Título: Varredura em licitações suspeitas
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 02/05/2009, Política, p. 4

Jorge Hage, da CGU, comanda investigação em 350 mil processos Pelo menos 350 mil licitações e compras do governo, realizadas nos últimos 10 anos, estão passando por um pente-fino por suspeitas de irregularidades. A vistoria, que representa apenas 1,5% dos negócios realizados pela União, e envolve despesas de mais de R$ 2,3 bilhões, já encontrou diversos indícios de fraudes em vários processos, principalmente por envolver empresas que disputavam as concorrências, mas tinham ligações societárias entre si. Além disso, a varredura constatou erros técnicos grosseiros, como a realização de pregões em feriados.

O levantamento está sendo feito pela Controladoria-Geral da União (CGU), por meio do Observatório da Despesa Pública, que rastreia todos os processos licitatórios do governo federal e investiga a situação das empresas que vendem para o poder público. O trabalho, que o Correio obteve com exclusividade, analisou dados de 1998 a abril de 2008, e levantou uma série de irregularidades, envolvendo fraudes ou erros técnicos. A intenção do governo é rever os processos e evitar que firmas com antecedentes de infrações voltem a atuar.

¿Utilizamos diversos tipos de fontes de informações, como banco de dados do governo e até mesmo de denúncias feitas pela imprensa¿, explica Marcelo Stopanovski Ribeiro, secretário de Prevenção da Corrupção e Informações Estratégicas da CGU. Segundo ele, as suspeitas são analisadas por um grupo interministerial. Aquelas que tiverem indícios de fraudes ou de erros técnicos são investigadas pela Controladoria, e pela Receita Federal quando há envolvimento de questões fiscais. Atualmente, o Observatório está trabalhando em levantamentos sobre licitações para terceirização de mão de obra.

A CGU ainda não tem o volume total de fraudes, mas o pente-fino indica que o conluio entre empresas tem sido frequente em vários processos licitatórios. Em São Gabriel da Cachoeira (AM), o governo adquiriu material para reforma e adaptação predial para a Escola Agrotécnica Federal de uma mesma família. A ganhadora da concorrência era irmã da outra concorrente e ambas eram sócias da mãe. O mesmo ocorreu na venda de gasolina para o Ministério da Agricultura, no valor de R$ 47,2 mil, realizada em março do ano passado. O dono do posto vencedor da licitação era o mesmo proprietário da firma que perdeu o pregão. O pente-fino encontrou, ainda, situações em que construtoras foram criadas dias antes da realização de licitações que elas acabaram ganhando.

No Amazonas, um órgão vinculado ao Ministério da Educação adquiriu vários tipos de óculos em duas compras feitas no mesmo dia. Como o limite para dispensa de licitação é de até R$ 8 mil, houve dois processos de R$ 7,5 mil e R$ 3 mil. No Rio de Janeiro, a CGU constatou que uma tomada de preços feita pelo Comando Militar do Leste marcava a entrega da proposta no mesmo dia em que o edital foi divulgado, notadamente um erro técnico dos licitantes.

Nos últimos 11 anos, o governo gastou R$ 164 bilhões em compras e aquisição de serviços. O pente-fino realizado pela CGU abrange apenas uma parte deste valor. Dos R$ 2,3 bilhões auditados, referentes a ações com indícios de irregularidades, cerca de R$ 1,2 bilhão é relacionado a ligações entre empresas participantes das licitações. Outro R$ 1,1 bilhão refere-se a compras realizadas dentro de uma mesma semana, com dispensa de concorrências. Segundo a Controladoria, todas as situações suspeitas serão checadas e, caso seja comprovada a existência de fraudes, haverá abertura de investigação. ¿Ao acender uma espécie de luz amarela chamará a nossa atenção para casos que merecem maior análise¿, diz o ministro.