Título: Melhora a qualidade de vida nas favelas do Rio
Autor: Amora, Dimmi; Araújo, Vera
Fonte: O Globo, 24/03/2008, Rio, p. 12

Pesquisa revela que maioria dos moradores dessas áreas conta com serviços de água, energia, esgoto e ruas asfaltadas

A imagem de favela como um lugar apenas de pobres e sem infra-estrutura já não corresponde ao que seus moradores pensam sobre si. Pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS), a pedido da Central Única das Favelas (Cufa), mostra que quase a totalidade dos moradores afirma viver em favelas com rede elétrica (98%), água encanada (97%) e esgotamento sanitário (94%). A grande maioria informa viver em ruas asfaltadas (77%) e em casas com numeração própria (89%). Dos entrevistados, 77% dizem morar em imóveis próprios e 46% têm acesso a computador.

Boa parte dos moradores já não se sente radicalmente inferiorizada em relação ao restante da cidade. Dos entrevistados, 36% acham que quem vive na favela tem rendimentos iguais aos dos outros habitantes do Rio e 57%, que ganham menos. Apenas 3% acham que o morador da favela é miserável. Dos ouvidos, 42% acreditam que vivem na mesma condição social de moradores do asfalto. Outros 46% dizem viver em condição social inferior e 10% acham que vivem em péssimas condições.

Pesquisa ouviu 1.074 moradores de favelas

Como O GLOBO revelou ontem, a pesquisa ¿ que ouviu 1.074 moradores de favelas da cidade (com margem de erro de 3%) ¿ quebra alguns mitos sobre essas regiões. A maioria apóia o uso de blindados (os caveirões) pela polícia em ações nas favelas e acredita que o Exército deveria atuar na segurança pública. A maior parte dos moradores se mostrou contra a pena de morte e a liberação de drogas leves. O historiador Andrelino Campos, professor da Uerj com mestrado sobre a violência nas favelas, destaca um mérito da pesquisa:

¿ O levantamento alcançou o que pretendia: uma radiografia do imaginário do morador de favela e o pensam dele. Porém, em alguns trechos, ela conduz o entrevistado a manter uma imagem que o separa da dita cidade formal: crime organizado, cultura, lazer e segurança.

Os níveis de infra-estrutura básica informados na pesquisa são muito superiores aos que existiam nessas comunidades na década de 60, quando só 22% tinham água e 79%, energia elétrica. Os números se assemelham aos da pesquisa do Censo do IBGE de 2000 em relação à eletricidade e água encanada. Eles evoluíram, porém, em relação ao esgotamento sanitário e ao asfaltamento. Caso corresponda à realidade, a proporção de moradores que vive em imóveis com esgotamento sanitário é muito maior do que quase todos os municípios da Região Metropolitana.

Um dado chama a atenção: apenas 24% dos entrevistados têm iluminação pública e 11% dizem ter coleta de lixo. Mas, perguntados sobre que tipo de agente do poder público atua regularmente na rua, garis (54%) são os mais citados, seguidos de policiais (45%) e mata-mosquitos (36%). Nesta questão, as respostas eram múltiplas.

O presidente da Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro (Faferj), Rossino Castro Diniz, diz que, mesmo havendo melhoria na qualidade de vida nas favelas, as condições ainda são difíceis. Como O GLOBO mostrou, 73% acham que a sociedade tem uma imagem distorcida das favelas:

¿ A pessoa ainda tem que, ao se candidatar a uma vaga de emprego, mentir e dizer que não mora em favela. Se disser a verdade, em geral, ela perde a vaga por causa do preconceito.

Serviços públicos ainda deixam a desejar

Se as condições de infra-estrutura estão avançando, os serviços públicos ainda deixam a desejar. Entrevistados (66%) disseram não haver área de lazer em suas favelas, médicos de família (65%), agentes de saúde (41%) ou postos de saúde (30%). O apoio às iniciativas econômicas também é pequeno. Dos entrevistados, 67% disseram não haver programas de micro-crédito nem de apoio à micro empresa nas favelas.

¿ Não existe médico de família, dentista e programa de qualificação profissional. Os únicos agentes que são vistos nas comunidades são garis e policiais. Eu não sou técnico em pesquisa, mas sou apaixonado pelo Rio e, ainda que questionem esses números, o melhor seria questionar a qualidade dos poucos serviços prestados ¿ disse o coordenador da Cufa, Celso Athayde.

A maior presença do estado se mostra na educação básica. Apenas 15% disseram não haver creche onde moram e 23%, que não há escola do ensino fundamental. Um total de 83% disse que as crianças e adolescentes freqüentam a escola. Já o número de pessoas que dizem não haver escolas de segundo grau, técnicas e superior é alto: 46%, 72% e 73%, respectivamente.