Título: MEC tira poder de fundações
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 14/04/2008, O País, p. 3

Acuado pelo protesto dos estudantes, reitor da UnB segue o vice e pede exoneração

Oministro da Educação, Fernando Haddad, anuncia hoje quatro medidas que têm como objetivo tornar mais rígidas as normas para compras nas fundações universitárias, garantir que apenas docentes e servidores participem ativamente dessas instituições e tirar poder do comando executivo das instituições. O anúncio acontece após o escândalo envolvendo a Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), da Universidade de Brasília (UnB), que gastou R$470 mil na decoração do apartamento do reitor Timothy Mulholland. Ele pediu exoneração ontem do cargo, seguindo o exemplo de seu vice, Edgar Mamiya, que renunciara na véspera.

Com o afastamento de ambos, um reitor pró-tempore será escolhido na terça-feira. Ele ficará na função por 90 dias, podendo haver prorrogação por igual período, até que uma eleição ocorra.

As medidas que serão anunciadas hoje por Haddad são: um terço do conselho deliberativo das fundações será indicado pelo conselho universitário; participação de dois terços de servidores e professores da própria instituição nos processos de pesquisa; aprovação das contas e do estatuto das fundações pelo conselho universitário; e obrigatoriedade de que toda transferência de recursos das fundações seja feita em espécie e incorporada como receita própria, submetida à Lei 8.666.

Neste último caso, isso significa que qualquer compra realizada pelas fundações deverá obedecer à Lei de Licitações. Se essa regra já estivesse valendo, a lixeira de mil reais comprada para o apartamento do reitor deveria passar por concorrência e não poderia ter sido lançada como patrimônio da universidade.

- O objetivo das medidas é evitar que as fundações se tornem de fachada - disse o ministro da Educação.

Prazo de 18h para substituto

Mulholland telefonou ontem à tarde para Haddad para comunicar sua exoneração. O telefonema aconteceu no momento em que o ministro se reunia com representantes de professores, estudantes e funcionários para tratar da crise na UnB. Aceita a exoneração, Haddad deu prazo até as 18h de amanhã para que lhe seja apresentado um nome de consenso para a vaga de reitor pró-tempore. Caso não se chegue a um acordo, o ministro designará alguém. Esse reitor pró-tempore não poderá se candidatar à vaga definitiva.

- Esperamos um nome de consenso, mas não podemos deixar a instituição acéfala - afirmou o ministro da Educação.

Haddad confirmou que Mulholland participou, na tarde de anteontem, da reunião que manteve com o vice-reitor da UnB, Edgard Mamiya, quando este pediu demissão do cargo. Mas o reitor, que estava apenas licenciado por 60 dias, não tomou a mesma atitude.

Avaliando que a situação ficara insustentável e dificultaria o processo de entendimento na UnB - estudantes patrocinam, com adesão de professores e funcionários, uma ocupação do prédio da reitoria que completa hoje 12 dias -, Mulholland telefonou na tarde de ontem para o ministro solicitando exoneração. O pedido oficial de demissão será entregue hoje.

- Nosso desejo é restaurar a normalidade - declarou o ministro.

Com a demissão de reitor e vice, todos os decanos (diretores de área), por ocuparem cargos de confiança, perdem o posto. Isso significa que o terceiro vértice das investigações de mau uso de verbas de pesquisa da UnB, o decano de Administração, Érico Weidle, também está fora do comando da universidade. A saída da cúpula era uma das exigências de estudantes, professores e servidores.

Mulholland e Weidle foram denunciados à Justiça por desvio de uso de R$470 mil da Finatec da UnB, que foram empregados na decoração do apartamento funcional ocupado pelo reitor.

Mamiya não foi denunciado, mas é investigado por procuradores da República e promotores do Distrito Federal no caso de uma viagem, que teria sido custeada com recursos para programa de saúde indígena, e por 32 almoços e jantares pagos com verbas de convênios firmados por fundações de apoio à pesquisa ligadas à UnB.

Haddad também fez um apelo aos estudantes para que desocupem o prédio da reitoria, a fim de que os serviços possam ser retomados:

- Fizemos gestão para sensibilizar os estudantes sobre a descontinuidade dos serviços essenciais.

Os alunos que participaram da reunião de ontem informaram que hoje, ao meio-dia, haverá uma assembléia que deliberará sobre o assunto. Eles não quiseram adiantar o que irão defender, mas comemoraram no prédio ocupado a saída definitiva de Mulholland, e disseram que não aceitam nenhum nome ligado à antiga administração. Os alunos já haviam estourado champanhe no sábado à noite para celebrar a saída do vice-reitor.

- Foi uma grande vitória a saída do reitor e do vice. Passamos agora a uma nova fase - disse Fábio Félix, um dos representantes dos estudantes.

Rachel Nunes da Cunha, presidente da Associação dos Docentes da UnB (ADUnB), também afirmou que os professores não irão aceitar na reitoria alguém com ligações com a antiga administração.

- Não queremos ninguém vinculado a esta gestão. Nem às últimas três que passaram pela UnB.