Título: Agripino apela e é criticado até por seu partido
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 08/05/2008, O País, p. 13

O DEPOIMENTO DA MÃE DO PAC: Ministra recorre a resposta emocionada e desarma a oposição, que não se recuperou

"Ele me perguntou se a fala dele tinha sido ruim. Eu respondi que foi péssima. Ele só podia estar dopado"

BRASÍLIA. Com a intenção de pressionar a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, o líder do DEM, senador José Agripino Maia (RN), constrangeu os colegas e fortaleceu a ministra quando citou, no início do depoimento, uma entrevista dela, de 2003, na qual admite que mentiu muito para sobreviver, quando foi presa pela ditadura. A citação de Agripino pôs Dilma em posição de vítima e desarmou a oposição. Em resposta emocionada, ela disse que foi barbaramente torturada e que se orgulhava de ter mentido para salvar companheiros, sendo aplaudida.

Antes da fala inicial de Dilma, Agripino pediu a palavra.

- Numa entrevista que deu, em 2003 (...), vossa excelência refere-se ao estado de exceção, ao qual também combati. Lhe perguntaram que lembrança a senhora guardou dos tempos de cadeia. Na resposta, vossa excelência contou: "Nos depoimentos a gente mentia feito doido. Mentia muito, mas muito". Me tocou sua sinceridade. Claro que vossa excelência mentia para sobreviver - disse, sugerindo que a ministra poderia faltar com a verdade novamente.

Numa resposta dura, com a voz embargada, ela disse que são situações muito distintas:

- Não é possível supor que se dialogue com pau-de-arara ou choque elétrico. Qualquer comparação entre a ditadura militar e a democracia brasileira só pode partir de quem não dá valor à democracia brasileira - disse Dilma, emocionando a platéia: - Eu tinha 19 anos. Fiquei três anos na cadeia. E fui barbaramente torturada, senador. Qualquer pessoa que ousar dizer a verdade para interrogador compromete a vida dos seus iguais. Entrega pessoas para serem mortas. Eu me orgulho muito de ter mentido, senador. Porque mentir na tortura não é fácil. Na democracia se fala a verdade. Na tortura, quem tem coragem e dignidade fala mentira. E isso, senador, faz parte e integra a minha biografia, de que tenho imenso orgulho. E completou: - Agüentar tortura é dificílimo. Todos nós somos muito frágeis, somos humanos, temos dor, a sedução, a tentação de falar o que ocorreu. A dor é insuportável, o senhor não imagina o quanto.

Criticado, Agripino reagiu:

- Fui mal interpretado. A ministra adotou uma postura de esperteza emocional para desviar do assunto principal, que é a truculência na elaboração do dossiê com elementos de um Estado policialesco. Tudo o que eu queria era esclarecer o assunto. Se algo que coloquei desviou o foco, não hesitaria em retirar.

Mas nem o DEM o perdoou.

- O Agripino me perguntou se a fala dele tinha sido ruim. Eu respondi que foi péssima. Ele só podia estar dopado - lamentou o senador Demóstenes Torres (DEM-GO).

COLABORARAM Adriana Vasconcelos e Cristiane Jungblut