Título: Não houve avanços em termos de democracia
Autor: Vicent, Maurício
Fonte: O Globo, 19/04/2008, O Mundo, p. 30

Grande parte dos cubanos teria vontade de deixar Cuba caso o governo permitisse, diz o pesquisador José Azel, do Instituto de Estudos Cubanos da Universidade de Miami. Mas o baixíssimo poder aquisitivo da população e as medidas restritivas que provavelmente seriam aplicadas por outros países impediriam um êxodo geral, completa. Azel falou ao GLOBO de Miami por telefone.

Se a reforma migratória for confirmada nesses moldes, qual será a repercussão interna?

JOSÉ AZEL: O povo vai felicitar as mudanças. O governo de Raúl (Castro) teria ganhos de imagem dentro e fora do país. E a tendência é de que a grande maioria da população queira deixar Cuba.

É esperado um êxodo geral?

AZEL: Isso dependerá muito das medidas que os países vão tomar para restringir a entrada de cubanos, pois é altamente provável que entrem como turistas e acabem permanecendo de forma ilegal. Além disso, há as restrições financeiras. A população não tem dinheiro para viajar. Um cubano ganha em média US$200 por ano, isso inclui médicos e professores. E não acredito que Cuba abra mão dos recursos da carta branca (permissão para viajar que custa cerca de 100).

Qual deve ser o efeito prático?

AZEL: A proposta, do jeito que o jornal ¿El País¿ divulgou, vai na mesma linha da permissão para compra de computadores e celulares. Do que adianta liberar a venda se não há dinheiro para comprar? Acho ótimo saber que posso comprar um avião se quiser. Mas não é uma questão que me diga respeito se não tenho dinheiro.

São mudanças inócuas?

AZEL: Não saberia dizer se esta é apenas uma reforma cosmética ou de fato traria mudanças substanciais. Em linhas gerais, essas são formas muito inteligentes do governo para atrair moedas fortes ao país. Para exercer esses direitos, você depende do dinheiro enviado por familiares que moram no exterior. Cerca de 1,5 milhão de cubanos vivem no exílio. São praticamente 10% da população, que hoje está em torno de 11,2 milhões de habitantes.

O que representa a reforma?

AZEL: É uma maneira muito interessante de se pôr pressão sobre o governo americano. Cuba não tem nada a perder. Hoje os Estados Unidos têm uma cota de 20 mil vistos por ano (para cubanos). A grande questão é como eles vão reagir. Não acredito que aumentariam o número de vistos. O mais importante é destacar que não há mudanças democráticas no horizonte. Todos os anúncios até agora foram no campo econômico, e não político. Não houve avanços em termos de democracia.