Título: FAB continua punindo controladores rebeldes
Autor: Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 13/05/2008, O País, p. 8

Preso ontem, militar que liderou motim diz que risco de acidentes ainda é alarmante por falhas no controle aéreo

Alan Gripp

BRASÍLIA. Baixada a poeira do caos aéreo que provocou enormes filas de passageiros nos aeroportos, a Aeronáutica continua a trabalhar em silêncio na punição do grupo de militares que se rebelou contra o comando da Força Aérea Brasileira ao denunciar a fragilidade do controle aéreo brasileiro. Ontem, foi preso em Brasília Moisés Almeida, de 41 anos, acusado de ser um dos líderes do que a FAB chama de insurgência dos controladores. Horas antes de começar a cumprir pena administrativa de 15 dias, Moisés denunciou, em entrevista ao GLOBO, que as falhas do controle aéreo mantêm os riscos de acidentes em níveis alarmantes.

- Respeito a decisão do comando, eles podem fazer o que quiserem, mas nunca vamos nos calar diante da verdade. O sistema tem muitos problemas e os índices de acidentes e incidentes, como as quase colisões, são absurdos - disse Almeida, por telefone.

Texto publicado no Orkut incitaria insubordinação

Almeida disse que ele e seus colegas não se calarão diante das punições, que, acreditam, virão em série. Domingo à tarde, o controlador reuniu a mulher e os filhos, de 9 e 15 anos, para contar à família que seria preso - punição que lhe foi comunicada na última quarta-feira. Nas próximas duas semanas, ficará confinado em um quarto de alojamento na unidade militar, equipado com uma cama, um ventilador e uma TV, e vigiado 24 horas por dois soldados:

- Disse a eles que eu seria preso, mas pedi aos meus filhos que tivessem orgulho do pai, porque é pelo motivo correto.

Almeida é um dos 14 controladores que participaram do inédito motim que, em março do ano passado, desafiou o comando da Aeronáutica. Mas, oficialmente, está sendo punido por ter publicado em sua página no site de relacionamento Orkut dois textos, que, segundo o comando da FAB, incitavam os demais controladores a se insubordinarem. Foram dois os acidentes aéreos graves nos últimos anos: em 2006, um avião da Gol caiu em Mato Grosso; ano passado, um avião da TAM explodiu no Aeroporto de Congonhas.

Almeida foi absolvido em um Inquérito Policial Militar (IPM), mas, segundo fontes do comando da FAB, a decisão dava brechas para uma punição administrativa. Oficialmente, a Aeronáutica informou que não comentará o caso, por tratar-se de questões internas.

Moisés, que é vice-presidente da Federação Brasileira das Associações de Controle de Tráfego Aéreo (Febracta), já foi preso, em junho de 2007, quando deu uma entrevista à Rádio CBN relatando problemas no controle aéreo e contestando declarações do comandante da Aeronáutica, Juniti Saito.

O advogado da Federação Brasileira dos Controladores, Roberto Sobral, acusa o comando da FAB de tentar expurgar o grupo que questionou a alta cúpula da Força Aérea e enterrar, de vez, o movimento pela desmilitarização da carreira. Ele pedirá nesta semana a abertura de uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a FAB, na qual promete anexar registros de pelo menos 20 incidentes graves registrados recentemente nos céus do país.

Nordeste e Amazônia são áreas mais críticas

De acordo com controladores ouvidos pelo GLOBO, os problemas detectados na crise aérea continuam. Uma das falhas relatadas seria na comunicação entre aeronaves e no controle aéreo sobre partes do Nordeste e da Amazônia, as chamadas zonas mudas. Na Amazônia, dizem eles, persistem ainda as zonas cegas - pontos em que as imagens não são recebidas pelos radares de Brasília. Um desses pontos seria o mesmo em que o Boeing da Gol se chocou com o jatinho Legacy e caiu em Mato Grosso, matando 154 pessoas, em setembro de 2006. A falta de controladores com experiência também é apontada como um problema.