Título: Frota a serviço do mosquito
Autor: Webber, Demétrio; Costa, Célia
Fonte: O Globo, 20/03/2008, Rio, p. 12

Carros cedidos para o combate ao "Aedes" viram criadouros do vetor

A frota cedida pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) à Prefeitura do Rio em 2002 para o combate à dengue está servindo de criadouro do Aedes aegypti. Cerca de 20 picapes Corsa - que têm a parte traseira da carroceria aberta, acumulando água da chuva - estão paradas num depósito do município na Estrada das Capoeiras, em Campo Grande, numa área descoberta e com mato alto. Segundo o vereador Carlos Eduardo de Matos, presidente da Comissão de Saúde da Câmara, os veículos abandonados foram cedidos pela Funasa, em comodato. Na época, o município recebeu 218 carros para o combate à dengue. Foram doadas 163 picapes Corsa, 22 Fiats Strada, 25 Rangers e sete S-10, além de um caminhão-frigorífico.

- O prefeito disse que não poderia usar os carros porque não cabia toda a equipe de agentes e que os veículos eram inadequados para o transporte dos equipamentos. Mas por que as picapes não foram usadas para levar os agentes às comunidades no trabalho educacional sobre a dengue? - indaga Carlos Eduardo, que pretende entrar com uma notícia-crime no MP federal contra o mau uso da verba pública no combate à dengue.

De acordo com levantamento feito por Carlos Eduardo, dos 218 veículos cedidos ao município, 32 deles foram devolvidos à Funasa, de 56 não se tem registro do que aconteceu e os outros estão com defeitos mecânicos ou danificados, foram doados ao estado, roubados, ou são usados para prestar serviços à Secretaria municipal de Saúde.

- O município ainda não explicou o destino dos 56 carros desaparecidos. O que estamos vendo é o retrato do descaso com que a prefeitura trata a população - afirmou o vereador.

A Secretaria municipal de Saúde alega que os carros cedidos pelo Ministério da Saúde são inadequados para o combate à dengue porque não podem carregar as equipes completas. Segundo o órgão, os veículos são vistoriados diariamente e estão em manutenção para serem devolvidos ao Ministério da Saúde. A Funasa informou que, por se tratar de um comodato, a responsabilidade dos carros passa a ser do município, que deve restituir os bens em caso de danos. Para a vizinhança do depósito onde estão guardados os carros, em Campo Grande, a área com mato alto e veículos abandonados é motivo de preocupação.

- Além do risco de criadouro do mosquito, o que mais revolta é o descaso da prefeitura. Os carros estão em uma área enorme, que poderia ser usada como um centro social ou até mesmo uma unidade de ações contra a dengue - diz o comerciante Mariano Mendes de Oliveira, que trabalha numa loja próxima.

O epidemiologista Roberto Medronho, do Núcleo de Saúde Coletiva da UFRJ, disse que as caixas d"água são os maiores criadouros do Aedes. Segundo ele, os reservatórios, quando mal fechados, são ambientes perfeitos para a proliferação do mosquito:

- O mosquito não gosta de luz e prefere locais úmidos. Uma caixa d"água mal fechada é perfeita para o Aedes. Infelizmente, nem todos controlam seus reservatórios, verificando se há alguma rachadura na tampa e se está bem colocada.

O especialista acredita que, se os fabricantes desses reservatórios vendessem as tampas avulsas, as coisas seriam mais fáceis. Ele argumentou que cabe ao Governo Federal, através do Ministério da Saúde, distribuir esses materiais, principalmente para as pessoas de baixa renda.