Título: papa admite que igreja administrou mal escândalo de pedofolia
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 17/04/2008, Papa, p. 32
Bento XVI pede a bispos americanos para promover a reconciliação com os que foram atingidas pelos abusos sexuais. Na Casa Branca, Pontífice não menciona guerra no Iraque
José Meirelles Passos
WASHINGTON. Em seu primeiro dia de cerimônias oficiais nos Estados Unidos, o Papa Bento XVI reconheceu ontem que a Igreja administrou mal o escândalo de abusos sexuais de mais de 12 mil crianças por sacerdotes católicos no país. As palavras do Pontífice foram ditas num discurso para os bispos americanos, em Washington, minutos depois de o presidente da Conferência Episcopal dos EUA, o cardeal Francis George, ter usado a expressão para condenar a resposta da Igreja e as conseqüências disso.
- É uma responsabilidade dada a nós por Deus, enquanto pastores, de fechar as feridas causadas por cada quebra de confiança, de encorajar a cura, de promover a reconciliação e de estender a mão de forma carinhosa para aqueles que foram tão seriamente prejudicados - disse Bento XVI.
O Papa disse concordar com as declarações do cardeal George, dizendo que, apesar de a resposta à crise "não ser fácil", ela foi "algumas vezes muito mal administrada". O líder da Igreja Católica assegurou que apenas recentemente "a escala e a gravidade do problema" foram mais bem compreendidas. A frase foi interpretada como uma crítica aos prelados americanos responsáveis pelas primeiras averiguações da Igreja.
Bento XVI afirma que crise está dentro de contexto maior
Condenações na Justiça americana mostram que, por anos, padres suspeitos de abuso de crianças em vez de punidos pela Igreja foram só transferidos de paróquia. A Igreja foi acusada de prejudicar investigações da polícia.
Inserindo o problema num contexto mais amplo, o Papa exortou os membros da Igreja a "reconhecer e enfrentar o problema dos abusos sexuais no contexto eclesiástico" para oferecer uma orientação aos demais, "já que essa praga se encontra também em cada setor da sociedade".
- "(As crianças) Devem ser poupadas das manifestações degradantes e da manipulação crua da sexualidade tão prevalescente (na sociedade).
Horas antes do discurso para os bispos, os americanos que andam descontentes com a guerra no Iraque ficaram decepcionados pelo fato de o Papa não ter manifestado, em público, o seu desagrado em relação ao conflito, durante o seu curto discurso ontem de manhã na Casa Branca. Mas ao mesmo tempo, os que aguardavam ansiosos por uma firme reafirmação do Pontífice contra o aborto, o casamento gay e as pesquisas com células-tronco também ficaram desapontados.
Tanto ele quanto o presidente George W. Bush, que o recebeu diante de 13.500 convidados aglomerados no jardim da Casa Branca sob o sol, evitaram tocar em assuntos polêmicos. A cerimônia, iniciada com um toque de trombetas, uma salva de 21 tiros de canhão, e o canto suave de uma soprano, foi nutrida mais por simbolismo do que por substância.
Papa ressalta "sociedade pluralista" americana
Bush agradeceu ao Papa "pela orientação espiritual e moral que oferece a toda a família humana". O Pontífice respondeu à altura: disse que vinha "como um amigo, um pregador do Evangelho, com grande respeito por essa vasta e pluralista sociedade". Ao final, enquanto o visitante respondia com as mãos os acenos, a platéia - incentivada por um mestre de cerimônias anônimo - irrompeu a cantar "Parabéns a você", enquanto Bush e a primeira-dama Laura lhe apresentavam um bolo comemorativo de seus 81 anos, completados ontem.
O Papa fez apenas uma sutil e indireta menção à guerra no Iraque:
- Estou confiante de que a preocupação (dos EUA) com a grande família humana continuará a encontrar expressão no apoio a pacientes esforços de diplomacia internacional para resolver conflitos e promover o progresso.
Bush fez o mesmo, aludindo vagamente - e também de forma indireta - ao aborto e às pesquisas com células-tronco:
- Num mundo onde alguns tratam a vida como algo a ser degradado e descartado, nós precisamos da sua mensagem de que toda vida humana é sagrada - disse ele.
Depois, ambos conversaram a sós durante 45 minutos, dos quais resultou um curto comunicado conjunto listando os temas discutidos: imigração, o conflito Israel-Palestina, o terrorismo e a luta contra a pobreza.
Hoje o Papa rezará missa num estádio de beisebol para 47 mil pessoas. Bush, que pertence a uma igreja metodista no Texas e freqüenta uma episcopal em Washington, não irá: argumentou que sua presença complicaria ainda mais o trabalho dos encarregados da segurança de ambos.
www.oglobo.com.br/mundo Jornal: O GLOBO Autor: José Meirelles Passos Editoria: O Mundo Tamanho: 763 palavras Edição: 1 Página: 32 33 Coluna: Seção: Caderno: Primeiro Caderno
© 2001 Todos os