Título: Juízes do interior instituem a jornada TQQ
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 27/04/2008, O País, p. 13

BRASÍLIA. O expediente privilegiado de deputados e senadores, que costumam concentrar o trabalho de terça a quinta-feira, não é mais exclusividade do Congresso. Pouco a pouco vêm à tona queixas contra juízes do interior adeptos da prática. São magistrados contratados para atuar em cidades pequenas, mas que não abrem mão de passar o fim de semana prolongado na capital do estado. Em muitos casos, a jornada reduzida é motivada pelo endereço do juiz, que se recusa a morar na comarca onde atua e mantém residência e família em outra cidade. Sobre isso, a Constituição é clara: ela obriga o magistrado a morar no município onde trabalha.

As denúncias partem principalmente de representações locais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ¿ que apelidou a prática de TQQ, em alusão às iniciais dos dias da semana que resumem o expediente. Uma das reclamações é contra Ricardo Ferreira Leite, do Juizado Especial Cível e Criminal de Paraíso do Tocantins. Ele mora em Palmas e, segundo a OAB local, não comparece todos os dias ao trabalho, a 70 quilômetros de sua casa. Na quinta-feira, O GLOBO telefonou para o juizado. Uma funcionária que se identificou como Betânia Araújo informou que o chefe só havia trabalhado na terça-feira. Nos outros dias da semana, ele estava ¿de recesso¿. Em defesa do magistrado, Betânia disse que a situação era uma eventualidade:

¿ Ele trabalha todo dia.

Magistrados ignoram proibições

O juiz Antiógenes Ferreira de Souza, da 1º Vara Cível de Porto Nacional (TO), mora na cidade. Mas é professor na Universidade de Gurupi, a 240 quilômetros dali. Ele conta que toda segunda-feira trabalha até as 16h, quando pega a estrada. Volta na tarde do dia seguinte. Chegou a pedir autorização à Corregedoria do Tribunal de Justiça de Tocantins para dar aulas, mas o órgão negou, por entender que a atividade extra prejudicava sua produtividade. Souza desobedece à determinação.

¿ A aula não afeta meu trabalho. Minha carga horária na universidade é a menor possível: oito horas-aula por semana. O tribunal disse que não pode, mas recorri da decisão porque minha produtividade aumentou ano passado ¿ justifica.

Recentemente, um grupo de advogados de Dom Pedrito (RS) reclamou à corregedoria do estado do juiz Rodrigo Granato Rodrigues, da 2ª Vara Judicial. Ele mora em Bagé, a 70 quilômetros de onde trabalha. Segundo os advogados, ¿a falta de permanência na sede da comarca do magistrado, bem como sua ausência em dias de semana e fins de semana na cidade, acarretam consideráveis prejuízos aos jurisdicionados¿. Rodrigues pediu ao Conselho Superior da Magistratura do Rio Grande do Sul autorização para morar fora, mas a resposta foi negativa. Ele descumpre a decisão.

Em sua defesa, ele diz que não falta ao trabalho e que a vara tem produtividade superior à média nacional. E alega não poder se mudar de Bagé, pois a mulher e o filho moram lá.

¿ Meus despachos não demoram mais que 24 horas, e não há reclamação de morosidade na minha vara. Não vou deixar minha mulher e meu filho sozinhos. Tenho obrigações como magistrado, esposo e pai. Quero exercer bem as três funções. Jornal: O GLOBO Autor: Editoria: O País Tamanho: 556 palavras Edição: 1 Página: 13 Coluna: Seção: Caderno: Primeiro Caderno

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