Título: Euforia no pregão
Autor: Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 03/05/2008, Economia, p. 29
Com forte entrada de estrangeiros, Bovespa bate recorde e dólar cai para R$1,65.
No primeiro dia útil do mercado depois de o Brasil ter recebido o grau de investimento da agência de classificação de risco Standard & Poor"s (S&P) - na quarta-feira, o rating do país para dívida em moeda estrangeira passou a "BBB-" -, a euforia pareceu não ter data para acabar. Com a forte entrada de recursos estrangeiros, o principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), o Ibovespa, ultrapassou os 70 mil pontos pela primeira vez em sua história e beirou os 71 mil: na máxima do dia, chegou a marcar 70.973 pontos, em alta de 4,57%. No encerramento, a alta foi de 2,21%, aos 69.366 pontos, novo recorde. O número de negócios também foi histórico: 385.729 transações, com volume de R$11,099 bilhões, quase o dobro da média diária no ano, de R$5,991 bilhões.
A moeda americana acompanhou o fluxo positivo de dólares para o país e teve nova queda, de 0,84%, para R$1,65, a cotação mais baixa desde 11 de maio de 1999. Na mínima do dia, chegou a R$1,646, nível de janeiro de 1999, mês da maxidesvalorização do real. O Banco Central fez o seu tradicional leilão de compra de dólares, mas não segurou a desvalorização da moeda. Segundo Mário Paiva, da corretora Liquidez, a tendência do dólar é de baixa, com a expectativa de aumentar a entrada de moeda americana no país.
O risco-país, que mede quanto o mercado pede a mais de juros pelos títulos brasileiros em relação aos papéis americanos, registrou sua quarta queda consecutiva, de 4,83%, para 197 pontos centesimais. Já o título da dívida externa com vencimento em 2040, o chamado Global 40, subiu 0,17%, se mantendo na máxima histórica, de 136,97% do valor de face.
No mês de abril o saldo de investidores estrangeiros na Bovespa voltou a ficar positivo. No mês, até o dia 28, entraram R$6,315 bilhões via mercado de ações, o que fez o resultado ficar positivo em R$533,7 milhões em 2008. Os números da Bovespa ainda não computam os recursos do dia da obtenção do grau de investimento, da véspera e de ontem. A volta dos estrangeiros deve se consolidar com a nova nota recebida pelo Brasil.
Ações de empresas do varejo sobem até 18%
Em Nova York, a maior parte dos recibos de ações de empresas brasileiras (ADRs) voltou a subir. Em média, a alta foi de 0,68%, com 20 dos 35 ativos em alta. No Brasil, o destaque foi das ações do setor de construção civil e do varejo. Das cinco maiores altas entre os papéis que compõem o Ibovespa, duas são do setor de varejo - B2W, controladora dos sites Submarino e Americanas.com (18,15%) e Lojas Americanas (17,22%) - e três, da construção civil: Rossi Residencial (15,03%), Cyrela Commercial Properties (14,66%) e Duratex (10,99%).
Segundo analistas, estes dois são os setores que tendem a mais se beneficiar da nova percepção de risco do Brasil no mercado internacional. Isso porque são segmentos da economia que dependem de intenso financiamento, além de responderem imediatamente ao crescimento do país, destaca Eduardo Roche, gerente de análise da Modal Asset Management.
- São setores da economia doméstica e que têm benefício mais claro do grau de investimento, pois demandam muito capital e captam muitos recursos via emissão de ações ou de dívidas mesmo. As ações do varejo e do setor imobiliário tinham sofrido muito com o processo de alta de juros - diz Roche, citando a retomada de elevação da taxa básica, a Selic, pelo Banco Central, em abril.
Apesar de vários papéis do Ibovespa terem subido mais de 10%, essa valorização não foi suficiente para fazer o índice subir próximo disso no dia. Isso porque são papéis sem peso relevante no indicador, diz Roche. Já ações como as da Petrobras, com peso de 16,78%, se mantiveram com altas de 1,89% para as ações preferenciais (PN, sem voto) e 1,80% para as ordinárias (ONs, com voto). Já as da Vale, que representam 16,10% do indicador, caíram 0,17% (as PNAs) e 0,36% (as ONs). Com o grau de investimento, investidores passaram a olhar as chamadas ações de "segunda linha", menos negociadas, diz Roche. E começaram a vender ações de Vale e Petrobras, que já tinham a nota de grau de investimento da S&P.
Com a nota da agência, diminuiu a pressão sobre os juros brasileiros a longo prazo, embora agentes do mercado continuem acreditando que o atual ciclo de elevação não acabou. A projeção de juros para 2010, em contratos negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), caiu 0,12 ponto percentual, para 13,55% ao ano. Já a dos contratos com vencimento em janeiro de 2009 teve alta de 0,03 ponto, para 12,80%.
S&P pede corte de gastos maior no país
A S&P realizou teleconferência para explicar a elevação do Brasil e voltou a destacar os efeitos positivos da política monetária conservadora do Banco Central e a necessidade de continuidade desta, seguida de reformas estruturais, como a da Previdência, para o país continuar tendo melhora em sua avaliação de risco. Além da elevação da nota do Brasil e de dez empresas do país, a agência melhorou sua visão para a avaliação de risco da Petrobras, já com nota "BBB-", de estável, para positiva.
A analista da S&P para o Brasil, Lisa Schineller, afirmou que a agência espera uma queda na relação entre dívida e Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) para promover nova revisão:
- Nós temos no horizonte uma queda muito lenta da relação dívida/PIB. A redução mais aguda desta taxa é uma questão chave. Mas isso vem da combinação do aumento dos esforços fiscais do Brasil, com políticas que impulsionem ainda mais o crescimento, para níveis mais fortes do que no passado, para 4% a 4,5% do PIB. O modelo de quase dez anos está dando resultados.
(*) Com agências internacionais
LÍDER NO MUNDO, BOVESPA JÁ SOBE MAIS QUE O DOBRO DO MÉXICO, na página 30