Título: Atlas de US$55 milhões vai revelar o cérebro
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Fonte: O Globo, 14/03/2008, Ciência, p. 30

Através da identificação de genes, um guia para descobrir base da inteligência e das emoções.

WASHINGTON. Cientistas iniciaram o mais ambicioso projeto para estudar o cérebro humano através de seus genes. O projeto, coordenado pelo Instituto Allen para a Ciência do Cérebro, em Seattle, pode revolucionar os estudos em neurociência. Serão investidos US$55 milhões para desenhar um mapa tridimensional capaz de identificar a atividade de milhares de genes e, com isso, entender a base biológica da inteligência e das emoções.

O projeto deve levar pelo menos quatro anos. Os pesquisadores já concluíram um trabalho similar: a atividade dos genes do cérebro de camundongo, um mapa apresentado em dezembro de 2006.

¿ O Projeto do Genoma Humano foi o ¿o que¿ e o nosso é ¿onde¿ ¿ disse Allan Jones, chefe do estudo.

Melhor entendimento de doenças cerebrais

Ao desvendar padrões da atividade genética no cérebro, o atlas do roedor permitiu a neurocientistas identificar o funcionamento de importantes áreas que eram invisíveis simplesmente olhando a anatomia do órgão.

¿ O cérebro é uma estrutura única ¿ afirma Greg Foltz, neurocirurgião do Instituto de Neurociência da Suécia.

A equipe de Foltz já usou o atlas do cérebro do roedor para investigar dois genes conhecidos como BEX1 e BEX2, os quais parecem estar envolvidos numa forma de câncer de cérebro, chamada glioma. Um mapa do cérebro humano seria uma poderosa ferramenta para identificar alterações que podem causar câncer e outras doenças.

Por exemplo, alguns neurocientistas suspeitam que o autismo pode estar associado a anormalidades na estrutura do cérebro chamada amígdala, que tem papel no processamento de informações emocionais. E com o atlas isto poderá ser analisado a partir da análise de padrões de atividade genética em pessoas com autismo.

Segundo o neurocientista David Anderson, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, em Pasadena, as comparações entre o atlas do camundongo e o humano deverão proporcionar, entre outras descobertas, um melhor conhecimento da evolução da nossa grande capacidade cognitiva.

¿ Há diferenças fundamentais na organização do cérebro? ¿ pergunta Anderson.

Tamanho do órgão será um grande desafio

Só o tamanho do cérebro humano já torna o projeto do atlas um grande desafio. O do camundongo foi produzido com um método chamado hibridização in situ, na qual são separadas fatias finas do tecido do órgão. Depois elas são banhadas em uma solução contendo sondas moleculares que se ligam a seqüências do RNA mensageiro, produzidas por cada gene. Isto permite obter uma mapa detalhado da atividade genética.

Tentar repetir esse procedimento para todos os genes de um órgão cerca de duas mil vezes maior que o do roedor é impraticável, por enquanto. Por isso, os cientistas pretendem dividir o cérebro humano entre 500 a duas mil regiões anatômicas, e estudar a atividade genética por lavagem de extratos de tecidos com chips genéticos, que podem gravar o RNA mensageiro presente.

Essa primeira fase do estudo vai durar dois anos. Depois cientistas devem fazer a hibridização para até 500 genes do cérebro que apresentam os mais interessantes padrões de atividade. O instituto Allen foi criado em 2003 com um fundo de US$100 milhões para a pesquisa, investidos por Paul Allen, um dos fundadores da empresa Microsoft.