Título: Dólar sobe 1%, influenciado por pacote cambial
Autor: Rangel, Juliana; Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 14/03/2008, Economia, p. 23

Bolsas brasileira e americana tiveram dia volátil, por causa de dados ruins sobre os EUA, mas fecharam em alta.

RIO, NOVA YORK, LONDRES, FRANKFURT, HONG KONG e WASHINGTON. Os mercados brasileiros operaram ontem com forte volatilidade, ao sabor de notícias negativas no cenário doméstico e de um dia conturbado no internacional. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) oscilou entre queda de 3,23% e alta de 0,38%, para fechar aos 62.279 pontos, com valorização de 0,17%. O dólar ficou em alta todo o dia e encerrou os negócios a R$1,692, com ganho de 1,01%. O risco-país subiu 2,2%, para 278 pontos centesimais.

De manhã, investidores digeriam o pacote cambial anunciado pelo governo na véspera, que elevou para 1,5% o IOF sobre investimentos estrangeiros em renda fixa. O dólar chegou a bater a máxima de R$1,713, com alta de 2,27%, mas recuou com a recuperação da Bovespa.

- Basicamente, a única coisa que o governo conseguiu com o pacote cambial foi piorar um pouco o sentimento dos investidores estrangeiros sobre o país. Mas o que influenciou mesmo as cotações foi o mercado lá fora. A gente ainda é refém da economia americana - disse Francisco Carvalho, gerente de câmbio da corretora Liquidez.

Ouro foi cotado a US$1 mil e petróleo, acima de US$110

Em Wall Street, as bolsas foram afetadas por recordes do ouro, do petróleo, de novos recuos do dólar frente ao euro e a outras moedas, além de notícias ruins no varejo e do calote de um fundo. Mas os índices - que começaram o dia no terreno negativo, com quedas acima de 1,5% - acabaram em alta, após a Standard & Poor"s afirmar que o fim das baixas contábeis relacionadas à crise do setor imobiliário está próximo. O Dow Jones teve alta de 0,29%, e o Nasdaq avançou 0,88%.

Na Bovespa, outra notícia ruim veio com a ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). O Copom revelou que chegou a considerar o aumento dos juros básicos (Selic) no início do mês. A divulgação mexeu com o mercado de juros. Na Bolsa de Mercadorias & Futuros, os contratos com vencimento em janeiro de 2009 fecharam projetando a taxa de 12,7% ao ano, alta de 0,15 ponto percentual.

- A tributação de investimentos estrangeiros é um péssimo sinal e pode atrasar o investment grade do país (recomendação dada por agências internacionais de risco) porque representa mudança de regras. Aí, veio a ata do Copom e piorou a situação - disse Marco Franklin, da Paraty Investimentos.

Notícias dos EUA também pesaram sobre o mercado brasileiro de manhã. O Departamento de Comércio informou que as vendas no varejo caíram 0,6% em fevereiro. Os analistas esperavam alta de 0,2%. Outra preocupação veio do setor financeiro, quando o fundo Carlyle Capital deixou de honrar pagamentos de US$16,6 bilhões. Suas ações caíram 90%.

O cenário fez o dólar seguir sua tendência de queda frente a outras divisas mundias. A moerecuou ontem para menos de 100 ienes (99,77) pela primeira vez desde 1995 e caiu para o menor valor histórico frente ao euro (US$1,5624).

Os investidores ficaram ainda apreensivos com o recorde do ouro, negociado a US$1 mil a onça-troy (31,1 gramas) em Nova York, devido a especulações de que a crise de crédito estimulará a demanda pelo metal como proteção. Da mesma forma, o petróleo chegou a ser cotado a US$111, para fechar a US$110,33, novo recorde.

- A virada (nas bolsas) começou quando saiu a notícia da S&P dizendo que está vendo um final para as baixas contábeis - disse Todd Clark, diretor-gerente de ações na Nollenberger Capital Partners.

Segundo a Standard & Poor"s, as baixas contábeis para as grandes instituições parecem já ter passado da metade do caminho. A agência calcula que a crise terá um custo de US$285 bilhões.

Na Europa, os mercados não foram influenciados pela notícia. Londres recuou 1,45%, Frankfurt perdeu 1,5%, e Paris caiu 1,42%. Na Ásia, as quedas foram maiores: Tóquio caiu 3,33%, Hong Kong, 4,79% e Xangai, 2,43%.

Paulson recomenda reforma do sistema financeiro

Depois de buscar e analisar durante sete meses as causas da crise de crédito, o Grupo de Trabalho sobre os Mercados Financeiros, chefiado pelo secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, concluiu ontem que culpa dos distúrbios que levaram o país à beira da recessão é de todos os participantes do mercado americano: corretores e financeiras de Wall Street, agências de avaliação de risco e investidores, que se deixaram levar pela ganância.

- Não estamos destacando nenhum grupo de participantes do mercado, em particular, porque os erros foram cometidos por todos - disse Paulson.

O trabalho mostrou que o sistema financeiro americano vinha operando de forma, no mínimo, desastrada, sob vistas grossas do governo. Os donos do dinheiro o empregaram mal e em excesso, ávidos por mais lucros, fiando-se em critérios discutíveis das agências de risco. E, distraídas em meio à abundância de liquidez, os órgãos reguladores deixaram de fiscalizar o setor com rigor.

Paulson apresentou recomendações e propostas para uma ampla reforma do sistema. As mudanças incluiriam mais transparência - com exigências mais severas de informações de bancos e firmas de Wall Street - além da criação de um sistema nacional de licenciamento de corretores de hipotecas e regras para agências de risco. Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve, BC americano, endossou:

- As recomendações constituem uma resposta apropriada e efetiva às deficiências em nossa estrutura financeira, que contribuíram para o tumulto atual, e eu as apoio firmemente.

(*) Correspondente, com agências internacionais