Título: Inflação adia alta da gasolina
Autor: Camarotti, Gerson; Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 30/04/2008, Economia, p. 25

Governo quer evitar que aumento na refinaria supere 5%. Petrobras reivindica 10%

Ogoverno decidiu adiar o reajuste dos preços dos combustíveis, congelados desde outubro de 2005, apesar das pressões da Petrobras. Para evitar aumentos ainda maiores na inflação - já fortemente afetada pelas elevadas cotações dos alimentos no Brasil e no mundo - o plano é fazer novas simulações, tendo como base uma faixa entre 3% e 5% de majoração na refinaria, a fim de que o impacto na bomba, ou seja, para o consumidor final, seja o menor possível. A decisão foi tomada após três horas de reunião no Palácio do Planalto entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ministros Edison Lobão (Minas e Energia), Dilma Rousseff (Casa Civil), Guido Mantega (Fazenda), e o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli.

No encontro, Gabrielli fez um apelo em favor do reajuste, após realizar uma exposição sobre as perdas da companhia com a defasagem entre os preços internacionais e os fixados pela estatal no mercado interno. Ele chegou a dizer que os preços subiram 100% lá fora em dois anos. Apesar da insistência, e preocupada com o impacto na inflação, a maioria achou por bem adotar a cautela. As contas serão fechadas "o mais breve possível", relatou uma fonte.

A Petrobras reivindica para a gasolina um reajuste de 10% nas refinarias, o que resultaria em alta de 4,8% nas bombas. Para o óleo diesel, o aumento requisitado é de 10%, o equivalente a 6,4% nas bombas.

Desde 2005, foram R$ 7,4 bi a menos

Uma possibilidade cogitada ontem pelo mercado seria a de um reajuste parcelado em duas vezes - junho e dezembro - para diluir o impacto sobre a inflação. No entanto, segundo um participante da reunião, a hipótese não chegou a ser mencionada.

Ao autorizar o reajuste, o presidente Lula, que dará a última palavra, atende às reivindicações da Petrobras. Em setembro de 2005, a cotação do barril de petróleo era US$65. Hoje oscila entre US$110 e US$120. Os preços da gasolina e do diesel estão congelados desde outubro de 2005. Já o botijão de gás, desde janeiro de 2003.

Até ontem, a expectativa era que a alta seria menor para o consumidor, tendo em vista que as distribuidoras contam com outros itens para a formação do preço. O maior impacto, disseram técnicos, seria sobre o diesel, uma vez que a gasolina vendida nos postos tem adicionados à sua composição 25% de álcool, cuja cotação deve cair com a safra de cana. Outra razão é que o consumo de etanol superou o da gasolina, com domínio dos carros flex.

Enquanto a reunião acontecia, fontes ligadas ao presidente mencionavam um possível desconforto do Planalto com o anúncio do reajuste num ano de eleições. Porém, o preço do petróleo lá fora e a urgência alegada pela Petrobras de fazer novos investimentos pesaram. Outro fator é que o descasamento entre receitas e despesas foi um dos motivos que levaram à queda do lucro da estatal em 2007.

Estima-se que 70% do faturamento da Petrobras são obtidos com a comercialização da gasolina, do diesel e do GLP (gás de botijão) no Brasil.

No cenário de uma inflação em alta, se o reajuste chegar a 5% nas bombas, deve provocar um ciclo de aperto monetário maior que o esperado. De acordo com o cálculo de economistas, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve ficar em 0,55% em maio se o combustível subir. Sem o reajuste, a taxa é estimada em 0,35%.

- Isso traz mais uma preocupação. Com essa alta, se houver, a inflação em um ano deve ficar entre 5,30% e 5,40%, bem acima da meta (4,5%) - disse Elson Teles, economista-chefe da Corretora Concórdia, para quem a alta do combustível deverá fazer o aumento de juros ser maior e mais longo.

Segundo o consultor Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE), a Petrobras já deixou de contabilizar, em sua receita, R$7,4 bilhões desde o ano de 2005, quando fez o último reajuste de gasolina e diesel. Naquele ano, abriu mão de faturar R$4,223 bilhões por manter, no país, preços mais baixos que os internacionais. Em 2006, a estatal deixou de ganhar R$1,209 bilhão. Já em 2007, com a desvalorização do dólar, manteve preços acima do mercado externo, na média do ano, e agregou R$98,16 milhões. Este ano, até abril, a Petrobras não contabilizou R$2,106 bilhões por manter preços congelados.

Embora não revele seus cálculos, o analista de Petróleo do BES Investimento, Gilberto Pereira de Souza, diz que um reajuste de 5% ainda deixaria os preços bem defasados, especialmente no caso do diesel. Ele não acredita que as ações da empresa serão fortemente influenciadas com um eventual anúncio:

- O mercado, vira e mexe, fala em defasagem de preços, mas se você analisar os últimos meses, vai perceber que os investidores não estão reagindo a resultados. Eles só querem saber de Tupi - disse, referindo-se à megadescoberta de petróleo na Bacia de Santos.

COLABORARAM Cássia Almeida e Juliana Rangel