Título: Prefeito lava as mãos e culpa hospitais do estado
Autor: Costa, Célia; Magalhães, Luiz Ernesto
Fonte: O Globo, 20/03/2008, Rio, p. 13

"AEDES" ATACA: Infectologistas confirmam que há epidemia

Cesar volta a dizer que casos de dengue estão em queda

O prefeito Cesar Maia responsabilizou ontem os hospitais da rede estadual pelo alto índice de mortes provocadas por dengue (29 na capital). Ele afirmou que a maior parte dos óbitos (12, segundo ele) ocorreu em hospitais da rede do estado. No ranking de Cesar, aparecem a seguir a rede privada (6); unidades da prefeitura (6) e federais (4). Um dia depois de o epidemiologista Roberto Medronho, do Núcleo de Saúde Coletiva da UFRJ, analisar a incidência da dengue no Rio nos últimos dez anos e afirmar que a cidade enfrenta uma epidemia desde janeiro, o prefeito voltou a negar a gravidade da situação e alegou que o número de caso está numa curva declinante:

- Quando fazemos as correções por amostras e pelos exames laboratoriais, confirmamos que o pico se deu entre fins de janeiro e início de fevereiro. Nesse momento estamos com curva declinante, que só podemos confirmar em mais uns dias. Mas podemos confirmar desde já que os novos casos de letalidade estão caindo com as medidas adotadas e esta é nossa prioridade máxima.

A Secretaria municipal de Saúde também se recusa a admitir que haja epidemia. Nenhum técnico da secretaria quis comentar a avaliação feita pelo epidemiologista. A Secretaria estadual de Saúde preferiu não comentar as afirmações do prefeito. Para o vereador Carlos Eduardo (PSB), presidente da Comissão de Saúde da Câmara de Vereadores, Cesar tenta desviar o foco:

- A responsabilidade é da prefeitura, que, se não tivesse falhado na prevenção, não estaria assistindo a tantas mortes. Além disso, a maioria dos casos e das mortes ocorre na Zona Oeste. Com exceção do Hospital Lourenço Jorge (Barra), o atendimento de emergência é feito em unidades do estado.

Infectologista aponta falhas na prevenção

O presidente da Sociedade de Infectologia do estado, Jacob Kierszenbaum, disse não ter entendido a classificação por responsabilidades feita pelo prefeito:

- O problema é que este é um ano eleitoral, o que interfere na discussão do problema.

Para o infectologista Edmilson Migowsky, da UFRJ, a lotação dos hospitais prova que houve falha na prevenção:

- O controle de vetores é uma responsabilidade dos municípios. Como ele falhou, as emergências lotaram - disse.

O parâmetro usado por Medronho para definir uma epidemia, que é a média histórica de casos nos últimos dez anos, excluindo os anos epidêmicos, é considerado correto por outros especialistas. O infectologista Gustavo Johanson, da Universidade Federal de São Paulo, disse que o cálculo está correto, mas a classificação de epidemia é um critério:

- O termo não diz respeito a um número absoluto. É o que ultrapassa o esperado. Eles (a Secretaria de Saúde do Rio) estão sendo tecnocratas e devem considerar que a palavra epidemia dá impressão de que a situação esteja fora de controle.

Para a presidente do Cremerj, Márcia Rosa Araújo, já há uma epidemia:

- As portas dos hospitais traduzem isso.

Ontem à tarde, o sindicato dos trabalhadores em saúde do estado (Sindsprev-RJ) acusou a prefeitura de estar planejando centenas de demissões de agentes comunitários de saúde que atuam em comunidades da Zona Oeste, área mais afetada pela doença.