Título: Dólar em queda livre
Autor: Duarte, Patrícia; Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 18/04/2008, Economia, p. 25

A VOLTA DO APERTO

Juros atraem mais estrangeiros, e moeda, que já caiu 18% em 12 meses, pode chegar a R$1,60.

No dia seguinte à retomada do processo de alta dos juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), o dólar caiu mais: 0,42%, para R$1,657, ainda no menor nível desde maio de 1999. E as quedas tendem a continuar, apesar das atuações do BC comprando a moeda americana, como ontem. O aumento surpresa de 0,5 ponto percentual da taxa básica de juros (Selic) - para 11,75% ao ano - também elevou a diferença em relação aos juros no resto do mundo, especialmente nos Estados Unidos, de 2,25% anuais. Isso deve fazer o dólar encostar em R$1,60, avaliam especialistas. Em 12 meses, a moeda acumula queda de 18,61%. Isso porque, com o maior juro real do planeta, mais investidores estrangeiros devem aplicar recursos no Brasil.

A diretora de câmbio da corretora AGK, Miriam Tavares, por exemplo, já refez suas contas para o fluxo cambial deste mês. Ela previa entrada líquida de US$8 bilhões, agora espera US$10 bilhões. Segundo o BC, o saldo do fluxo cambial - entrada e saída de moeda estrangeira do país - em abril, até o dia 11, estava positivo em US$5,435 bilhões, US$1 bilhão a mais do que em igual período de 2007. Pela conta financeira, por onde entram as aplicações em ações, títulos públicos e investimentos diretos, o superávit era de US$1,714 bilhão, já acima do saldo de março inteiro, de US$1,388 bilhão.

O aumento da enxurrada de recursos externos, porém, será concentrado nos próximos meses, pois o BC indicou, na nota oficial divulgada após a reunião do Copom na última quarta-feira, que concentrará as altas de juros no curto prazo. O economista-chefe do WestLB no Brasil, Roberto Padovani, manteve a projeção de que a Selic fechará o ano a 12,75%, mas mudou a trajetória. Em vez de várias elevações de 0,25, prevê mais duas puxadas de 0,5 ponto.

Para Padovani, porém, além dos juros, a alta dos preços internacionais das commodities são a principal causa da valorização do câmbio. Em alguns casos, os preços já dobraram em apenas um ano. Como o Brasil é um grande exportador, há uma entrada maior de dólares. Com esse cenário, o economista do WestLB acredita que o dólar deve se aproximar de R$1,60 já no fim deste semestre.

O gerente de Renda Fixa do banco Prosper, Carlos Cintra, ressalta que a desvalorização internacional que o dólar vem enfrentando também influencia o comportamento do real neste momento.

Apesar do cenário mais positivo para o setor agrícola, o câmbio valorizado tira o sono da maior parte dos exportadores. Com o real forte, eles perdem competitividade porque seus preços tendem a ficar mais elevados. O Ministério da Fazenda e o Palácio do Planalto acreditam que esse é o pior efeito colateral da alta de juros.

Especialistas em comércio exterior alertam que, ao derrubar o dólar, a alta dos juros deve reforçar uma tendência iniciada em 2006: a perda de fôlego das exportações industriais. Segundo dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), os preços dos produtos básicos exportados pelo Brasil subiram 33,14% nos últimos 12 meses, até março. Os preços dos manufaturados tiveram alta significativamente menor: 15,90%. Por isso, as exportações industriais são as mais afetadas pelo câmbio.

BM&F tem recorde em contratos de juros

A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) projeta que, este ano, o saldo comercial brasileiro será de apenas US$22 bilhões - ou seja, quase metade dos US$40 bilhões obtidos em 2007. Para 2009, há chances até de o país voltar a ter déficit comercial.

- Se houver um estouro na bolha das commodities, basta as importações crescerem um pouco para voltarmos a ter déficit em 2009 - argumenta José Augusto de Castro, vice-presidente da AEB.

Além de derrubar o dólar, a alta da Selic fez a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) subir ontem 0,62%, para 64.552 pontos, o terceiro dia consecutivo de ganho.

- Seria melhor se não houvesse pressão sobre inflação e não precisasse aumentar os juros. Mas o mercado aplaude quando o BC tem independência para tomar esta decisão - disse o gestor da Paraty Investimentos, Marco Franklin.

A Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) registrou um volume recorde de negociação de 4,22 milhões de contratos, equivalentes a um valor de referência de US$195,07 bilhões, o maior de sua história.

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