Título: Saltinho, um mercado de trabalho dividido
Autor: Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 06/04/2008, Economia, p. 34

Empregos formais e informais caminham lado a lado. Rotatividade no município é elevada

Às margens de uma movimentada rodovia de São Paulo, já se avista Saltinho - um pequeno município próximo de Piracicaba, de quase sete mil habitantes e poucas ruas. Na bucólica fotografia do município, um mercado de trabalho com números desprezíveis de desemprego. Uma equação positiva que só fecha em zero devido aos empregos gerados pela indústria sucroalcooleira e por confecções locais.

- Formalidade e informalidade caminham lado a lado pelas ruas de Saltinho. E é justamente isso que garante esse quadro de desemprego quase zero - admite o prefeito Wanderlei Moacyr Torrezan (PPS), em seu segundo mandato, ressaltando que a cidade é um exemplo de prosperidade. - Saltinho cresce 9% ao ano.

A atividade econômica do município se baseia na agroindústria sucroalcooleira: 90% das pequenas e médias fábricas são de metalurgia voltada para o ciclo de produção de cana-de-açúcar. Respondem por cerca de 800 postos de trabalho, garantindo rendimentos médios de R$1.041,16.

- A oferta de empregos faz com que a rotatividade de funcionários seja grande. Não é raro um profissional sair por uma proposta melhor. E, se deixarmos, ele até volta para a mesma função, com um salário maior. Até por isso, criamos um programa de premiação, uma espécia de bônus, para quem não faltar ao trabalho durante um período - diz Dejair Chiarotti, sócio da Conger, maior empresa de metalurgia da cidade, que faturou, ano passado, R$44,6 milhões.

Informalidade é reflexo da burocracia, alerta Sebrae

Serviço não falta para Rodinei Grigolon, de 28 anos. Trabalhando como praticante de calderaria há um ano, Gricolon se aprimora com o curso técnico na sua área. Mas, ressalta, não chegou à fábrica sem conhecimento algum.

- Meu pai foi caldeireiro. Essa área está em alta, por causa da cana-de-açúcar. Assim, hoje há muita oferta de trabalho - diz Gricolon, que recebe R$900, por mês, e considera "muito boa a sua vida em Saltinho". - Tenho tudo: casa própria e até máquina digital.

Em meio à burocracia que dificulta a abertura de empresas formais, surgiram as confecções, escondidas em garagens e cômodos das simpáticas casas do município. Nas contas do prefeito, são mais de 800 pessoas, especialmente mulheres, que trabalham por conta própria para fábricas de fora da cidade - praticamente o mesmo número de empregados nas indústrias formais.

Informalidade alta, diz o diretor Luiz Carlos Barboza, do Sebrae Nacional, é um problema de dimensão nacional. É um reflexo, diz ele, da burocracia e da alta carga tributária.

- O país ainda tem muito o que melhorar nesse quesito. Numa cidade menor, isso fica mais próximo, mais evidente. Mas é um problema geral.

Os trabalhadores também enfrentam outros problemas. E a tão sonhada qualidade de vida no interior cai. Há quem fique sentado à frente de uma máquina de costura por mais de 12 horas num dia. Tudo para cumprir os prazos das fábricas de outras cidades que aproveitam o baixo custo da mão-de-obra local.

- Estamos tentando organizar essas mulheres em cooperativas, mas elas não querem. Então, as fábricas trazem o material para essas moças. Cada peça sai a custo baixíssimo, infelizmente - lamenta o prefeito de Saltinho, acrescentando que muitos moradores do município vão trabalhar nas cidades vizinhas, especialmente em Piracicaba, a 15 minutos de lá.

IDH de Saltinho está acima do índice do Brasil

Apesar de contrariado com a informalidade do município, o prefeito comemora o fato de o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Saltinho, calculado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), estar entre os mais altos do país. Saiu de 0,781, em 1991, para 0,851 em 2000 (último dado municipal) - estando acima dos IDHs do Brasil de 2005 (0,800), de países como México, Romênia e Arábia Saudita, e empatando com o da Letônia (0,855). Indicadores de educação também avançaram.

- Em Saltinho, todas as crianças estão na escola. É um motivo de orgulho para todos - afirma o prefeito.

Depois do horário escolar, crianças com roupas de judô e capoeira circulam pelas ruas pavimentadas da cidade. Passam pela praça, pela avenida principal, pela igreja. O município também oferece atividades esportivas e aula de música para a garotada. Além de dança para a Terceira Idade. E o custo? Como o número do desemprego: zero.