesa. Muitos devem tentar chegar à fronteira tibetana cruzando o Nepal. Esses casos, segundo fontes do governo indiano, estarão além do controle da Índia.

A capital Nova Délhi também foi palco de protestos contra a China. Vestidas com as longas e tradicionais saias-envelope tibetanas, e com faixas amarelas atadas à cabeça com a inscrição em vermelho ¿Tibete Livre¿, 35 ativistas, incluindo monjas com seus roupões vinho e cabeças raspadas, tentaram escalar a muralha que cerca a embaixada da China, no elegante bairro diplomático de Nova Délhi.

Monjas são presas pela polícia indiana

Elas eram poucas, mas suas vozes ecoavam alto diante da mansão. Elas seguravam cartazes e gritavam palavras de ordem: ¿Tibete Livre¿, e ¿Boicotem as Olimpíadas de Pequim¿. Elas resistiram, gritavam e algumas chegaram a apanhar. Todas foram presas. Sob a pressão do governo chinês, que exigiu imediatamente uma ação dura contra as manifestantes, o governo da Índia teve que acionar a polícia para impedir as tibetanas de invadirem o território chinês no coração da capital indiana.

A marcha tibetana promete azedar mais ainda as já tensas relações do Dalai Lama com Pequim. Atento a isso, nenhum dos grupos que participam da marcha integram o governo tibetano no exílio.