Título: Razão para reduzir juros
Autor: Economia
Fonte: O Globo, 04/05/2008, Economia, p. 36

Economista defende controle de entrada de capitais.

SÃO PAULO

Como devemos avaliar o anúncio da S&P?

RICARDO CARNEIRO: Foi um anúncio positivo, mas refletiu uma situação antecipada pelo próprio mercado. O fato de o país pagar hoje um prêmio de risco em torno de 200 pontos (acima dos títulos americanos) já corresponde a uma situação de grau de investimento. O que a agência fez foi reconhecer isso.

Para a Moody"s, o Brasil deveria reduzir antes a dívida interna para ter o grau de investimento. Quem está certo?

CARNEIRO: Em economias periféricas, em que existe a possibilidade de desequilíbrio do balanço de pagamentos, acho mais importante alcançar esse equilíbrio do que uma redução mais acentuada da dívida interna. O equilíbrio das contas externas é uma condição para arrumar as contas fiscais. O contrário não é verdadeiro.

Quais os efeitos positivos do anúncio da S&P?

CARNEIRO: São efeitos de mais longo prazo. Com o grau de investimento, os grandes fundos institucionais, de pensão, poderão entrar no país ou aumentar seus investimentos no Brasil. Além disso, a taxa de risco (o que o país ou as empresas privadas pagam para captar no exterior) vai oscilar menos.

Visto assim, parece que o grau de investimento não traz problemas ao país.

CARNEIRO: É bom ser grau de investimento, já que o maior fluxo de investimentos aumenta a liberdade do governo de fazer a política econômica doméstica. Mas não é uma panacéia. O México tem esse título há mais tempo e, mesmo assim, apresentou desempenho medíocre nos últimos anos, com crescimento abaixo dos 3%.

Quais os riscos associados ao anúncio da S&P?

CARNEIRO: O país vai passar a receber mais capitais externos, o que vai levar a uma apreciação maior do real frente ao dólar. No nosso caso, essa situação chega no momento em que o país volta a apresentar déficit nas transações correntes.

O que o governo deve fazer?

CARNEIRO: Sou favorável a algum mecanismo de controle na entrada desses capitais, como uma quarentena. Todos os países que fizeram isso tiveram maior estabilidade, e o caso do Chile é um paradigma. Há quem diga que isso poderia assustar o mercado, mas acho que seria o contrário. Mais danosa seria a adoção de um controle para a saída de capitais.

O Banco Central elevou os juros para tentar acertar na inflação, mas isso deve atrair mais capital para o país, pois aumentará a diferença entre juros internos e externos. Foi uma decisão correta?

CARNEIRO: Se já não havia razão para aumentar os juros, agora, com o grau de investimento, o BC deveria reduzir as taxas, de forma a limitar essa arbitragem de taxas. Se isso não for feito, o BC estará fazendo uma política contrária ao que se espera de um país com grau de investimento: diminui a aversão ao Brasil no exterior, mas internamente você faz o contrário.

Qual seria o patamar ideal para a Selic?

CARNEIRO: Com uma inflação de 4,5%, acho que o ideal seria um patamar de 10% nominais, o que daria uma taxa entre 5% e 5,5% descontada a inflação.

A preocupação do BC com a inflação não é correta?

CARNEIRO: A decisão de elevar os juros foi precipitada. Primeiro, porque o aumento de demanda é localizado. Segundo, não há como fugir do choque de preços das commodities. Mas a tendência é que esses preços recuem no futuro. Se quiser atuar sobre o consumo, o governo deve restringir, por exemplo, o número de prestações nos financiamentos. (A.N. e L.R.)