Título: Política externa, o novo front da campanha
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 27/04/2008, O Globo, p. 37
NOVA YORK. A política externa americana é o mais recente campo de batalha entre Barack Obama e Hillary Clinton. Depois que as pesquisas de opinião mostraram que os anúncios de TV sobre ameaças terroristas podem ter sido decisivos para as vitórias de Hillary nas primárias de Ohio, Texas e da Pensilvânia, os dois democratas travam agora uma nova guerra, desta vez em torno de suas propostas como comandante-em-chefe das tropas americanas. E ambos agem como se já houvessem conquistado a indicação do partido. Hillary saiu na frente, propondo esta semana, em Fayetteville, na Carolina do Norte, as suas ¿soluções para o fortalecimento militar dos EUA¿.
¿ Não há soluções fáceis para os dilemas que enfrentamos. Temos que acabar com a guerra do Iraque, vencer a guerra no Afeganistão e enfrentar a ameaça do Irã. E é preciso deixar claro que, se a segurança de Israel for ameaçada, eu não terei dúvidas em bombardear o Irã e fazer o país desaparecer do mapa ¿ declarou Hillary.
Obama insiste em front Afeganistão-Iraque
A fala propositadamente incendiária da senadora teve um outro alvo: Obama vinha falando sobre manter esforços diplomáticos no Oriente Médio, oferecendo-se para sentar-se à mesa de negociações inclusive com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad. Num momento em que o governo americano acusa a Coréia do Norte de ter ajudado a Síria a construir um reator nuclear para enriquecimento de plutônio, destruído por um ataque de Israel em setembro de 2007, a postura de Obama foi criticada diretamente pelo candidato republicano John McCain e indiretamente pelas declarações de Hillary.
Ela pretende mostrar ao eleitorado democrata que é mais decidida e agressiva do que Obama quando se trata de defender os interesses americanos. Obama também vinha insistindo que o verdadeiro inimigo americano é Osama bin Laden e que concentrar tropas no front Afeganistão-Paquistão é agora o mais importante para a defesa dos EUA.
¿ O próximo presidente terá pela frente mais desafios na política externa do que qualquer outro que tenha assumido o cargo ¿ avalia Strobe Talbott, analista do Instituto Brooking. ¿ A situação no Iraque continua confusa, com frágeis ganhos americanos que podem ser revertidos a qualquer momento, e quando o novo presidente tomar posse, provavelmente estará ainda indefinida. Por isto, os eleitores vêem com apreensão a possibilidade de que, caso um democrata seja eleito, haja riscos numa retirada precipitada do Iraque e numa atitude menos decidida em relação às ameaças à segurança dos EUA.
Já Will Marshall, analista do Progressive Policy Institute e estrategista democrata, acha que Hillary fez um jogo de retórica para soar tão dura em matéria de política externa quanto o republicano John McCain:
¿ O candidato republicano cresceu durante a Guerra Fria e parece mais convincente quando se trata da defesa dos interesses americanos e da autoridade moral dos EUA, inclusive usando a força. Por isto, neste momento, os democratas precisam responder e mostrar aos eleitores suas propostas em termos de política externa ¿ avalia Marshall.
Quando se trata da diferença entre os dois democratas, a questão parece envolver o local onde concentrar o esforço de guerra contra o terrorismo.
¿ Para Obama, o Irã é uma teocracia radical que promove o terrorismo e a violência regional, mas ele pretende iniciar uma ofensiva diplomática para tentar pacificar a região e concentrar esforços no front do Afeganistão. Já Hillary Clinton acredita que o Irã oferece desafios de longo prazo para a política externa dos EUA e seu mais importante aliado no Oriente Médio, Israel. O mais influente conselheiro politico de Hillary, Richard Holbrooke, já comparou Ahmadinejad a Adolf Hitler, afirmando que o Irã é uma enorme ameaça aos EUA, à paz no Oriente Médio e à segurança de Israel¿ afirma Frankie Sturm, analista da Foreign Policy in Focus.
Esta semana, porém, o clima entre os dois democratas ficou mais tenso pela recusa de Obama em participar de mais um debate antes das primárias de Indiana e da Carolina do Norte, no dia 6 de maio, o que levou Hillary a elevar o tom no tema da segurança militar americana e, indiretamente, incentivar dúvidas sobre a capacidade de Obama como comandante-em-chefe das tropas americanas. Ela passou os últimos dias de campanha na Pensilvânia veiculando anúncios negativos sobre Obama exatamente neste quesito e muitos analistas prevêem que a senadora de Nova York tende a tornar-se ainda mais agressiva.
Senador não quer polêmica sobre o tema
Mas o principal estrategista da campanha de Obama, Daniel Axelrod, reafirmou que seu candidato não vai elevar o tom:
¿ Vamos manter nossa estratégia de não entrar na polêmica sobre quem é mais duro em matéria de política externa. Este debate não nos interessa. O que interessa agora é terminar rapidamente este longo processo das primárias porque estamos perdendo muito tempo em relação aos republicanos. Nós não vamos atacar de modo selvagem Hillary Clinton porque não vamos dar munição para John McCain ¿ avalia Axelrod.
A atual estratégia de Obama, segundo Axelrod, pode ser definida pelo novo slogan escrito na camiseta que seus militantes estão vendendo em Indiana e na Carolina do Norte: ¿Stop the drama: vote Obama!¿ (pare com o drama: vote em Obama). Resta saber se os eleitores dos dois estados concordam. Jornal: O GLOBO Autor: Editoria: O Mundo Tamanho: 924 palavras Edição: 1 Página: 37 Coluna: Seção: Caderno: Primeiro Caderno
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