Título: O retorno do Cavaliere
Autor: Araújo, Vera Gonçalves de
Fonte: O Globo, 15/04/2008, O Mundo, p. 25

Berlusconi vence eleição parlamentar e será primeiro-ministro da Itália pela terceira vez.

Pela terceira vez em 14 anos, Silvio Berlusconi, de 71 anos, governará a Itália. O polêmico bilionário recebeu ontem um telefonema do líder do principal partido adversário, Walter Veltroni, que reconheceu a derrota antes mesmo do fim da apuração.

Com a apuração de 59 mil das 61 mil seções eleitorais terminada, a aliança de Berlusconi tinha 46,7% dos votos, contra 37,7% da aliança de centro-esquerda de Veltroni na Câmara dos Deputados. No Senado, o resultado era semelhante: 47,3% para Berlusconi e 38,1% para Veltroni. Projeções indicavam que o Cavaliere poderia ter uma maioria de 99 cadeiras na Câmara, que tem 640 ao todo, e de até 30 na câmara alta, que tem 315 senadores eleitos e sete vitalícios.

Berlusconi esperou os resultados eleitorais na sua luxuosa mansão em Arcore, nos arredores de Milão. Em sua primeira declaração após a vitória, num telefonema para a rede de TV pública RAI, disse estar "emocionado" com o resultado, e que formará o novo governo rapidamente.

- Já tenho todos os ministros na minha cabeça, e os aliados concordam comigo - disse, acrescentando que seu Gabinete terá pelo menos quatro mulheres, e que pretende elaborar reformas constitucionais e eleitorais procurando o apoio da oposição.

A coalizão liderada por Berlusconi teve uma vitória esmagadora no norte do país, graças ao sucesso surpreendente da separatista Liga Norte, que em algumas zonas importantes, como no Vêneto e na Lombardia, recebeu 25% dos votos.

Comunistas fora pela 1ª vez

Umberto Bossi, líder da Liga Norte - que já ameaçou pegar em armas para tornar o norte da Itália independente e defende o afundamento de balsas com imigrantes africanos pela Marinha - já indica que cobrará de Berlusconi o sucesso de seu partido: a Liga teve mais que o dobro dos votos da eleição de 2006, com de 9,1%.

- A primeira coisa que faremos é um federalismo fiscal, para não precisarmos mais ir até Roma com o pires na mão pedir moedas - disse Bossi. - Agora é preciso agradecer aos eleitores, porque desta vez o povo nos passou uma mensagem forte: é preciso fazer reformas, porque nossa paciência está acabando.

A eleição significará uma revolução no panorama parlamentar italiano, que tem 26 partidos com representação no Parlamento. Com a lei eleitoral que só permite que partidos ou coligações com 4% dos votos para a Câmara e 8% para o Senado tenham candidatos eleitos, mais de 20 partidos podem deixar de ter representantes. Na Câmara, tudo indica que, além dos três partidos da aliança de Berlusconi e dos dois da coligação de Veltroni, apenas o democrata-cristão União de Centro teria deputados eleitos. No Senado, a mudança seria ainda mais drástica, com somente cinco ou até quatro partidos.

O partido de Berlusconi, Povo da Liberdade (com 37,2% dos votos), e o de Veltroni, Partido Democrático (33,3%), se tornaram as maiores forças políticas da Itália.

Pela primeira vez na história democrática italiana, após o fim da Segunda Guerra, os comunistas ficarão fora do Parlamento. Os verdes e o Partido Socialista também ficaram sem representação parlamentar.

Fausto Bertinotti, atual presidente da Câmara dos Deputados e líder da Refundação Comunista - principal partido da aliança Esquerda Arco-Íris - reconheceu o fracasso:

- É uma derrota clara, de proporções imprevistas: agora deve começar uma discussão entre todos os componentes que constituem a esquerda italiana - disse ele.

Com uma maioria clara e sólida nas duas casas do Parlamento, Berlusconi vai governar com relativa tranqüilidade, em contraste com os dois anos do governo de centro-esquerda de Romano Prodi, que tinha uma maioria de apenas dois senadores. O bilionário preferiu, desta vez, não exagerar com as promessas eleitorais. Segundo os analistas, o próximo Gabinete de Berlusconi terá prioridades muito diferentes do seu último governo, entre 2001 a 2006 (seu primeiro mandato durou apenas sete meses em 1994). A crise econômica levou o país ao crescimento zero nos primeiros meses de 2008, e há perspectivas de grandes dificuldades no setor da energia.

Berlusconi demonstra estar consciente das complicações que vai enfrentar no próximo futuro:

- Anos muito difíceis nos aguardam, em que os pontos fundamentais serão a crise do lixo em Nápoles, a construção de casas para os mais pobres, a ajuda às famílias, a crise da Alitalia, a infra-estrutura e as medidas fiscais.

Berlusconi tem um império de comunicação, que inclui as maiores redes privadas de TV e jornais. Ex-homem mais rico da Itália - hoje ocupa a terceira colocação - é o dono da Fininvest e de um dos mais populares times de futebol do mundo, o Milan. É conhecido também pelos problemas com a Justiça por acusações contra algumas de suas empresas que teriam recebido benefícios indevidos do governo quando ele era premier.

www.oglobo.com.br/mundo