Título: O lento retorno do investidor estrangeiro
Autor: Simão, Edna
Fonte: Correio Braziliense, 03/05/2009, Economia, p. 24

Fluxo de recursos vindos do exterior começa a demonstrar fôlego semelhante ao período pré-crise. Analistas acreditam que o fenômeno está relacionado aos sinais de solidez da economia brasileira

Paulo Valle, do Tesouro Nacional, diz que os papéis negociados em bolsa ficaram muito baratos Gradualmente, os investidores estrangeiros estão dando o ar da graça e voltando a aplicar dinheiro no Brasil. O ingresso, porém, continua inferior aos números de agosto ¿ mês que antecedeu a eclosão da crise econômica mundial. A participação do estrangeiro na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) chegou a 36,5% em abril (preliminar). Já na dívida em títulos do país, atingiu 5,75% em fevereiro. Em agosto, esses números correspondiam a 34,7% e 7,37%, respectivamente. O retorno dos estrangeiros é importante para alongamento e redução do custo da dívida pública e para aumentar os investimentos produtivos.

A volta dos gringos, no entanto, está sendo mais rápida para a bolsa do que para a compra de títulos públicos do governo. Os papéis das companhias brasileiras estão mais atrativos porque se desvalorizaram demais por conta da crise econômica. Além disso, a perspectiva de queda das taxas de juros no país diminuiu a rentabilidade dos papéis do governo, afugentando os estrangeiros.

Essa preferência dos investidores que vem de fora pode ser verificada nos dados divulgados pelo Banco Central (BC). Em março, o investimento líquido total dos estrangeiros em ações de companhias brasileiras foi de US$ 852 milhões, o primeiro número positivo desde maio do ano passado (US$ 1,392 bilhão). Deste total, US$ 844 milhões são aplicações feitas em papéis negociados no país. No primeiro trimestre deste ano, houve uma retirada de US$ 7 milhões desse tipo de aplicação. Mas esse número foi revertido em abril. Até o dia 22, segundo dados do BC, houve a entrada de US$ 650 milhões.

Títulos públicos No caso dos títulos públicos também é verificado um retorno, porém, bem mais lento. A entrada líquida total dos estrangeiros para a renda fixa ficou negativa em US$ 370 milhões em março. Considerando apenas as aplicações em títulos de longo e curto prazo, esse valor está positivo em US$ 708 milhões. No trimestre, por outro lado, a saída é de US$ 1,655 bilhão. No acumulado de abril, até o dia 22, esse montante está no azul em US$ 237 milhões.

Na avaliação do economista-chefe da RC Consultores, Marcel Pereira, o barateamento dos ativos brasileiros ¿ um impacto da crise econômica mundial ¿ e os fundamentos sólidos da economia têm atraído o estrangeiro. ¿Eles estão confiantes no Brasil porque estão sentindo a solidez da economia¿, afirmou. A média do risco-país brasileiro (abaixo dos 400 pontos em abril) é inferior à dos emergentes, que passa dos 550 pontos. ¿Isso é um termômetro para os investidores¿, explicou Pereira. ¿A perspectiva de queda da Selic fez diminuir o interesse pelos papéis do governo. Mas o investidor está retornando¿, explica o economista.

Para a sócio-gestora da Global Equity, Patrícia Branco, num primeiro momento da crise, os estrangeiros saíram do país para recompor perdas que tiveram em suas matrizes. ¿Este ano, estão com apetite maior por risco. Portanto, é natural que comprem ações porque os juros estão caindo¿, reforça Patrícia. Segundo ela, o governo brasileiro está dando incentivos para vários segmentos, como habitação e obras de infraestrutura, que acabam se tornando uma boa oportunidade de investimento. ¿Os papéis de renda fixa (títulos públicos) são mais seguros, porém, no cenário atual, o investidor está buscando rentabilidade, que pode ser maior em ações¿, resume.

Migração O retorno mais rápido do estrangeiro para as aplicações em bolsa não surpreende o secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Paulo Valle. Ele afirma que os papéis negociados em bolsa ficaram muito baratos e que, por esse motivo, passaram a despertar o interesse do investidor. Mesmo com uma participação de apenas 5,75% do estrangeiro na Dívida Mobiliária Federal Interna (DPMi), Valle adverte que já é possível perceber uma elevação do apetite do estrangeiro. ¿O que pode estar acontecendo é uma migração do investidor do título de curto para longo prazo, que dá um ganho maior¿, ressalta Valle.