Título: Bancos já perderam US$240 bilhões na crise
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 08/04/2008, Economia, p. 21

Cresce desconfiança mútua no setor, diz instituto. Para BID, contra crise, América Latina precisa de política social

José Meirelles Passos

MIAMI BEACH. Os bancos comerciais, os bancos de investimentos e as financeiras em geral parecem estar tão apavorados com a crise de crédito nos Estados Unidos quanto empresas e pessoas físicas que dependem de financiamentos. Há uma falta de confiança mútua: um teme que o outro esteja escondendo a verdade, revelou Charles Dallara, diretor-gerente do Institute of Internacional Finance (IIF), entidade que reúne os 375 bancos mais importantes do mundo.

Segundo Dallara, os grandes bancos já acumulam prejuízos de US$240 bilhões, sendo que só na semana passada foram perdidos US$40 milhões. Há uma grande apreensão com a possibilidade de que algumas empresas do setor dêem calotes em outras.

- Há os que vêem o copo meio cheio. Mas o que eu vou dizer tem a ver com a metade vazia. Uma das graves consequências dessa crise é a perda de confiança do próprio setor em si mesmo. E isso só alimenta a volatilidade e nos deixa cada dia mais preocupados - disse Dallara ao GLOBO.

De acordo com o executivo, os banqueiros crêem que a crise ainda não chegou ao fundo do poço.

- O mercado acredita que o prejuízo total vai chegar a US$450 bilhões.

Banqueiro reconhece que setor cometeu excessos

Ele disse que as intervenções que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) vem fazendo no mercado evitou que o desastre tivesse proporções gigantescas.

- Tem gente definindo isso como um risco moral desnecessário, pois o problema foi criado pelos próprios bancos e eles deveriam arcar com as consequências. Mas achamos que o Fed está fazendo o que precisava fazer - justificou Dallara, reconhecendo, porém, que o setor "cometeu excessos" condenáveis:

- O mercado financeiro precisa cair na realidade de que tem alguma responsabilidade nisso. O setor deve aos seus acionistas uma melhoria de suas práticas.

Por esse motivo, a Comissão sobre Melhores Práticas de Mercado do IIF divulgará amanhã, em Washington, um documento com uma série de recomendações para o setor.

- Uma das recomendações dirá respeito à administração de riscos. E outra levará em conta questões específicas sobre riscos de liquidez - adiantou Dallara.

Os governos da América Latina também precisam verificar se, realmente, estão preparados para enfrentar a atual crise de crédito global, alertou ontem o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ao abrir oficialmente a reunião anual da instituição. Moreno insinuou que os bons indicadores talvez não reflitam a situação real da economia de alguns países:

-- Não se pode esquecer que a conjuntura favorável dos últimos anos pode ter dissimulado certas vulnerabilidades estruturais - disse ele.

A situação, segundo Moreno, se complica pelo fato de que "ninguém sabe com certeza que consequências" trará a escassez de crédito.

- Devemos estar conscientes de que os riscos poderiam aumentar nos próximos meses.

Paulson: América Latina ainda enfrenta grande risco

Segundo Moreno, os governos não podem deixar de levar em consideração um fator chave nessa equação:

- Apesar do bom desempenho econômico, os enormes desafios sociais de nossa região nos impõem continuar avançando na consolidação de um crescimento mais inclusivo.

O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Henry Paulson, em seu discurso, disse que a boa notícia era a de que as economias latino-americanas têm provado serem "mais resistentes do que muitos esperavam" a choques internacionais. Mas, logo depois, em entrevista coletiva, fez também uma advertência:

- Hoje, cada país no mundo é afetado pelo que acontece ao seu redor. Na minha opinião, a América Latina ainda enfrenta um grande risco, que é o de fazer com que a sua população compartilhe dos benefícios alcançados por sua economia.

Moreno também insistiu nesse ponto:

- A história recente de nossa região está marcada por crises sociais associadas a distúrbios financeiros. O passado nos ensina que a resposta adequada às turbulências financeiras deve contemplar necessariamente a política social.

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema em: 08/04/2008 04:02