Título: Aliada ao governo, UNE tenta conquistar massas
Autor:
Fonte: O Globo, 23/03/2008, O País, p. 14

Entidade faz convênio com ministério e rodará país fazendo campanha pela liberação do aborto

SÃO PAULO e RIO. Com a militância mais enfraquecida e bandeiras muito diferentes daquelas empunhadas na década de 60, a União Nacional dos Estudantes (UNE) tenta dar uma volta na própria história em 2008. Com cerca de 120 mil ativistas e um universo de 5,5 milhões de estudantes, a UNE tenta reviver um pouco dos tempos de João Goulart em pleno governo Lula. Apoiadores de Lula, os estudantes acabam de firmar um novo convênio com o governo. A idéia é retomar a estratégia da UNE Volante - que em 1963 percorreu o país para ganhar as massas. No próximo dia 7, será lançada a Caravana da Saúde, que vai percorrer todos os estados brasileiros. O mote agora são as novas reivindicações estudantis, além da educação: liberação do aborto, das drogas leves e o fim do preconceito contra o homossexualismo.

- A gente vai voltar a rodar o país. Vamos abordar a necessidade de liberação do aborto, da descriminalização das drogas, os problemas do álcool. Fizemos um convênio com o Ministério da Saúde, que também defenderá suas propostas na caravana. - disse a diretora de Comunicação da UNE, Luana Bonone, estudante de jornalismo.

Para lembrar o lendário Centro Popular de Cultura (CPC), a entidade tem conseguido apoios de governos e parlamentares para estruturar bienais de cultura. Foi com o CPC e a UNE Volante que a organização saiu da Praia do Flamengo e encontrou a massa dos estudantes país afora. Logo depois, em 1964, com o golpe militar, a sede do Flamengo, 132, foi incendiada. Outra briga da UNE é reconstruir a sede, com base em um projeto feito agora por Oscar Niemeyer. Por enquanto, a entidade reconquistou o espaço na Justiça e faz atividades culturais no local.

Segundo a presidente da UNE, Lúcia Stumpf, a entidade não tem recebido repasses de dinheiro do governo federal. Os gastos com a caravana serão arcados pela própria entidade, que arrecada um montante de R$2 milhões por ano, provenientes da venda de carteirinhas estudantis. Já os projetos culturais têm sido feitos com o dinheiro de emendas parlamentares, segundo a presidente.

- Não fazemos parcerias com dinheiro público. O único financiamento público que temos é proveniente de emendas de parlamentares, de vários partidos, não só da base do governo, mas também da oposição, como o PSDB.

Segundo os líderes atuais da UNE, a bandeira principal da entidade, a educação laica, com cidadania, se mantém:

- O que mudou de 68 para cá foi a democracia. Temos muito mais liberdade de organização. Mas há ainda resquícios, como as cátedras (ensino departamentalizado), que é uma herança do acordo MEC-Usaid - avalia Luana Bonone.

Segundo ela, a organização interna também é mais aberta que a de 40 anos atrás:

- Como havia muita repressão nas décadas de 60 e 70, só participavam das decisões os mais engajados, os que tinham partido político. Era muito mais fechado. Hoje não. No ano passado, no Congresso, tivemos até uma chapa do DEM (Democratas) e uma outra, chamada Deus. A Deus era de um estudante que queria que o tema Deus fosse uma pauta na UNE.

Na composição da UNE, há 85 diretores, a maioria com filiação partidária. O PCdoB, partido da presidente e da diretora de Comunicação, é o maior e tem 20% dos cargos. A maioria é ligada ao PT, mas no movimento estudantil o partido é subdividido em correntes divergentes, que dificilmente agem conjuntamente.

www.oglobo.com.br/pais