Título: Policiais fora da estrada
Autor: Prates, Maria Clara
Fonte: Correio Braziliense, 04/05/2009, Política, p. 4

Relatório final da CPI dos Grampos afirma que PRF extrapola suas funções e recomenda que o órgão deixe de fazer escutas telefônicas.

Patrulheiros apoiaram operação da Receita federal contra pirataria na Feira dos Importados A conclusão do relatório da CPI dos Grampos, apresentada na semana passada, revela uma realidade que vem preocupando especialistas em segurança pública: o avanço da Polícia Rodoviária Federal em atividades restritas às polícias judiciárias, contrariando a Constituição. A CPI fez recomendação expressa ao Ministério da Justiça, a quem está subordinada a PRF, para que a instituição se abstenha de fazer escutas telefônicas.

De acordo com o documento, a PRF vem fazendo escutas telefônicas desde 2000, algumas de iniciativa própria, conforme testemunhas, além de apoiar iniciativas como o combate à dengue em Recife e ao trabalho escravo no Maranhão, em fazendas a cerca de 400 quilômetros da rodovia, investigar tráfico de drogas e ainda destruir plantações de maconha no sertão nordestino.

Nada de mais do ponto de vista da necessidade de juntar forças para combater a criminalidade. Entretanto, a realidade das estradas federais do país mostra que a PRF já tem um desafio grande demais para exercer sua função ¿ polícia administrativa, responsável pelo patrulhamento ostensivo de rodovias. São 62 mil quilômetros de malha viária para serem fiscalizados por apenas 9,5 mil patrulheiros federais. Isso equivale dizer que são 6,5 quilômetros por cada inspetor, sem considerar aqueles envolvidos na máquina burocrática da instituição. O número de mortos nas rodovias federais no ano passado chegou a 6.590 pessoas, além de 77.486 feridos em 134.452 acidentes. Este ano, somente nos três primeiros meses, já foram 34 mil acidentes com 1.620 mortos e 20.019 feridos.

Projeto Hoje, apesar da matança nas rodovias, a PRF quer ir além de suas funções. Tenta emplacar um projeto, que já está em discussão, para se tornar responsável também pela fiscalização ferroviária e de portos. O projeto teria sido elaborado pelo inspetor-geral da PRF, Evandro Bruno, e apresentado durante encontro em maio de 2007 no Rio de Janeiro. O objetivo era a criação da Polícia Ostensiva Federal, que abocanharia a guarda portuária e ferroviária. Dentro dessa filosofia, a PRF já garantiu seu acesso permanente também na Comissão Nacional de Segurança dos Portos, Terminais e Vias Navegáveis (Comportos), uma comissão interministerial, coordenada pelo Ministério da Justiça, responsável pela certificação de segurança em terra. De acordo com a assessoria de Comunicação Social da Polícia Rodoviária Federal, o projeto para assumir novas funções ainda não evoluiu.

Mas se as propostas estão paradas de um lado, por outro, integrantes da PRF comemoram o reconhecimento de seus quadros fora da estrada com a nomeação do patrulheiro rodoviário Régis André Silveira Limana para o cargo de Coordenação-Geral de Inteligência da Secretaria Nacional de Segurança Pública, subordinada, assim como a PRF, ao Ministério da Justiça. Limeana hoje é quem cuida da integração entre os setores de inteligência das polícias judiciárias.

Segundo o relatório da CPI dos Grampos, o diretor-geral da PRF, Hélio Cardoso Derene, disse, em depoimento, que a corporação montou seu serviço de inteligência em 2000 com o objetivo de ¿desenvolver um trabalho de prevenção, principalmente contra o crime organizado¿.

O avanço da PRF por áreas estranhas à sua competência já vem causando saias-justas no próprio Ministério da Justiça. Por meio do ofício nº 532, datado de 10 de novembro, o presidente da Associação dos Delegados de Polícia Federal, Sandro Torres Avelar, pediu providências ao ministro Tarso Genro para conter as ações da PRF nas áreas de atuação das polícias judiciárias. No documento, Sandro diz que além das questões administrativas, ao avançar sobre responsabilidade fora de sua competência constitucional, a PRF comete um ilícito penal: usurpação de função pública, crime previsto no Código Penal.

O assessor de Comunicação Social da PRF, Alexandre Castilho, disse que o maior atestado de que a corporação age estritamente dentro da lei é a ausência de indiciamento de seus integrantes no relatório final. ¿A nossa situação foi apurada detalhadamente pela CPI, que não encontrou qualquer irregularidade. Prova disso é que não houve indiciamento¿, diz Castilho.

O assessor garantiu ainda que todas as ações da PRF só ocorrem quando existe solicitação de apoio pelo Ministério Público Federal ou Estadual, ou do Judiciário, acrescentando que essa solicitação pode ser para um simples pedido de apoio até uma verdadeira investigação, passando pela realização de escutas telefônicas. ¿O Ministério Público pode fazer grampos e pode pedir apoio se entender necessário. Portanto, do ponto de vista legal, é legítimo¿, diz Castilho.

-------------------------------------------------------------------------------- Ação diversificada

7/5/2005 A Polícia Rodoviária Federal investiga e prende traficantes depois de uma investigação, com ajuda de informantes. Sete plantações de maconha foram localizadas no Pará.

20/12/2006 A PRF cumpre mandado de busca e apreensão no haras da família dos bispos da Igreja Apostólica Renascer em Cristo, Estevam Ernandes Filho e Sônia Hadad Moraes Ernandes, em Atibaia, a 60 quilômetros de São Paulo. O casal é acusado de sonegação fiscal.

11/3/2009 Ao lado da Receita Federal, a PRF participa da Operação Mercancia III, que teve como palco a Feira de Importados, em Brasília. A PRF contou com 60 policiais, viaturas caracterizadas e um helicóptero. Por sua vez, a Receita destacou 40 auditores fiscais e analistas tributários.

6/4/2009 Policiais rodoviários, juntamente com a Delegacia Regional do Trabalho do Maranhão, resgatam 70 trabalhadores em regime de escravidão em três fazendas nos municípios de Codó e Bacabal.

14/4/2009 Em operação conjunta com a Força Nacional, Ibama e Polícia Militar do Pará, a PRF destroi seis plantações de maconha no município de Nova Esperança do Piriá (PA). A Operação Caapora, apreendeu 509 quilos de maconha, cinco quilos de sementes e ainda 2,5 mil pés da planta foram incinerados.

16/4/2009 A PRF participa da luta contra a dengue, em Recife. Em parceria com uma equipe da Secretaria de Saúde, sobrevoa a capital pernambucana para tentar localizar possíveis focos do mosquito transmissor da dengue.