Título: Criação de novas alíquotas divide opinião de especialistas em tributos
Autor: Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 16/03/2008, Economia, p. 30

Governo discute adoção de mais faixas de renda no Imposto de Renda.

O prometido alívio no Imposto de Renda para pessoas físicas deve ficar só para o ano que vem ou mesmo 2010. O governo teme que uma redução na carga do IR leve a um aumento do consumo justamente num momento em que crescem as preocupações com a inflação. Paralelamente, o governo discute, dentro da proposta de reforma tributária, a ampliação do número de alíquotas do IR. Isso só deve ocorrer nos próximos anos, mas a idéia já divide a opinião de especialistas.

Para o economista Raul Velloso, um estudioso de finanças públicas, a criação de novas faixas de renda para incidência de IR vai na contramão da tendência mundial, que é de unificação de alíquotas:

¿ O sistema tributário tem que ser neutro na gestão financeira das pessoas. A tendência tem sido simplificar os procedimentos para os contribuintes.

Tendência mundial é de adotar menos alíquotas

Ele acrescenta que, se o objetivo do governo é fazer distribuição de renda ¿ ou seja, tributar mais quem ganha mais ¿ isso deve ser buscado por meio dos gastos públicos, e não da arrecadação de impostos:

¿ A progressividade deve vir pelos gastos, sob a forma de políticas compensatórias.

Salvador Werneck, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), concorda que se trata de questão complexa. Mas apóia a discussão sobre mudanças no IR e acredita que há espaço para mais uma alíquota, entre 30% e 35%:

¿ Muitas alíquotas complicam o sistema. E alíquotas muito altas desestimulam o trabalhador a buscar ganhos de renda e incentivam a elisão fiscal. Mas, no Brasil, há espaço para mais uma alíquota marginal.

Na comparação feita pela Ernst & Young, enquanto alguns países de alto desenvolvimento humano, como a Islândia, têm apenas uma alíquota de IR; outros, como a Suíça, têm nove alíquotas, sendo a mais elevada de 13,20%. Na Austrália, são cinco alíquotas, chegando a 45%. Noruega e Canadá têm quatro alíquotas, e as mais altas são, respectivamente, 40% e 29%.

Mas, segundo Tatiana Ponte, sócia do Departamento de Capital Humano da Ernst & Young para a América do Sul, a tendência recente em diferentes países tem sido a redução no número de alíquotas.

¿ Um exemplo são os países da Europa Central e do Leste, que adotaram a alíquota única para atrair investimentos. A exceção na região é a Hungria, e não se sabe até quando o país vai resistir porque já há empresas indo instalar suas matrizes em países vizinhos ¿ cita Tatiana.

Impostos sobre consumo são mais injustos, diz especialista

Gilberto Braga, professor de planejamento tributário do Ibmec, é contrário à adoção de mais alíquotas no IR. Ele afirma que, se fosse criada uma alíquota intermediária entre as atuais de 15% e 27,5%, haveria um alívio para o contribuinte de renda maior. Mas, na sua opinião, adotar alíquotas superiores a 27,5% não é adequado.

¿ É uma falácia querer usar o IR para fins redistributivos. O Brasil tem mais de 60 tributos, e a maioria é regressiva, com produtos da cesta básica muitas vezes pagando mais imposto do que outros bens. Na reforma tributária, a progressividade poderia vir nos impostos sobre consumo.

Raul Velloso também vê nos impostos sobre consumo o maior problema do sistema tributário brasileiro. Segundo ele, esses tributos são muito mais injustos do que o IR.