Título: Ciro admite disputar Presidência, mas agradece não ter sido eleito em 2002
Autor: Barbosa, Adauri Antunes
Fonte: O Globo, 23/04/2008, O País, p. 8

"Serei candidato se entender que é uma candidatura que servirá ao país"

SÃO PAULO. O deputado Ciro Gomes (PSB-CE) admitiu ontem que poderá disputar novamente a Presidência da República em 2010, e contou que agradece por não ter sido eleito em 2002. Disse que, naquela época, não estava preparado para o cargo, mas que aprendeu com os erros.

- Agradeço a Deus não ter sido eleito naquela época. Não estava maduro. Imagina ser eleito e ter como oposição PT e PSDB - disse Ciro, durante sabatina promovida ontem pela "Folha de S.Paulo".

Em conversa com o presidente Lula sobre o fato de ter perdido a eleição, Ciro contou que ele disse que compreendia seu sentimento, porque também agradecia por não ter sido eleito em 1989, quando foi derrotado por Fernando Collor de Mello.

Um dos nomes cogitados na base do governo para a sucessão de Lula em 2010, Ciro disse que aprendeu com seus erros mas que não mudou o comportamento para "paz e amor", como sugeriu um dos entrevistadores.

- Não mudei de comportamento. Eu falei à vontade, falei o que penso. O que eu sou é a mesma pessoa, mas agora com 50 anos e menos cabelo. Se você fica mais velho, comete erros e aprende com eles. Apenas nenhum deles foi de má-fé. Eu não quero jamais ser uma pessoa que não tenha a capacidade de se indignar. Às vezes eu exagerei, mas nunca foi de má-fé.

Ciro reconheceu que deveria ter evitado o debate com a atriz Letícia Sabatella, no plenário do Senado, em fevereiro, sobre a manutenção das obras de transposição do Rio São Francisco. Na ocasião, ele disse à atriz: "Eu, ao meu jeito, escolhi a opção de meter a mão na massa, às vezes suja de cocô. Às vezes. Mas minha cabeça não, meu compromisso não". Perguntado se essa resposta não seria um destempero pouco compatível com um político que tem possibilidade de se candidatar à Presidência, Ciro admitiu que deveria ter evitado o debate.

- É evidente que deveria ter evitado, mas passamos mais de sete horas debatendo.

Para Ciro, a eleição do ex-deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) para presidir a Câmara, em 2005, foi uma tentativa de golpe contra Lula.

- A eleição do Severino foi tentativa de golpe. Era para ele receber o pedido do impeachment. O Aécio Neves foi um dos que ajudaram a impedir o golpe. Mas, antes disso, Severino aderiu ao Lula - afirmou o deputado, lembrando ainda que a oposição só percebeu que Severino "não era uma Brastemp" quando ele aderiu ao governo.

Sem dizer sim ou não, ele deixou claro que poderá concorrer à sucessão de Lula em 2010, mas que ainda é cedo para discutir o assunto.

- Serei candidato se entender que é uma candidatura que servirá ao país. (....) Se for o meu destino, será uma honra.

O deputado disse também que a ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, não tem responsabilidade sobre o dossiê dos gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, já "que ela trabalha com seriedade, compostura e ética". Para ele, a responsabilidade pelo vazamento é do senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

- Consta que quem vazou o dossiê para a revista "Veja" foi o senador Álvaro Dias. Vazar é crime. Não sou eu quem diz, é a lei. Ele nega. Pode negar. Mas há muitas evidências contra ele.

Ciro deu sua versão sobre a origem de seu desentendimento com o governador de São Paulo, José Serra (PSDB).

- Ele era o deputado de maior valor da bancada do PSDB, e a bancada inteira não votava nele para líder. Aí ele me liga. Saio ligando, deputado por deputado, que me dizem: ele é sem escrúpulo, passa por cima da mãe, é arrogante. Os deputados que diziam, não eu. Fizemos ele líder da bancada pelo valor - contou, sobre a eleição da liderança da bancada.

Disse ainda que, depois que Serra deu entrevista afirmando que o PSDB não apoiaria a revisão constitucional, defendida pelo então candidato a presidente Fernando Henrique, ele interveio e colocou Serra contra a parede:

- Disse pra ele: "Ou você desdiz o que disse ou deixa a liderança". Ele desdisse. Mas nunca mais falou comigo.

Num evento à tarde, perguntado se comentaria a entrevista de Ciro, Serra disse que não. Os repórteres insistiram:

- Mas o senhor não quer saber o que Ciro falou do senhor?

Serra disse:

- Não, não quero.