Título: Desembargador é denunciado no STJ por crime
Autor: Martin, Isabela
Fonte: O Globo, 03/04/2008, País, p. 12

José Lucena responderá por homicídio qualificado de radialista em 2003, no Ceará, assim como a mulher, ex-prefeita

Isabela Martin

FORTALEZA. O desembargador federal José Maria de Oliveira Lucena, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, foi denunciado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) como mandante do assassinato do radialista Nicanor Linhares Batista, ocorrido em junho de 2003, em Limoeiro do Norte, a 194 quilômetros de Fortaleza. Apesar da abundância de provas levantadas no inquérito, a denúncia contra o desembargador, acusado até de forjar provas e patrocinar a fuga de um dos pistoleiros, levou quase cinco anos para ser feita.

É a primeira vez que um desembargador é denunciado ao STJ por homicídio qualificado. A denúncia apresentada pela subprocuradora-geral da República, Cláudia Sampaio Marques, em 10 de março, pede o seu imediato afastamento do cargo. Ela admitiu a demora, mas disse que não pode ser responsabilizada. Segundo a subprocuradora, o inquérito tramitou lentamente, com demora na expedição e na realização das diligências.

A mulher de Lucena, a ex-prefeita de Limoeiro do Norte Maria Arivan de Holanda Lucena, também foi denunciada como mandante pelo Ministério Público do Ceará em 2006. O processo, que tramitava na 1ª Vara de Limoeiro, está suspenso devido a um recurso especial ao STJ, no qual ela pede direito ao foro privilegiado do marido. A defesa alegou que haveria dupla atuação da Justiça criminal.

Mulher quer direito a foro especial e vai se candidatar

Maria Arivan está perdendo por 13 votos contra um. Os cinco votos que faltam não mudarão o resultado, mas podem retardar ainda mais o andamento da denúncia contra o desembargador. O caso está nas mãos do ministro Hamilton Carvalhido, também relator do inquérito contra Lucena. Anteontem, o ministro decidiu que só vai intimá-lo a apresentar a defesa preliminar após a conclusão do julgamento do recurso de Maria Arivan.

Maria Arivan mantém pretensões políticas. Ela lançou sua pré-candidatura à prefeita de Limoeiro pelo PR. Caso seja eleita, ganhará direito a foro especial.

Nicanor foi morto em 30 de junho de 2003, no estúdio da rádio Vale de Jaguaribe, de sua propriedade. Ele gravava o seu programa diário, "Encontro político", de grande audiência na região, quando dois homens encapuzados invadiram o local. O radialista ganhara a inimizade do casal denunciado porque costumava fazer oposição à gestão de Maria Arivan, denunciando indícios de corrupção.

Nove pessoas foram acusadas, incluindo a ex-prefeita e o desembargador. Os outros sete foram denunciados em 2006 pela juíza Luciana Teixeira de Souza, da 1ª Vara de Limoeiro do Norte, mas não houve julgamento; seis bandidos estão presos preventivamente desde 2004 e um está foragido. Na denúncia, a subprocuradora acusa o desembargador de acobertar a fuga de José Vanderlei dos Santos Nogueira, um dos que atiraram no radialista.

O envolvimento de Lucena e de sua mulher está documentado na denúncia, de 70 páginas. A prefeitura mantinha até um dos bandidos na sua folha de pagamento. Um dos réus, Cassiano Santana de Sousa, encarregado de vigiar a rádio para avisar aos pistoleiros quando Nicanor chegasse, mantinha um contrato de prestação de serviços com a prefeitura de Limoeiro, de R$1.400, no período em que Maria Arivan era prefeita. O negócio - que seria aluguel de carros - não foi desfeito, mesmo após a prisão de Cassiano.