Título: A razão do Paraguai é forte
Autor: Gois, Chico de; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 24/04/2008, O Mundo, p. 31

BUENOS AIRES. Aos 82 anos, o paraguaio Juan Enrique Diaz Bordenave divide seu tempo entre Assunção e Rio, onde moram sua mulher, Maria Cândida, e quase todos os seus seis filhos, entre eles o ator Chico Diaz. Eufórico pela vitória de Lugo, ele participou ativamente da campanha, colaborando na secretaria de Relações Internacionais da Aliança Patriótica para a Mudança. Ainda sem saber se ocupará um cargo no futuro governo, Bordenave dedicará os próximos meses a obter o respaldo de brasileiros à demanda do futuro governo em relação a Itaipu. ¿Não convém ao Brasil, como país importante no mundo, aparecer como injusto e imperialista¿, disse ele ao GLOBO, por telefone, pouco antes de embarcar para o Brasil.

Janaína Figueiredo

Lugo já anunciou que buscará a revisão das tarifas cobradas pelo Paraguai pela energia exportada para o Brasil. O senhor acredita na possibilidade de um acordo?

BORDENAVE: Nos últimos dias, vimos declarações contraditórias do presidente Lula e de seu ministro das Relações Exteriores. Lula diz que não negociará nada e o outro diz que o assunto será estudado. Parece que está tudo acordado. Lula não pode ser flexível porque será criticado pelos colunistas conservadores e a indústria paulista, será acusado de ter cedido como fez com Evo Morales. Lula deve aparentar resistência. Mas a razão do Paraguai é tão forte e evidente que confio na possibilidade de um acordo. Não convém ao Brasil, como país importante no mundo, aparecer como injusto e imperialista. Eu estive em Itaipu, na década de 70, e ouvi um coronel brasileiro dizer que se trava de um negócio da China para o Brasil. Estou tentando, com outros colegas, desenvolver uma estratégia para obter apoio de brasileiros em relação à demanda de Itaipu.

O senhor já obteve o respaldo de personalidades brasileiras?

BORDENAVE: Sim, temos muitos amigos que nos respaldam, entre eles Frei Betto, que esteve aqui na eleição presidencial. Nesta minha viagem, vou conversar com muitas pessoas. A luta por Itaipu não pode esperar.

A aliança liderada por Lugo tem muitos partidos. Não é complicada a convivência de tantos setores no governo?

BORDENAVE: Todos estão muito bem dispostos para reconstruir o país. Claro que existirão ambições pessoais e um pouco de competição ideológica, mas não acredito que seja tão difícil.

Muitos acusam Lugo de ser um Chávez paraguaio...

BORDENAVE: Todos os nossos países viveram ditaduras militares e sofrem as conseqüências do neoliberalismo, do capitalismo selvagem. Temos muitas coisas em comum com nossos vizinhos. Mas existem muitas visões sobre o socialismo, muitas formas de compreendê-lo. No fundo, todos queremos as mesmas coisas: igualdade social, o fim do latifúndio, mais autonomia e soberania para nossos países e uma grande fraternidade. Temos de começar a ser irmãos para valer. Por isso, em relação à questão de Itaipu, Lula deve adotar uma posição fraterna.