Título: Acorda, Brasil!
Autor: Virgílio, Arthur
Fonte: O Globo, 20/03/2008, Opinião, p. 7

A Amazônia voltou ao centro do debate internacional após a divulgação dos recentes relatórios do Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em visível contraste com um Brasil que insiste em ignorar sua região mais estratégica, nevrálgica, promissora e vulnerável. Tudo isso ao mesmo tempo, compondo paradoxo que não será compreendido por quem mantenha visão provinciana sobre a questão.

Vejo três pontos a serem postos, imediatamente, na tão necessária discussão:

a) os desmatamentos, na região, representam preocupante fator de emissão de CO, embora, estatisticamente, significam, ainda, causa secundária para o problema mundial, pois respondem por cerca de 3% das emissões globais atuais de gases-estufa;

b) a Floresta Amazônica desempenha, porém, papel de sumidouro de CO, de responsabilidade de outros países, e na mitigação da ameaça climática, conforme assinalam respeitáveis pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - Inpa;

c) a Amazônia apresenta vulnerabilidades sensíveis, diante das mudanças climáticas que se estão processando em ritmo preocupante, havendo previsões de aumento de temperatura superior a cinco graus. Isso é mais do que a média prevista para o Brasil como um todo, encerrando enorme possibilidade de prejuízos para a biodiversidade, para o regime de chuvas e para os 25 milhões de vidas que povoam a região.

Está mais do que na hora, então, de enérgica tomada de consciência interna e de vigorosa ação diplomática. A questão amazônica já ultrapassou os limites do debate de política ambiental para se localizar no centro da política econômica, das relações entre os povos e do futuro da Humanidade.

É intolerável que os principais líderes políticos do país conheçam a Amazônia pelos perfunctórios briefings de assessores que vão buscar informações no Google. É inaceitável que o governo não fique coeso em torno de uma só visão sobre o tema.

É irresponsabilidade demasiada. É mistura de baile da Ilha Fiscal com má-fé diante da História.

Se não administrarmos a região com responsabilidade máxima, estaremos dando pretexto até a intervenções militares internacionais. Algo como metade do atual território brasileiro virando Protetorado, supostamente, dirigido pelas Nações Unidas.

O Brasil desconhece a Amazônia legal, que reúne, toda ela, não mais que 3.400 doutores e PhDs, enquanto a USP, sozinha, conta com mais de cinco mil membros nesse nível de preparo. E soberania nacional, hoje, é, sobretudo, conhecimento!

O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - Inpa e o Museu Goeldi, aquele sediado em Manaus e este em Belém, dispõem de dotações orçamentárias risíveis diante do desafio que está à nossa frente. Um navio alemão pode chegar ao Rio Solimões, encher seus porões de água e levá-la para meticuloso estudo em laboratórios de primeira linha. Ou um americano pode passar três dias num hotel de selva sem tirar o casaco e levá-lo para possível exame de fungos, em seu país. Absurdos? Pode ser. Mas o fato é que não temos como impedir uma coisa assim e não dispomos de laboratórios suficientemente equipados para estudar o que é nosso.

Soberania nacional é também ocupação civil das fronteiras e dispositivos militares eficazes. No Sudeste, que não faz fronteira com país nenhum, há mais soldados que no Comando Militar da Amazônia, que tem a seu encargo vastas fronteiras pelas quais se desenvolvem ações das Farc, de Chávez e quejandos.

Finalmente, para quem gosta e para quem não gosta: 98% da cobertura florestal da Amazônia estão de pé no Amazonas, diferentemente de estados vizinhos, graças aos incentivos fiscais, que, sustentando o Pólo Industrial da Zona Franca de Manaus, aliviam a pressão sobre a floresta.

ARTHUR VIRGÍLIO é senador (PSDB-AM).