Título: Tremor: poucos segundos e muito susto
Autor: Barbosa, Adauri Antunes; Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 24/04/2008, O País, p. 10

ABALO: Especialistas alertam para risco de novos tremores de menor força: "A Terra não se acomoda de uma vez"

O abalo, que atingiu cinco estados, fez ganhar força luta por uma rede para melhorar a percepção de terremotos

SÃO PAULO e BRASÍLIA. O tremor de terra que atingiu anteontem São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Paraná e Minas Gerais foi o sexto maior em magnitude já registrado na história do país, com 5,2 graus na escala Richter. E provocou muito susto na população em apenas poucos segundos. O abalo ocorreu às 21h48, sob o oceano, no litoral paulista, a 218 quilômetros do município de São Vicente e a 270 quilômetros de São Paulo. O chefe do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UnB), Lucas Vieira Barros, disse que novos tremores podem ocorrer na região, mas com menos força.

- A Terra não se acomoda de uma vez por todas. Nossa expectativa é que aconteçam novos tremores de menor magnitude, embora não se possa descartar a possibilidade, pouco provável, de um sismo maior - disse ele.

Milhares de pessoas, principalmente moradores de andares mais altos de edifícios nos cinco estados, sofreram um grande susto na noite de terça-feira. Foi o tremor de terra mais intenso em São Paulo nos últimos cem anos. Lá os bombeiros receberam cerca de 3 mil chamadas por telefone relatando ocorrências provocadas pelo sismo na noite de anteontem. Eram relatos de rachaduras em casas provocadas pelo abalo. Os aparelhos em Brasília, porém, registraram movimentação por até 15 minutos.

Em Mogi das Cruzes, a 170 quilômetros de São Paulo, o tremor deslocou uma adutora, interrompendo o fornecimento de água para cerca de 20 mil pessoas em aproximadamente cinco mil casas.

O professor José Roberto Barbosa, do Instituto Astronômico e Geofísico (IAG), da Universidade de São Paulo (USP), afirma que o sismo registrado na terça-feira foi expressivo e alto para o Brasil. Para ele, a ocorrência deste tipo de fenômeno deve levar a uma discussão sobre ações de prevenção, envolvendo pesquisadores e técnicos da Defesa Civil. Ele admite que não há preparação nos prédios e nem orientação sobre como a população deve agir, mas lembra que são raros os eventos dessa magnitude, considerado um terremoto de intensidade moderada.

Especialista pede 40 novas estações sismográficas

Pela manhã, em Brasília, o chefe do Observatório Sismológico da UnB, Lucas Vieira Barros, reuniu-se com assessores do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Jorge Félix, para pedir ajuda do Palácio do Planalto na aquisição de 40 novas estações sismográficas a fim de melhorar a percepção de terremotos no Brasil. O professor defende a ampliação da rede nacional de detecção de tremores. Cada aparelho custa, em média, US$25 mil, o que totalizaria US$1 milhão ou R$1,6 milhão. Ele disse que o encontro já estava agendado antes do tremor de terra e que vai detalhar a proposta, indicando o auxílio financeiro necessário para dotar o país de uma rede mais ampla de monitoramento.

Barros disse que o Brasil vive um "surto sísmico", ainda que a maioria dos tremores seja de baixa intensidade e passe despercebida. A maior freqüência de abalos, no entanto, pode ter outra causa: o povoamento de áreas antes desertas, que antes podiam ser atingidas sem que ninguém ficasse sabendo, e a maior capacidade de detecção de tremores em relação a 40 ou 50 anos atrás.

Brasil no centro de placa tectônica sul-americana

Ele explicou que o Brasil está situado no centro da placa tectônica sul-americana, que sustenta o subcontinente e parte do Oceano Atlântico. Essa placa, porém, sofre pressão dos dois lados - do oeste, no litoral do Chile, da chamada Placa de Nazca; do leste, da placa da África.

- O que está causando esse surto é que as rochas estão no seu limite de rigidez elástica.

O tremor que sacudiu prédios e foi sentido em São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina, Paraná e Rio seria decorrência do rompimento de uma camada rochosa. O rompimento dura uma fração de segundos. A energia liberada propaga-se em ondas que fazem o chão se mexer. Segundo relatos de moradores, o tremor durou cerca de cinco segundos em bairros da capital paulista. Os aparelhos em Brasília, porém, registraram movimentação por até 15 minutos.

Entre as regiões mais atingidas por abalos no Brasil estão o norte de Minas Gerais, de Mato Grosso, o Ceará, o Rio Grande do Norte e o litoral do Sudeste. No Acre, há registros de tremores de até 7 pontos na escala Richter. Como ocorrem a profundidades de até 600 quilômetros, eles não causam efeito na superfície.

O observatório da UnB não sabe a profundidade do abalo de anteontem, mas estima que tenha sido na faixa de 1 a 30 quilômetros abaixo do solo do mar - a maioria dos abalos desse tipo, no Brasil, ocorre na faixa de 1 a 15 quilômetros, segundo Barros.

A escala Richter indica a força desprendida pelo tremor, mas não a intensidade com que ela atinge a superfície. A escala de intensidade usada pelos sismólogos vai de 1 a 12. Segundo Barros, as rachaduras observadas anteontem indicam que o tremor atingiu 5 pontos nessa escala.

Ele disse que os abalos costumam ocorrer em ciclos, ou seja, repetem-se nos mesmos lugares. A falta de informações sobre abalos em séculos passados dificulta qualquer previsão.

Atualmente, o país conta com mais de 50 sismógrafos instalados, principalmente, em áreas de reservatórios de água. Porém, conforme o professor, os equipamentos não conseguem detectar, por exemplo, tremores de até três graus na região amazônica.

O professor Colombo Celso Gaeta Tassinari, diretor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP), descartou a possibilidade de tremores de terra de grande intensidade no Brasil, como acontece nos países andinos, na Califórnia ou no Japão. Ele admitiu, no entanto, que a desocupação desordenada em áreas de risco geológico pode provocar tragédias e mortes.

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