Título: Raúl libera hotéis para cubanos
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Fonte: O Globo, 01/04/2008, O Mundo, p. 25

População tem acesso a locais reservados a estrangeiros e poderá alugar carros e motos

HAVANA

Numa medida há tempos esperada pela população, o presidente de Cuba, Raúl Castro, liberou ontem a entrada de cubanos nos hotéis e praias exclusivas da ilha, que eram ocupados apenas por visitantes estrangeiros. A população também ganhou o direito de alugar carros e motos. Hoje, haverá uma outra pequena revolução nos hábitos dos cubanos: eles poderão comprar em lojas comuns aparelhos eletrodomésticos até então conseguidos a duras penas, como computadores e aparelhos de DVD.

A série de medidas, que se somam ao início das vendas de celulares, na semana passada, ocorre pouco mais de um mês depois de Raúl ter feito seu primeiro discurso como presidente. No dia 24 de fevereiro ele afirmara que começaria a levantar as ¿proibições mais sensíveis¿, dias depois de ter reclamado do ¿excesso de proibições¿ no país.

¿ Os cubanos agora podem ficar nos nossos hotéis. As portas estão abertas para o turismo local ¿ disse o gerente de um pequeno hotel estatal na Cidade Velha de Havana, que pediu para não ter o nome revelado.

A medida foi confirmada pelas grandes redes de hotelaria estrangeiras, como a Meliá e a Accor. Diferentemente do anúncio, publicado na imprensa oficial cubana, da liberação da compra de telefones celulares, a abertura dos hotéis para a população local foi feita de forma discreta. Apenas a rede hoteleira recebeu um comunicado do governo. Nada foi noticiado nos meios oficiais. Mas, como muita coisa na ilha, a notícia rapidamente se espalhou pelo país de boca em boca.

¿ Demorou muito tempo, mas agora foi decidido. Vou começar a economizar agora para ir a Varadero no verão ¿ disse Martin Diaz, um operário cubano de 34 anos, em Havana, referindo-so ao famoso balneário.

Os cubanos só podiam se hospedar nos hotéis com autorização especial do governo. As únicas exceções eram para recém-casados, que podiam passar a lua-de-mel nos hotéis, ou prêmios para trabalhadores ou estudantes com alta produtividade ou que tivessem uma conduta considerada altamente ¿patriótica¿. Os cubanos podiam freqüentar restaurantes, mas não se hospedar.

As restrições foram impostas no início da década de 90, após o colapso da União Soviética e o início do ¿período especial¿ em Cuba. O país decidiu se abrir para o turismo internacional como forma de conquistar divisas, adotando uma cotação mais alta para os estrangeiros, o peso convertido. De acordo com o governo, a decisão de impedir cubanos de entrar nos hotéis foi uma forma de evitar um aumento na desigualdade social ¿ embora críticos indiquem que a medida apenas evitou tornar este fenômeno visível.

Segundo fontes ligadas ao governo, cerca de cem lojas receberão hoje permissão para vender computadores e outros eletrodomésticos para a população. Não está certo ainda, no entanto, como será feita a cobrança dos produtos.

¿ Isto é um sonho. Mas agora é preciso ver a que preço vão vender as coisas ¿ disse, diante de uma loja, em Havana, um jovem de 30 anos que se identificou como Miguel.

Pesos convertidos e dólares nos hotéis

Pelo menos nos hotéis, as tarifas continuarão a ser cobradas em pesos convertidos, que valem 24 vezes mais do que os pesos normais. A média salarial cubana é de 408 pesos, o equivalente a menos de US$19. Em hotéis como o Sol Meliá e o Ambos Mundos, as diárias podem alcançar até US$200. As mais baratas saem por US$40.

Por outro lado, cerca de 60% da população cubana tem acesso a moeda estrangeira ou a pesos convertidos. Grande parte recebe através de remessas de parentes no exterior. Outros com gorjetas de turistas, já uma parcela da população consegue moeda forte no mercado paralelo.

Outro anúncio feito ontem é que o serviço de telefonia celular será aberto para toda a população a partir do dia 14 de abril. Hoje em dia, o serviço só está disponível para turistas estrangeiros. O governo afirma que o preço para a ativação da linha continuará sendo a atual, de 111 pesos convertidos, ou US$120. Os telefones funcionarão com cartões pré-pagos.

Até semana passada, quando o governo liberou a venda de celulares para os cubanos, a população apenas conseguia os aparelhos pedindo para amigos estrangeiros comprarem para eles, ou no mercado paralelo.

O governo espera, que, além de conseguir apoio com o fim de medidas impopulares, possa fortalecer o peso cubano. Principalmente quem ganha dinheiro com o mercado paralelo seria incentivado a comprar pesos convertidos, enxugando a quantidade de pesos na economia.