Título: Crise no Tibete chega à olimpíada
Autor:
Fonte: O Globo, 25/03/2008, O Mundo, p. 26

Cerimônia para acender a tocha na Grécia é marcada por manifestações contra a China

Num ato que irritou o governo Chinês e que pode ser uma prévia do clima dos próximos Jogos Olímpicos, manifestantes pró-Tibete furaram ontem os bloqueios policiais e organizaram protestos na tradicional cerimônia para acender a chama olímpica, em Olímpia, na Grécia. Um dos manifestantes conseguiu se aproximar do presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Pequim, Liu Qi, durante seu discurso, com um cartaz, o que causou um notório constrangimento nas autoridades. A TV chinesa, que cobria ao vivo o evento, imediatamente censurou a cena, mudando as câmeras de posição até que o manifestante fosse retirado por policiais. Outros manifestantes tentaram interromper o evento e atrapalhar o início do revezamento da tocha. A ONG Repórteres Sem Fronteira (RSF) assumiu a autoria dos protestos, e Pequim anunciou que montará um esquema de segurança ¿sem precedentes¿ para evitar incidentes durante os Jogos.

¿Se a chama olímpica é sacrificatória, os direitos humanos são ainda mais. Não podemos deixar o governo chinês aproveitar a chama olímpica, um símbolo de paz, sem condenar a dramática situação dos direitos humanos no país¿, disse a Repórteres Sem Fronteiras num comunicado.

O secretário-geral da RSF, Robert Menard, assistiu à cerimônia numa área vip destinada a personalidades e membros do Comitê Olímpico Internacional, segurando um cartaz preto com cinco algemas substituindo os anéis coloridos que formam o símbolo dos Jogos, o que provocou constrangimentos. Um cartaz semelhante foi usado pelo manifestante que furou o bloqueio policial durante a cerimônia.

Violência já matou 130, dizem tibetanos

O presidente do Comitê Organizador dos Jogos procurou manter a aparência calma, apesar da tensão ter marcado toda a cerimônia.

¿ A chama olímpica vai irradiar luz e felicidade, paz e amizade, e esperança e sonhos para o povo da China e de todo o mundo ¿ declarou ele.

Mais do que um grande evento esportivo, a China encara as Olimpíadas de Pequim como um evento político, que pretende mostrar a grandiosidade do país, sua tecnologia e capacidade de organização. Protestos que chamem a atenção do mundo, e principalmente dos chineses, para problemas como a onda de violência no Tibete, são encarados pelo governo como questões de segurança nacional. Irritado com os protestos de ontem, o governo anunciou que montará um ¿esquema exemplar e sem precedentes¿ de segurança para evitar manifestações. A tocha, no entanto, deve passar por 20 países antes de chegar a Pequim, e tanto a RSF quanto outras ONGs prometem mais manifestações.

¿ Vamos continuar lutando ¿ disse Robert Menard.

Outro fato que gerou protestos da China foi um relatório divulgado pelo Departamento de Estado americano, alertando que os turistas que estiverem em Pequim durante os jogos ¿poderão ser investigados e ter correspondências violadas, sem terem conhecimento disso¿. Os EUA reafirmaram, no entanto, que não pretendem boicotar as Olimpíadas por causa do Tibete. No entanto, tanto a secretária de Estado, Condoleezza Rice, quanto o presidente da França Nicolas Sarkozy, pediram moderação a Pequim.

Ontem o governo tibetano no exílio disse que a repressão às manifestações no Tibete já deixou mais de 130 mortos.

¿ O número de mortos é preocupante e merece atenção do mundo ¿ disse o primeiro-ministro do Tibete no exílio, Samdhong Rinpoche

No Nepal, 250 pessoas foram presas em manifestações contra a China. Pequim também disse que um policial morreu durante violentos confrontos na província de Sichuan.