Título: Montadoras mais dependentes dos mercados emergentes
Autor: Novo, Aguinaldo; Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 12/05/2008, Economia, p. 18

Companhias vêm registrando perdas nos países ricos. Previsão é que Brasil, Rússia, Índia e China serão responsáveis por 23% da produção mundial de automóveis em 2014

SÃO PAULO e RIO. O balanço das principais montadoras mundiais no primeiro trimestre confirma as avaliações de que o setor depende hoje muito mais de mercados emergentes, como o Brasil, do que dos países ricos. O exemplo mais recente veio da Ford. Em meio a um forte processo de corte de custos nos EUA, a empresa anunciou lucro de US$100 milhões no período - após prejuízo de US$282 milhões nos três primeiros meses de 2007. As perdas na América do Norte (US$45 milhões) acabaram compensadas pela volta de ganhos na região que inclui Ásia e África e por resultados mais expressivos na América do Sul. Em 2007, o Brasil (que responde por 60% a 70% dos negócios na região), passou a ser o terceiro maior mercado no mundo em vendas para a Ford, atrás de EUA e Reino Unido.

O forte crescimento econômico dos emergentes nos últimos anos - e a enorme demanda reprimida por um bem de consumo de status, como automóvel - faz a festa das montadoras. Mesmo no Brasil, cuja economia não cresce a ritmos asiáticos, a indústria automobilística tem avançado a taxas chinesas: a Anfavea, associação das montadoras, prevê alta de 17,5% nas vendas este ano.

Pesquisa da PwC Automotive Institute, braço para o setor da PricewaterhouseCoopers, destaca que, em 2014, os grandes emergentes do chamado Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) vão responder por 23% da produção mundial de automóveis (hoje são 16%), roubando espaço da União Européia e América do Norte.

Processo de ajuste ainda não acabou, diz diretor da Ford

O economista Enéas Carvalho, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), lembra que os países ricos são economias maduras, onde a venda de carros é só para reposição. A única exceção, até pouco tempo, era o mercado americano, onde as vendas das montadoras ainda eram altas. Mas a crise econômica e a alta do petróleo - que encareceu principalmente o uso dos grandes e pouco eficientes utilitários esportivos, paixão nacional nos EUA - estragou o balanço local de empresas como a Ford.

As européias também estão faturando mais fora de seus países de origem. A Fiat lucrou 405 milhões no primeiro trimestre (o equivalente a US$638 milhões), contra 358 milhões em 2007. Para analistas, o resultado da divisão automotiva da multinacional se deveu ao aumento de participação nas vendas no Brasil (responsável por cerca de 25% das operações mundiais da companhia), que neutralizou as perdas na Itália (ainda seu maior mercado). Na Volkswagen, o aumento de demanda na China, no Brasil e em países do Leste da Europa levou a empresa a um lucro líquido geral de 929 milhões (US$1,48 bilhão). Detalhe: ao mesmo tempo, reduziu em 20% a força de trabalho na Alemanha, o país sede.

Os emergentes também voltaram a puxar o resultado da General Motors. Sem considerar seu braço financeiro (a GMAC), a americana lucrou US$392 milhões no primeiro trimestre. A região formada por América Latina, África e Oriente Médio (Laam, na sigla em inglês) registrou um trimestre de lucro recorde (US$517 milhões), mais que o dobro de igual período de 2007. O Brasil representa 40% dos negócios desse grupo. A GM teve ganhos em todas as regiões, exceto América do Norte, seu maior mercado, onde perdeu US$812 milhões.

- As grandes montadoras continuam grandes. O que está acontecendo é um reposicionamento da demanda no mercado mundial. Não podemos dizer que já estamos no fim desse processo de ajuste - afirmou o diretor de Assuntos Corporativos da Ford no Brasil, Rogélio Golfarb.