Título: Alencar: Lula precisa de mais tempo
Autor: Jungblut, Cristiane; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 02/04/2008, O País, p. 8

Presidente diz que reforma política tem de ser discutida "sem temas proibidos"

BRASÍLIA e SÃO PAULO. No mesmo dia em que o vice-presidente José Alencar disse que o povo quer que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "fique por mais tempo no poder", o petista defendeu ontem que o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) discuta a reforma política. Lula ressaltou que não há temas proibidos para o Conselho, e que também a reforma tributária é um desejo da sociedade. As declarações logo causaram polêmica, e o ministro das Relações Institucionais, José Múcio, apressou-se a dizer que Lula não quer a reforma política para tentar viabilizar um terceiro mandato.

Em entrevista em São Paulo, o vice disse que Lula gostaria de fazer seu sucessor, mas que o povo queria mesmo era que ele ficasse mais tempo. Alencar citou Franklin Roosevelt, que, nos Estados Unidos, ganhou um terceiro mandato e ficou no poder de 1933 a 1945 - passando pelo período da II Guerra Mundial.

- Falta muito para fazer. Sou democrata. O Lula deseja fazer o seu sucessor. Mas digo que, se você perguntar aos brasileiros, o que os brasileiros desejam é que Lula fique por mais tempo no poder. Por quê? Porque está bem o Lula, vai bem o Lula, raramente encontramos um cidadão como ele para dirigir o país - disse Alencar à Rádio Bandeirantes. Perguntado se estava defendendo um terceiro mandato, Alencar respondeu:

- Nos EUA, são quatro anos mais quatro. Mas, nos anos 30, Roosevelt teve o terceiro mandato porque os EUA precisavam que ele continuasse.

Múcio nega intenção de novo mandato

Pouco depois, diante de empresários e sindicalistas na reunião do CDES, Lula defendeu a reforma política:

- Não sei se caberia aqui propor a vocês uma provocação, fazer uma discussão sobre reforma política, que acho que é a mais importante de todas elas. E não sei por que as pessoas não querem fazer. A gente percebe a fragilidade dos partidos, as debilidades, e as pessoas não querem fazer. Aqui não tem tema proibido. Queremos apenas, enquanto sociedade civil (no "Conselhão"), fazer a discussão que muitas vezes não conseguimos fazer em outro lugar.

A combinação das duas frases foi suficiente para a oposição suspeitar que está de volta a idéia do terceiro mandato para Lula. O ministro das Relações Institucionais, José Múcio, fez uma negativa veemente:

- O presidente deseja terminar seu mandato. Evidentemente que todas às vezes que ele vai a uma inauguração, fazer uma visita, as pessoas falam isso e isso significa que ele tem dado certo. Mas isso é o entusiasmo do vice-presidente.

Parlamentares aliados entraram em cena para negar. A proposta original surgiu com o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), que quer realizar um plebiscito.

- O presidente é um estadista e não vai quebrar as regras no meio do jogo, como fizeram nossos opositores no governo passado, ao aprovar a reeleição - disse o líder do governo, Henrique Fontana (PT-RS), que não quis criticar o vice.

- Sou contra qualquer modificação casuística de texto constitucional e contra qualquer forma de prorrogação de mandatos - disse o secretário-geral do PT, José Eduardo Cardozo (SP).

A oposição criticou:

- Sempre considerei José Alencar um homem público respeitável. Ele perde pontos com essa declaração. Não tem o direito de defender algo que comprometeria a democracia brasileira. Quem defende terceiro mandato, defende golpe - disse o líder do DEM, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA).

- O que aconteceu com Alencar? É uma proposta golpista, não tem fundamento programático - acrescentou o líder do PSDB, José Anibal (SP).

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