Título: De amarelo, MST invade ferrovia
Autor: Brasiliense, Ronaldo
Fonte: O Globo, 18/04/2008, O País, p. 3

Desrespeitando proibição da Justiça, movimento fecha estrada de ferro da Vale no Pará.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) cumpriu a ameaça e, com o Movimento dos Trabalhadores e Garimpeiros da Mineração (MTM), fechou por cerca de cinco horas a Estrada de Ferro de Carajás, em Parauapebas, no Pará, sem intervenção de força policial. A ocupação - principal ato realizado ontem no país, em memória dos 19 sem-terra assassinados há 12 anos em Eldorado dos Carajás - começou perto das 6h: militantes com camisetas amarelas puseram pedaços de pau na ferrovia, no trecho em frente ao acampamento de sem-terra Palmares II. A ação conjunta com o MTM foi uma forma de o MST tentar burlar decisão da 41ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio, que proibiu o movimento e seu coordenador nacional, João Pedro Stédile, de "incitar e promover a prática de atos violentos" contra a Vale ou interromper as atividades da mineradora no país, sob pena de multa de R$5 mil.

O maquinista da locomotiva 387 da mineradora, Raimundo Nepomuceno, freou ao ver os obstáculos, mas parte da madeira foi deslocada com o choque e feriu manifestantes; a maioria sofreu escoriações, e um deles teve um braço quebrado. O maquinista contou ter sido ameaçado com foice e facão. Em nota, o MST responsabiliza a Vale por ferimentos em 22 militantes do MTM. A Vale considerou as acusações absurdas.

Foram mais de cinco horas de comemorações no acampamento. Manifestantes soltavam rojões e enfeitavam a locomotiva com faixas contra a Vale, bandeiras vermelhas do MTM, do Brasil, do Pará e uma com a imagem de Che Guevara.

Apenas por volta de meio-dia chegou uma tropa da PM paraense com 200 soldados, cães e apoio da cavalaria. O tenente-coronel José Monteiro Júnior, comandante do Batalhão da PM em Parauapebas, convocou quatro líderes do MTM; ninguém se apresentou como líder do MST.

Governadora diz que reforçou policiamento

Não houve resistência. Os cerca de 800 manifestantes permaneceram no acampamento, cercados pela tropa de choque, enquanto policiais e agentes da Polícia Federal recolhiam cartazes, faixas e bandeiras afixados na locomotiva da Vale e cortaram os troncos com uma motosserra.

Neuton Paulino, que se apresentou como líder do MTM, e Altamiro Borba Soares, assessor do prefeito de Parauapebas, Darci Lermen (PT), aliado do MST, foram presos por desobediência à decisão da Justiça que proibiu ações de vandalismo contra instalações da Vale e co-autoria na obstrução da ferrovia. Em Belém, o MST invadiu sede da Vale. E na Curva do S, na PA-150, palco do massacre, em 17 de abril de 1996, houve missa e ato público com cerca de 200 sem-terra.

A Vale responsabilizou a governadora Ana Júlia Carepa (PT) pelo bloqueio da ferrovia. Em nota, a mineradora disse que "não vai se calar diante das ameaças do MST ou da falta de responsabilidade dos governantes, em especial no Estado do Pará, que se omitem diante de um crime há muito anunciado e que, por incompetência ou conivência, estão assistindo a essa maré de crimes que nos últimos dias vem aterrorizando o Brasil".

Ana Júlia assinou ontem decretos que indenizam vítimas de violência no Pará, incluindo 20 famílias do MST, pelo massacre de Eldorado dos Carajás. O governo pagou um total de R$1,497 milhão às famílias. Quanto às acusações da Vale, o governo do Pará informou em nota que enviou a Parauapebas "todas as autoridades estaduais da área de segurança pública". "Estas autoridades estão desde o dia 8 de abril na área do possível conflito e, para garantir a livre manifestação de opinião e o direito ao trabalho e à produção, o governo do Pará também deslocou contingentes policiais para coibir atos de vandalismo e manter a ordem social na região".

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