Título: Bento XVI nos Estados Unidos
Autor: Sales, Eugenio D.
Fonte: O Globo, 10/05/2008, Opinião, p. 7

Arecente visita do Papa Bento XVI a Washington e Nova York, transmitida pelos meios de comunicação social, especialmente a televisão, oferece excelente oportunidade para a divulgação da verdade em um mundo conturbado. A convite do secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, o Papa Bento XVI ocupou a mesma tribuna de seus antecessores Paulo VI e João Paulo II. Este, na Assembléia Geral das Nações Unidas, a 9 de outubro de 1995, reconheceu ser a ONU um ¿centro moral, no qual todas as nações do mundo se sintam em sua casa desenvolvendo a consciência comum de ser, por assim dizer, uma `família de nações¿¿.

Por sua vez, o Santo Padre Bento XVI reconhece que, através das Nações Unidas, os Estados estabeleceram objetivos universais que, ainda que não coincidam com o bem comum total da família humana, representam sem dúvida uma parte fundamental deste próprio bem. Os princípios fundamentais da Organização (...) ¿expressam as justas aspirações do espírito humano e constituem os ideais que deverão estar subjacentes nas relações internacionais (...). Como meus predecessores Paulo VI e João Paulo II fizeram notar aqui nesta mesma tribuna, são questões que a Igreja Católica e a Santa Sé acompanham com atenção e interesse, pois vêem em vossa atividade um exemplo de como os problemas e conflitos relativos à comunidade mundial podem estar sujeitos a uma regulamentação comum¿.

E afirmou ainda: ¿Certamente, questões de segurança, os objetivos do desenvolvimento, a redução das desigualdades locais e globais, a proteção do meio ambiente, dos recursos e do clima, requerem que todos os responsáveis internacionais atuem conjuntamente e demonstrem uma disponibilidade para atuar de boa-fé, respeitando a lei e promovendo a solidariedade com as regiões mais fracas do planeta.¿ E acrescentou: ¿Isso nunca requer optar entre ciência e ética: trata-se mais de adotar um método científico que respeite realmente os imperativos éticos.¿

Disse o Santo Padre, dirigindo-se aos representantes de todas as nações: ¿O que é preciso é uma busca mais profunda dos meios para prevenir e controlar os conflitos, explorando qualquer via diplomática possível e prestando atenção e estímulo também aos mais tênues sinais de diálogo ou desejo de reconciliação (...). A referência à dignidade humana, que é o fundamento e o objetivo da responsabilidade de proteger, leva-nos ao tema sobre o qual fomos convidados a centrar-nos este ano, em que se completa o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem. O documento foi o resultado de uma convergência de tradições religiosas e culturais, todas elas motivadas pelo desejo comum de colocar a pessoa humana no coração das instituições, leis e atuações da sociedade, e de considerar a pessoa humana essencial para o mundo da cultura, da religião e da ciência (...). Não obstante, hoje é preciso redobrar os esforços ante as pressões para reinterpretar os fundamentos da Declaração e comprometer com isso sua íntima unidade, facilitando assim seu afastamento da proteção da dignidade humana para satisfazer meros interesses, com freqüência particulares.¿ E acrescentou: ¿Obviamente, os direitos humanos devem incluir o direito à liberdade religiosa, entendido como expressão de uma dimensão que é ao mesmo tempo individual e comunitária.¿

Eis alguns tópicos do pronunciamento do Papa Bento XVI no plenário das Nações Unidas. Ele mostrou que ser laico não é promover o laicismo.

Estes são tópicos de alguns ensinamentos do Papa Bento XVI em sua visita a Washington e Nova York. Graças aos meios de comunicação social, principalmente televisão, esses e outros pronunciamentos nessa oportunidade ultrapassaram os limites de um país. Os vários discursos e homilias do Santo Padre interessam principalmente aos católicos, mas também aos homens de boa vontade. Na audiência geral da quarta-feira 30 de abril o Papa Bento XVI, no balanço da sua viagem aos Estados Unidos, assim se expressou: ¿Pude prestar homenagem a esse grande país, que desde o início se edificou a partir de uma feliz conjugação entre princípios religiosos, éticos e políticos, e continua sendo um válido exemplo de sã laicidade, onde a dimensão religiosa, na diversidade de suas expressões, não só é tolerada, mas valorizada como `alma¿ da nação e garantia fundamental dos direitos e dos deveres do ser humano¿ (pág. 16 do Zenit de 30 de abril). Voltaremos ao assunto.

D. EUGENIO SALES é cardeal-arcebispo emérito da Arquidiocese do Rio.