Título: O polêmico amigo do Ciro que une PSDB e PT em BH
Autor: Vasconcelos , Adriana
Fonte: O Globo, 23/03/2008, O País, p. 10

Candidato de Aécio e Pimentel foi acusado de sacar dinheiro do valerioduto, mas PF concluiu que foi intermediário

BELO HORIZONTE. Ele nunca disputou uma eleição na vida e só recentemente se filiou oficialmente a um partido, mas está prestes a conseguir o que parecia impossível: unir o PT e o PSDB numa aliança eleitoral. O nome dele é Márcio Lacerda, atual secretário de Desenvolvimento Econômico do governo de Minas, cotado para ser candidato à prefeitura de Belo Horizonte com o apoio do atual prefeito, o petista Fernando Pimentel, e de nada menos do que dois presidenciáveis: o governador mineiro Aécio Neves e o deputado Ciro Gomes (PSB-CE). Ainda desconhecido no cenário político nacional, Lacerda é sempre apontado como o "amigo de Ciro".

Márcio Lacerda começou em 1963 sua militância política no antigo PCB, e ficou quase quatro anos de prisão no regime militar. Foi na Penitenciária de Linhares, em Juiz de Fora (MG), onde permaneceu um ano, que ele conheceu Fernando Pimentel.

- O melhor lugar para se conhecer uma pessoa é na prisão. Ou você fica amigo para sempre ou não quer ver nunca mais - brinca hoje o prefeito de Belo Horizonte.

Depois de conseguir liberdade condicional em 1973, Lacerda optou por se distanciar do mundo político e transformou-se num empresário da área de telecomunicações. É considerado hoje um homem rico. Sua volta ao cenário político se deu em 1999, quando pediu para ser apresentado a Ciro Gomes. Entusiasmado com o projeto político de Ciro, se engajou na sua campanha à Presidência da República em 2002 cuidando da área financeira, embora não tenha assumido oficialmente o posto de tesoureiro.

Isso lhe garantiu a indicação posterior para o cargo de secretário-executivo do Ministério da Integração Nacional, quando Ciro virou ministro de Lula, mas também o levou a figurar na lista do mineiro Marcos Valério, operador do mensalão do PT, como recebedor de cerca de R$500 mil do valerioduto.

A denúncia levou Lacerda a deixar o cargo no Ministério da Integração Nacional. Na CPI dos Correios, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares confirmou que houve um saque de R$457 mil da conta de Marcos Valério por Márcio Lacerda, "para pagar despesas da campanha presidencial de Lula no segundo turno", à qual Ciro aderiu.

As investigações da CPI dos Correios e da Polícia Federal, porém, concluíram que Lacerda teria sido um contato entre Marcos Valério e a agência de publicidade New Trade, que trabalhou na campanha de Ciro e teria sido a beneficiária final dos recursos repassados pelo operador do mensalão. Assim, ele se livrou de ser processado pelo Ministério Público no escândalo do mensalão e chegou a ser convidado a reassumir o posto ao lado de Ciro, mas se recusou. Há um ano foi convidado por Aécio para comandar a Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Minas.

Não é por acaso que Márcio Lacerda passou a ser cotado para assumir a missão de representar na eleição de Belo Horizonte dois partidos que, no cenário nacional, são adversários. Apesar da falta de experiência política, Lacerda tem a seu favor alguns fatores que poderão viabilizar sua campanha. Além de ser filiado ao PSB, partido que tanto compõe a base do governo Lula como a de Aécio, seu índice de rejeição junto ao eleitorado é zero. Além disso, tem bom trânsito no mundo empresarial e junto à esquerda.

- É um diamante bruto que precisa ser trabalhado - sintetiza um de seus aliados.

Ainda arredio aos contatos com a imprensa, Lacerda é cauteloso quando abordado sobre a possibilidade de disputar a sucessão de Pimentel.

- Eu não estou falando sobre esse assunto. Não sou candidato. Vamos aguardar os acontecimentos - desconversa, desconfiado.