Título: Dossiê chegou a Congresso antes de CPI
Autor: Camarotti, Gerson; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 02/04/2008, O País, p. 8

PSDB e DEM dizem que relatório foi feito por petista para constranger oposição

BRASÍLIA. O dossiê com gastos sigilosos do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1998-2002) circulou pela mão de alguns parlamentares antes mesmo da instalação da CPI do Cartão Corporativo, no Congresso, no início de março. O GLOBO confirmou que pelo menos um senador de oposição recebeu o dossiê na ocasião. Na semana passada, numa reunião da bancada tucana, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) informou aos seus colegas que, no fim de fevereiro, já tinha em mãos o dossiê publicado na edição daquela semana da revista "Veja". Pelo menos três parlamentares tucanos confirmaram ontem essa versão. Procurado pelo GLOBO, Dias evitou comentários.

Mas, nessas conversas reservadas, Dias sempre evitou falar sobre a origem do dossiê. Disse que recebeu o relatório "nos corredores do Congresso", no período em que governo e oposição estabeleceram o embate pela criação da CPI. Pela versão do tucano, o relatório circulava pelo Congresso com o objetivo de chantagear a oposição, criar constrangimentos ao PSDB e confundir a opinião pública.

Dias explicou que o dossiê serviria para intimidar o discurso da oposição ao mostrar gastos semelhantes feitos pela Presidência nas gestões Fernando Henrique e Lula.

Oposição não descarta hipótese de "fogo amigo"

Para reforçar sua versão, o tucano falou em algumas ocasiões que parlamentares do PT e até mesmo ministros chegaram a citar informações semelhantes àquelas que aparecem no relatório de suprimentos de fundos com os gastos do governo Fernando Henrique. Mesmo assim, em nenhum momento ele disse a interlocutores que recebeu esses dados de um parlamentar da base governista com acesso aos dados.

Ontem, havia três hipóteses em debate nos bastidores de governo e oposição sobre quem produziu e repassou o dossiê. Tucanos e democratas apostam em duas possibilidades: a produção do dossiê por um petista instalado no Planalto ou um parlamentar petista, com o objetivo de constranger a oposição; e a alternativa de um eventual "fogo amigo" do PT, para prejudicar a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). Já os governistas consideram mais provável a hipótese de algum tucano que ainda tem acesso a dados da Presidência ter montado o dossiê.

- A divulgação desse dossiê interessa a quem está na oposição, a quem quer atacar a Dilma e a quem quer desgastar o governo. Pode interessar até a quem quer jogar o PT contra o PSDB. Cabe tudo - disse o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Despesas com comida e bebida

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), titular da CPI do Cartão Corporativo, reforçou:

- Esse relatório foi montado para atingir o governo, que foi o único prejudicado.

No dossiê, revelado pela "Veja" e que já circula por muitos gabinetes no Congresso, os gastos com as chamadas contas B da Presidência da República - e que deveriam estar protegidas pelo sigilo - aparecem de 1998 até 2001, mas sem seguir a ordem cronológica dos anos. As informações, claramente pinçadas, indicam que o ex-casal presidencial fazia despesas similares às dos atuais inquilinos do Palácio da Alvorada.

Além de listar compras de bebidas (vinhos, uísque, cachaça) e gêneros alimentícios - muitas vezes na mesma loja onde os ecônomos de Lula fazem compras -, o relatório aponta dados que deixam evidente a semelhança com casos do atual escândalo do cartão corporativo, como dezenas de locação de carros para dona Ruth Cardoso. Como fazia a ex-ministra Matilde Ribeiro (Igualdade Racial).