Título: Uribe cede para reaver Ingrid
Autor:
Fonte: O Globo, 29/03/2008, O Mundo, p. 53

Presidente oferece dinheiro e liberdade a guerrilheiros após relatos sobre saúde de refém das Farc

BOGOTÁ

AColômbia lançou uma nova proposta para a guerrilha entregar a ex-senadora Ingrid Betancourt, oferecendo redução de sentenças, soltar guerrilheiros presos e dinheiro em troca da liberdade dela e de outros reféns. Um decreto autorizando a proposta foi assinado no fim da noite de quinta-feira, horas depois de ser revelado que o estado de saúde da ex-senadora havia se deteriorado ainda mais, obrigando as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) a buscarem atendimento médico em postos próximos à selva. A urgência na proposta é uma indicação de que o presidente Alvaro Uribe não quer correr o risco de ser responsabilizado pela morte da refém em cativeiro.

Uribe disse que o governo mantém um fundo de US$100 milhões para recompensar guerrilheiros que entreguem reféns e abandonem as Farc.

- Faço um apelo aos que mantêm Ingrid e a todos os seqüestrados que os libertem. Se as Farc querem ter algum futuro, necessitam contribuir imediatamente para a paz - disse Uribe, que hoje vai a San José del Guaviare, na fronteira da Colômbia, onde a ex-senadora teria sido atendida.

Seqüestrada em 2002, Ingrid, que tem nacionalidade colombiana e francesa, foi vista num vídeo em novembro, muito magra. Na quinta-feira, o defensor do povo, Vólmar Pérez, revelou que a guerrilha buscou atendimento para ela, que sofre de leishmaniose, hepatite B e desnutrição. Horas mais tarde, o comissário para a Paz, Luis Carlos Restrepo, informou que Uribe havia assinado o decreto, contendo "um mecanismo diligente e imediato para o acordo humanitário".

Segundo Restrepo, basta as Farc libertarem Ingrid, as outras 39 pessoas consideradas "cambiáveis" ou os demais reféns, mais de 700, para que "um número singular ou plural" de presos seja solto. Os guerrilheiros podem mesmo ter sido condenados por crimes não suscetíveis à anistia, destacou o comissário, mas devem abandonar a luta armada. Eles receberiam a suspensão condicional da pena ou a aplicação de uma pena alternativa.

- A libertação imediata de Ingrid seria o suficiente para considerarmos que o intercâmbio humanitário está a caminho, e nós suspenderíamos condicionalmente as sentenças dos guerrilheiros como parte do acordo - disse Restrepo.

Ele admitiu que o governo recebera três dias antes informações sobre a deterioração do estado de saúde de Ingrid e que começou a trabalhar na medida excepcional à noite. No entanto, admitiu que o apelo do defensor do povo precipitou a decisão.

- Nesse caso não podemos correr riscos - acrescentou.

Medida não cita desmilitarização

Ontem, a Igreja Católica se somou aos apelos pela libertação de Ingrid e de todos os reféns, descrevendo o caso da ex-senadora como de vida ou morte. Fontes na Igreja revelaram ter recebido informações de que uma pessoa, que poderia ser Ingrid, foi vista em estado muito grave numa aldeia do departamento de Guaviare.

Na França, o ministro das Relações Exteriores, Bernard Kouchner, considerou a proposta "muito positiva". Astrid Betancourt, irmã da ex-senadora que estava ontem em Paris, considerou que "há algo positivo evoluindo".

- Se não houver um gesto das Farc, isso vai ser analisado de forma muito negativa pela comunidade internacional - disse Astrid.

A proposta, no entanto, não cita uma das principais reivindicações da guerrilha: a desmilitarização dos municípios de Pradera e Florida para a negociação da entrega dos reféns. Até a noite de ontem, as Farc não haviam respondido. Em Paris, o ex-marido de Ingrid, citou condições que a guerrilha não aceitaria, como a exigência de não voltar a pegar em armas:

- Tememos que Uribe queira usar este gesto porque sabe que Ingrid está mal e não quer carregar a responsabilidade de sua morte - disse.