Título: Promotor: réu pode ter recebido dinheiro
Autor: Gois, Chico de ; Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 09/05/2008, O País, p. 14

Comissão Pastoral da Terra pedirá ajuda internacional para pressionar Judiciário

Ronaldo Brasiliense

BELÉM. O promotor Edson de Souza vai pedir, no início da próxima semana, a anulação do julgamento que inocentou, por cinco votos a dois, o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, da acusação de ter sido o mandante do assassinato da missionária Dorothy Stang, em Anapu, em fevereiro de 2005.

Segundo o promotor, o recurso pela anulação vai se fundamentar pelos fortes indícios de que tanto Rayfran Sales, o executor do crime, como Amair Cunha, o intermediário, possam ter recebido dinheiro para mudar seus depoimentos anteriores e isentar Vitalmiro Moura de participação no assassinato.

O promotor vai argumentar que o resultado foi contrário às provas existentes nos autos. A apelação deverá ser apreciada por uma das câmaras do Tribunal de Justiça do Pará. O Ministério Público ganhou ontem o apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em seu pleito por novo julgamento.

- Estamos confiantes de que o julgamento será anulado pelo Tribunal de Justiça e que Vitalmiro Bastos de Moura voltará ao banco dos réus - disse o advogado João Batista Afonso, da CPT.

Um dos condenados foi espancado em penitenciária

Edson Souza também pretende denunciar que Clodoaldo Carlos Batista, condenado a 18 anos de prisão por participação no assassinato da religiosa, foi brutalmente espancado na penitenciária de Americano.

Desde esse episódio, comprovado em exame de corpo de delito feito no Instituto Médico-Legal do Pará, Clodoaldo tem negado sistematicamente a versão inicial que deu à Justiça sobre a participação dos fazendeiros Vitalmiro Moura e Regivaldo Galvão como mandantes da morte. O promotor acredita que Clodoaldo mudou sua versão sob ameaça de morte.

A CPT também acionará uma rede internacional de entidades de defesa dos direitos humanos para pressionar o Judiciário do Pará a julgar a apelação o mais rapidamente possível. E avalia a possibilidade de denunciar o governo brasileiro à Comissão de Direitos Humanos da OEA (Organização de Estados Americanos) pela impunidade no Pará nos casos de assassinatos em conflitos pela posse da terra. Apesar do registro de mais de 800 mortes nos últimos 30 anos, não há na cadeia um único mandante cumprindo pena.

Em Brasília, a governadora do Pará, Ana Júlia, cobrou mudanças no Código de Processo Penal, que dá ao réu o direito de novo julgamento em caso de condenação a pena superior a 20 anos de prisão.

- Se o projeto de revisão do código já estivesse aprovado, não teria havido esse novo julgamento. Isso mostra que há uma necessidade urgente de se alterar o processo penal brasileiro. Não é mais possível que a lei permita esse tipo de revisão, que só reforça a impunidade - afirmou Ana Júlia.