Título: Os abalos do acordo Lula-Cabral
Autor: Camarotti, Gerson; Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 27/03/2008, O País, p. 3

Adversários reagem e o aliado Crivella cobra neutralidade do presidente, já com 3 palanques

Acartada do governador Sérgio Cabral e do presidente Lula, ao lançar a chapa PT-PMDB na disputa pela prefeitura do Rio, não apenas movimentou o jogo pré-eleitoral na capital como deixou em pé de guerra aliados do governo federal e fortaleceu projetos eleitorais do grupo do presidente no estado. Afetado diretamente pela perspectiva de mais um palanque para Lula na cidade - que agora terá três ou quatro garantidos -, o candidato do PRB a prefeito, Marcelo Crivella, foi ontem mesmo ao Palácio do Planalto para tentar garantir a neutralidade de Lula. Crivella conversou longamente com o vice-presidente José Alencar, de seu partido, em duas ocasiões, no Planalto e no Palácio do Jaburu - a residência do vice.

- Foi uma surpresa saber que o PMDB vai apoiar o PT. Agora, o presidente Lula disse várias vezes que, nas capitais onde houver mais de um candidato, só iria participar no segundo turno. E aqui temos vários candidatos - disse Crivella.

O presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini (SP), comemorou o acordo no Rio, mas reforçou a tese defendida por Crivella dizendo que o presidente Lula só subirá no palanque em estados com um só candidato da base. Além do PRB e de PT-PMDB, o PCdoB e o PDT têm pré-candidatos.

Pré-candidata do PCdoB, a ex-deputada federal Jandira Feghali disse que a opção do presidente pela neutralidade seria "a mais correta":

- O inimigo dele não é nenhuma candidatura da base aliada. Ele tem é que olhar o que é mais viável para ganhar a eleição.

Pré-candidato pelo PDT, o deputado estadual Paulo Ramos foi enfático:

- Esses conchavos já são da prática antiética da política do nosso estado.

O deputado Fernando Gabeira, candidato da frente PV-PPS-PSDB, afirma que não tem condições de analisar a possível aliança PMDB-PT porque desconhece "as bases em que foi feita":

- São muitas variáveis. Para onde vai o eleitorado do (Eduardo) Paes? Até que ponto a disputa entre Molon e (Marcelo) Crivella pelas obras do PAC pode enfraquecer a ambos?

"Um homem de bem com os de bens"

Conhecido, em sua atuação parlamentar, como uma espécie de estilingue com a mira certa nos atos do Executivo e do Legislativo, o pré-candidato Alessandro Molon, que agora tem o apoio de Lula e Cabral, ganha, caso seja formalizada aliança entre o PMDB e o PT, três vitrines para gerenciar. Será candidato dos partidos de Lula e de Cabral, com a bênção do presidente da Assembléia, Jorge Picciani - de quem foi ferrenho opositor.

A ginástica para colar sua imagem a Lula e Cabral, sem arranhá-la com a aparente incoerência de estar ao lado de Picciani, será o desafio crucial da campanha petista. Quem avalia é o ex-petista e amigo de Molon, deputado federal Chico Alencar, pré-candidato do PSOL. Foi com uma dobradinha com Alencar, quando ambos estavam no PT, que Molon se elegeu pela primeira vez deputado estadual em 2002.

- Ele vai viver a contradição de ser um homem de bem cercado por homens de bens - ironizou Chico Alencar, em referência à série de reportagens do GLOBO que denunciou enriquecimento de parlamentares fluminenses, entre eles Jorge Picciani.

Chico Alencar, católico praticante como o ex-aliado, afirma que, no atual mandato, Molon se tornou governista. E usa um trecho do Evangelho para cutucá-lo:

- Não se coloca remendo novo em pano velho. Ele vai apenas agregar sangue novo na velha política. Estamos diante de um "neomolon". Ele mudou muito.

Pré-candidata do DEM, com quem o PMDB negociava a vaga de vice, a deputada Solange Amaral disse que o lançamento do nome de Molon ajuda a definir com clareza os adversários.