Título: CPI: cartão pagou a empresas de servidores
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 01/05/2008, O País, p. 8

Funcionários de cargos comissionados eram sócios ou gerentes de firmas que tinham contratos com o poder público

BRASÍLIA. Os dois sub-relatores da oposição na CPI mista do Cartão Corporativo afirmaram ontem ter encontrado indícios de tráfico de influência no uso dos cartões por ocupantes de cargos comissionados no governo federal. De acordo com levantamento preliminar dos deputados Carlos Sampaio (PSDB-SP) e Índio da Costa (DEM-RJ), 452 empresas que receberam pagamentos com cartões corporativos desde 2002 têm em seu quadro societário pessoas que são ou foram servidores comissionados no mesmo período.

A suspeita de conflito de interesses motivou uma troca de farpas entre os parlamentares da comissão e o chefe da Controladoria Geral da União (CGU), ministro Jorge Hage. Sem citar casos concretos, os dois deputados oposicionistas, que convocaram uma entrevista coletiva para divulgar os números, disseram que as 452 empresas com sócios no governo faturaram R$615 mil em transações com cartões corporativos desde 2002.

Empresas ainda receberam R$651 milhões em contratos

Além disso, os mesmos estabelecimentos teriam recebido R$R$651 milhões em contratos firmados com o poder público no período.

Segundo o levantamento dos deputados, foram identificados 473 servidores que integraram o quadro societário dessas empresas, e dez deles seriam portadores de cartões corporativos. As normas que regulam o serviço público proíbem que ocupantes de cargos comissionados sejam sócios-gerentes de empresas.

- Essas pessoas precisam escolher um chapéu. Se são sócias de empresas que fazem negócios com o poder público, não podem ocupar cargos no governo - afirmou o deputado Carlos Sampaio, sub-relator de sistematização da CPI do Cartão.

O chefe da Controladoria Geral da União respondeu com ironia à nova linha de investigação anunciada pelos deputados. Em nota oficial enviada ao GLOBO, ele afirmou: "Deve ser festejado o súbito interesse dos senhores deputados sobre essa questão. O que ela envolve é um possível conflito de interesses, matéria sobre a qual o país não dispõe de nenhuma lei adequada".

Jorge Hage informou que a questão é tema de um projeto de lei enviado ao Congresso pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em outubro de 2006. Mas criticou a oposição: "Acontece que esse projeto até hoje não foi aprovado, justamente porque o líder do Democratas apresentou recurso na Comissão de Constituição e Justiça impedindo a sua aprovação em caráter terminativo pela Comissão de Trabalho e Serviço Público", complementou o ministro.

Deputado pede isenção ao controlador-geral

A resposta de Jorge Hage irritou o deputado Índio da Costa, sub-relator de fiscalização de gastos da CPI do Cartão.

- A população espera isenção do controlador-geral. Se ele quer fazer política não está no cargo adequado - rebateu o deputado.

Sampaio também reagiu às declarações do ministro.

- Estou decepcionado. Como chefe da CGU, ele deveria festejar que a CPI tenha encontrado uma nova linha de investigação para reduzir o desperdício de dinheiro público.

À noite, os oposicionistas revelaram o caso de uma ex-servidora do Ministério da Fazenda que usou seu cartão para fazer compras numa empresa de informática da qual foi sócia-gerente. A despesa, de R$20, foi paga em abril de 2007, dois anos e meio depois de a ex-funcionária deixar o quadro societário da empresa.

De acordo com a CPI, ela acumulou, por três dias, o cargo de sócia-gerente com a função no governo. A ex-servidora ocupava cargo comissionado numa procuradoria regional do ministério do interior de Santa Catarina e não foi encontrada para comentar o caso.

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