Título: MP pede punição a mordomia de sindicato
Autor: Lima, Maria
Fonte: O Globo, 02/05/2008, O País, p. 8

Diretores da CNTTT usavam recursos de imposto sindical para pagar viagens de luxo, inclusive à Europa.

BRASÍLIA. Não foi só o deputado Paulo Pereira (PDT-SP), presidente da Força Sindical, que passou o 1º de Maio em apuros por causa de denúncias de corrupção, acusado de envolvimento no esquema de desvio de recursos do BNDES. A mordomia dos dirigentes da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Terrestre (CNTTT), no cargo há 10 anos, está com os dias contados. Denunciados pelo GLOBO em março, os gastos foram alvo de um inquérito que investigou desvio e má gestão dos R$3 milhões anuais do imposto sindical destinados à entidade. O Ministério Público do Trabalho encaminhou ao Tribunal Regional do Trabalho ação civil pública contra o presidente da CNTTT, Omar Gomes, e outros 16 diretores.

Na ação, a procuradora Adriana Machado pede antecipação de tutela para o afastamento do comando da entidade, a inelegibilidade do colegiado e o fim do pagamento de ajuda de custo ilegal, que chegava a R$15 mil por mês, aos dirigentes. No inquérito civil, ela se mostra perplexa com o depoimento de Gomes. Como já fizera em entrevista ao GLOBO, ele admite que era praxe da CNTTT pagar viagens às principais capitais européias e resorts no Nordeste para a diretoria, com esposas e filhos, em hotéis de primeira categoria, voando em classe executiva.

"Admitiu ter a Confederação custeado as viagens a Portugal e a Tóquio, inclusive informou que, no final de 2000, o propósito da viagem a Portugal foi pagar uma promessa feita à Virgem de Fátima, por sua esposa, em razão de recuperação de problemas de saúde", diz o despacho da procuradora, acrescentando: "O próprio presidente da CNTTT declarou que tais privilégios não são de exclusividade sua, mas estendidos a todos os membros da diretoria".

Ao pedir o afastamento imediato da cúpula da confederação, o MP argumentou que o processo judicial pode demorar, e até o seu final a diretoria causaria "prejuízos irrecuperáveis ao patrimônio dos trabalhadores". Por isso, pede a nomeação de administrador judicial até a eleição. Omar e seu grupo pretendiam se reeleger para um terceiro mandato de cinco anos, mas o pleito de 17 de abril foi suspenso pela Justiça.

Procuradora considera absurdos desvios na entidade

No despacho, a procuradora considera absurdos os desvios, confessados por Gomes, inclusive a concessão de empréstimos milionários, com recursos do imposto sindical, a federações e sindicatos filiados, que, depois, eram perdoados.

"Temos o seguinte quadro: valores tributados sobre os salários dos trabalhadores da categoria de transportes terrestres, simples motoristas, cobradores, ferroviários, custeiam, a cada ano, passagens e hospedagens em hotéis cinco estrelas de capitais do Nordeste de, no mínimo 48 pessoas, das quais apenas 12 terão efetiva participação em prol da Confederação", constata a procuradora.

Antes da complicação na Justiça, em entrevista ao GLOBO, Gomes confiava que a investigação daria em nada e que seria reconduzido ao comando da CNTTT, como se o cargo fosse vitalício. O despacho do MP destaca trechos da entrevista, em que ele diz: "Vou continuar, se isso não pegar". Mas nos últimos dias Gomes estava nervoso e chocado com a possibilidade de ser punido com o afastamento, a perda do salário de R$15 mil e o fim das mordomias de viagens:

- Se acontecer isso, é natural que eu fique triste. Quem não ficaria? Mas agora não quero falar mais nada. Depois que você me falou tudo isso, eu não tenho mais paciência nem calma - disse ao GLOBO, anteontem.

Carvalho diz que Lula foi exposto ao ridículo

O deputado Augusto Carvalho (PPS-DF), autor da emenda que acabava com o pagamento compulsório do imposto sindical , acompanhou o encaminhamento da denúncia feita pelo ex-conselheiro fiscal Paulo Francisco. Ele considera que o MP e o Tribunal de Contas da União (TCU) vão continuar fiscalizando os abusos com o imposto, apesar do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva:

- A despeito do veto do presidente à fiscalização do TCU, os órgãos de fiscalização estão atuando para controlar o uso do imposto sindical. Na CNTTT, o Ministério Público já pôs fim à farra e à gastança da pelegada. O presidente foi exposto ao ridículo para nada.

Na conclusão de seu parecer, a procuradora Adriana Machado constata que a fiscalização interna era formada por "um clube de amigos" de Gomes, sendo seus membros também privilegiados. "A fiscalização interna da Confederação, através do Conselho de representantes e do Conselho Fiscal, é absolutamente inexistente, sendo livre e indiscriminada a utilização dos recursos sindicais pela CNTTT", diz o despacho, mostrando como as prestações de contas eram aprovadas.