Título: A segurança das instituições
Autor: Barbosa, Rubens
Fonte: O Globo, 22/04/2008, Opinião, p. 7

Dois acontecimentos recentes chamam a atenção para o grau de (des)preparo das instituições brasileiras para fazer frente aos desafios da era digital.

Refiro-me às informações sobre as circunstâncias que cercaram o roubo de informações sobre a descoberta de importantes reservas de petróleo pela Petrobras, classificadas pelo presidente Lula de "segredos de Estado" e à menção feita pela ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, de que os computadores do Palácio do Planalto poderiam ter sido violados por pessoas de fora da Presidência.

Se verdadeiras, a simplicidade como ocorreram os fatos e a maneira como foram tratados pelas autoridades podem indicar que as instituições brasileiras, sobretudo o Executivo, não estão adequadamente preparadas para evitar que estranhos quebrem as defesas codificadas para penetrar no núcleo eletrônico do governo em duas áreas sensíveis como a Presidência da República e a maior e talvez a mais estratégica empresa estatal brasileira .

No caso da Petrobras, a motivação teria sido a busca de segredos comerciais. No caso do Planalto, ficaria evidenciada uma ação politicamente motivada e ficaria evidente tratar-se de uma ação ofensiva com o objetivo de subtrair informações sigilosas.

As investigações que a Polícia Federal está fazendo sobre o vazamento do dossiê preparado sobre a utilização dos cartões corporativos no governo anterior poderão confirmar ou não a hipótese de invasão dos computadores palacianos. Caso pudesse ficar comprovado que houve efetivamente um ataque aos computadores da Casa Civil, a situação adquiriria um caráter de extrema gravidade por demonstrar a vulnerabilidade do sistema contra essas agressões eletrônicas.

O Brasil adquiriu uma significativa dimensão econômica e política e tem interesses concretos a defender. É preocupante a constatação de que as mais altas autoridades do país venham a público e confessem candidamente a vulnerabilidade de nosso sistema de informação virtual.

Em outros países, há muito tempo, foram tomadas precauções para evitar que intrusos de qualquer natureza possam ter acesso a informações secretas ou sigilosas que afetem a segurança nacional ou interesses concretos do governo.

Ainda que os exemplos recentes da Petrobras e do Palácio do Planalto sejam problemas associados à guerra da informação, não parece haver uma ameaça iminente à segurança do país. Se verdadeiros, esses incidentes refletem muito mais a incompetência e a complacência dos responsáveis pelo sistema de segurança dos equipamentos do que ao "gênio" dos invasores. Qualquer tentativa de penetrar em arquivos eletrônicos deixa impressões digitais eletrônicas facilmente identificáveis que ajudam a proteger a confidencialidade, mas também a identificar os autores.

No início da década, em 2001, o governo (FHC) tomou a iniciativa de se preparar para a era digital e seus desafios e o que foi feito colocou o Brasil como um dos países que buscava, de forma eficiente, fortalecer seus instrumentos de guerra virtual. Desde então, é de presumir-se que o governo tenha adotado medidas para atualizar o sistema de proteção eletrônica.

A eventual fragilidade da defesa de informações sigilosas de interesse do governo põe em questão também o risco de que informações dos cidadãos armazenadas pelo governo venham a ser divulgadas ou manipuladas com fins criminosos por invasores da privacidade individual.

A revista "The Economist", em recente reportagem especial, analisou a implantação generalizada do governo eletrônico. Ao colocar seus serviços on-line, teoricamente, os governos poderiam ser mais eficientes na prestação de serviços à população. Na realidade, os progressos não foram tantos e está longe de desaparecer o risco de que informações pessoais e de empresas em bancos de dados para a identificação pessoal, planos de saúde, Imposto de Renda e licitações públicas venham a ser capturadas por grupos criminosos.

Como conclui "The Economist", organizações mal administradas no tocante à operação de seus computadores também o são de modo geral.

Esperemos que as conclusões das investigações conduzidas pela Polícia Federal, que vão apontar a forma como se deu o vazamento, não revelem um problema ainda mais grave de falta de segurança dos sistemas de defesa do governo para defender não só dados sigilosos dos cidadãos, mas também "segredos de Estado" que podem afetar a segurança nacional.

RUBENS BARBOSA é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).