Título: Fracasso ronda missão por Ingrid
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Fonte: O Globo, 05/04/2008, O Mundo, p. 41

Irmã de refém diz que só por milagre iniciativa francesa terá êxito. Milhares protestam contra Farc.

BOGOTÁ

O pessimismo cercava ontem os esforços para libertar a ex-senadora Ingrid Betancourt, enquanto milhares de colombianos saíam novamente às ruas do país pedindo a libertação dos reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Astrid Betancourt, irmã da refém, disse que eram "ínfimas as opções" das quais dispõe a missão humanitária francesa, que aguarda em Bogotá um sinal verde da guerrilha. Já o presidente da França, Nicolas Sarkozy, reiterou a disposição de ir para a região de fronteira - em companhia do presidente da Venezuela, Hugo Chávez - na tentativa de obter a libertação de Ingrid.

Mas o clima era de pessimismo, após o comunicado na véspera de Rodrigo Granda, o chamado "chanceler das Farc", que descartou a libertação de reféns sem a troca por presos.

- Há uma resposta por parte das Farc que é clara. Não sei se há possibilidades de salvar a missão, mas creio que tem ínfimas opções - disse Astrid, que agradeceu o esforço da França.

O avião com equipamento e pessoal médico da França chegou a Bogotá na quinta-feira, na tentativa de obter acesso e dar assistência à refém, que também tem nacionalidade francesa e que, segundo relatos, sofre de hepatite B, leishmaniose e malária. Astrid defendeu a inclusão de Chávez no diálogo.

- O êxito da missão depende de um milagre, porque não foi feita em acordo com as Farc nem pelos canais habituais, que passariam por avisar o presidente Hugo Chávez - disse ela.

Segundo o chanceler francês, Bernard Kouchner, Sarkozy está disposto a viajar à fronteira entre Colômbia e Venezuela, junto com Chávez, se isso contribuir para a libertação de Ingrid, seqüestrada em 2002. Kouchner explicou que a França está disposta a receber em seus territórios no Caribe - Guiana Francesa ou Martinica - rebeldes libertados como parte do acordo para soltar Ingrid e outros 39 reféns em troca de 500 presos.

- Se houver alguma esperança, o senhor Chávez e o senhor Sarkozy irão buscar Ingrid na fronteira - disse Kouchner. - Se não tentarmos, não poderá haver senão o fracasso. E por isso tentaremos. As Farc precisam responder. Estamos esperando.

Uribe quer rever libertação de "chanceler"

Além de jogar um balde de água fria nas expectativas, o comunicado de Granda teve ainda outra conseqüência: Uribe disse ontem que o governo pretende rever sua libertação. Segundo ele, é preciso analisar se o líder guerrilheiro se "reincorporou novamente ao crime". Granda foi solto em 2007, a pedido de Sarkozy, para facilitar as gestões humanitárias. Coincidentemente, a Interpol lançou ontem uma ordem de captura internacional contra ele, a pedido do Paraguai, por envolvimento no seqüestro e assassinato da filha do ex-presidente Raúl Cubas, em 2005.

Chávez se prontificou a acompanhar Sarkozy à fronteira, mas manifestou dúvida sobre o sucesso da missão. Ele disse que o presidente francês lhe pediu para entrar em contato com o guerrilheiro Iván Márquez, mas que isso seria difícil:

- Temos informações de que agentes do governo da Colômbia e dos EUA andam caçando Iván Márquez. Não posso convocá-lo nem enviar um emissário para que atrás sigam bombas. Perdeu-se a confiança - disse Chávez, acrescentando que daqui para a frente optará por "não falar publicamente do tema, e sim agir".

Enquanto isso, milhares de colombianos, convocados por ONGs, foram às ruas pedir a libertação dos reféns. Na Praça de Bolívar, no centro de Bogotá, uma faixa pedia: "Salvemos Ingrid Betancourt." Fotos da política apareciam em máscaras, camisetas, cartazes nas ruas e nas janelas dos prédios. A passeata se repetiu em cidades de França, Alemanha, EUA, Equador e Argentina.

- A idéia é mostrar aos reféns que eles não estão sozinhos - disse Ana Teresa Bernal, porta-voz da Rede de Iniciativas pela Paz e contra a Guerra (Redepaz).

Em Paris, o filho de Ingrid, Lorenzo, pediu à mãe que se alimente, por meio da Radio França Internacional, que é captada pelos reféns:

- Mamita, sei que está atravessando momentos muito difíceis, mas estes são realmente os últimos. Queremos ver outra vez a mulher forte e vigorosa.

No Rio de Janeiro, o ministro da Justiça, Tarso Genro, rebateu o que chamou de tendência de internacionalizar o Plano Colômbia - de combate às drogas e à guerrilha - e disse estar de acordo com o ex-líder cubano Fidel Castro de que não há "uma solução militar para o conflito":

- É preciso deixar claro que as Farc não são um assunto brasileiro. Qualquer tentativa de envolver o Brasil no conflito vai fracassar. Permanentemente nos colocamos à disposição da Colômbia para mediar entre as Farc e o governo, quando seja vontade política desse governo.

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