Título: Demissões nas papeleiras
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 03/05/2009, Política, p. 7

Ao contrário do que previa o governo gaúcho ao anunciar investimentos de R$ 10,7 bilhões no setor até 2011, empresas cortam postos de trabalho

Aracruz suspendeu expansão de Guaíba e extinguiu duas mil vagas A indústria da celulose não tinha a solidez nem a capacidade de geração de empregos anunciadas pelo governo do Rio Grande do Sul há um ano, quando o Correio publicou a série O preço da devastação, relatando a expansão das plantações de eucaliptos e os projetos de construção e ampliação de fábricas. O setor era visto como a salvação econômica para a empobrecida metade sul do estado. A crise internacional, uma aposta errada no mercado financeiro e dificuldades para legalizar a compra de terras abalaram as papeleiras Aracruz, Votorantim e Stora Enso. A realidade hoje é de corte de investimentos, demissões, fechamento de vagas e suspensão de novos plantios no estado.

No ano passado, o governo de Yeda Crusius anunciava investimentos de R$ 10,7 bilhões até 2011. Seriam plantados mais 440 mil hectares de eucaliptos e gerados 816 mil novos empregos, o que representa 40% da população economicamente ativa do estado. Para acelerar a expansão das papeleiras, o governo gaúcho atropelou as leis ambientais e mudou o comando da Secretaria de Meio Ambiente. Na campanha eleitoral de 2006, as papeleiras haviam doado R$ 2 milhões aos políticos gaúchos, sendo R$ 500 mil para Yeda.

A crise econômica mundial atingiu em cheio o setor de papel e celulose. A Aracruz perdeu US$ 2,13 bilhões em operações com derivativos (um negócio tão lucrativo quanto arriscado). Renegociou a dívida em nove anos. A empresa suspendeu o projeto de quadriplicação da fábrica de Guaíba. Dos R$ 4,9 bilhões previstos para o empreendimento, a companhia investiu até agora R$ 1,2 bilhão. A retomada do projeto está prevista para 2011. Segundo a papeleira, o projeto de expansão deveria gerar 1,2 mil postos de trabalho, sendo 1 mil no setor florestal e 250 na área industrial. Com o adiamento do projeto de Guaíba, comunicou a suspensão dos plantios em 2009 e o desligamento de cerca de 2 mil trabalhadores na área florestal.

Novo dono Em meio à crise financeira, a Aracruz passa pela mudança do seu controle acionário. A Votorantim acertou a compra das ações dos grupos Lorentzen e Safra e ficou com 84% do capital votante da Aracruz. Pagou R$ 2,7 bilhões a cada sócio. A Votorantim está instalada na zona Sul do estado, onde mantém 59 mil hectares de plantações de eucaliptos. Vai implantar uma fábrica na região. A empresa informa que ¿o plano de expansão está sob revisão de cronograma¿.

A sueco-finlandesa Stora Enso opera na fronteira oeste. No ano passado, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) vetou a compra de 40 mil hectares de terras pela empresa na faixa de fronteira (150 quilômetros), por se tratar de uma empresa estrangeira. Com dificuldades na área jurídica e diante da crise de mercado, a Stora Enso anunciou na semana passada a suspensão total do plantio previsto para este ano no estado, cerca de 4 mil hectares. Em nota ao Correio, a multinacional afirmou que a suspensão de novas plantações ¿decorre de uma decisão da empresa de restringir investimentos em todo o mundo em virtude da crise econômica global. A questão da autorização governamental para a compra de terras em zona de fronteira não pesou na decisão¿. Mas informou que aproximadamente 200 pessoas serão desligadas ou deixarão de ser contratadas.

Antes otimista e exagerado nos números, o governo gaúcho agora adota a cautela. Encarregado de falar pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento, o assessor técnico do Projeto Madeira Túlio Carvalho afirma que é difícil prever um prazo de recuperação para o setor da celulose. ¿Os especialistas dizem que a retração vai ser menor onde há um mercado interno forte. Mas esse não é o caso da celulose, que exporta 90% da produção. A expectativa é que o setor deve bater no fundo do poço em 2010 e começar a se reerguer em 2011¿.

Carvalho afirma que as ¿papeleiras exportadoras¿ aquecem a economia local, mas acrescenta que somente a ¿cadeia madeira¿, que envolve a indústria moveleira, construção civil, energia, geraria emprego e renda em larga escala. ¿As papeleiras podem ser a solução para a economia gaúcha? Acho difícil¿. Carvalho diz que o número de 816 mil empregos a serem gerados no estado foi calculado pela Fundação de Economia e Estatística, mas faz uma ressalva: ¿Houve um viés de análise das pessoas que se apropriaram dessa informação. Isso é válido para a cadeia madeira, e não para o setor de celulose. ¿Se chegarmos a 1 milhão de hectares plantados, teremos 20 mil empregos na área florestal¿.